O enquadro policial em debate no STF e o tratamento de homens trans no SUS
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🔸 Desde 2021, triplicou o número de pessoas resgatadas de trabalho análogo à escravidão no Rio Grande do Sul. Ao mesmo tempo, a estrutura de fiscalização sofreu um grave desmonte, iniciado em 2016, como informa o Sul21. Há 132 auditores fiscais do trabalho em exercício em todo o Estado. Os números foram apresentados pela equipe gaúcha de fiscalização da Superintendência do Ministério do Trabalho (MTE) que participou do resgate de 208 trabalhadores na safra da uva em Bento Gonçalves, na semana passada. “A destruição do ministério no governo Bolsonaro e a terceirização das relações de trabalho, que gera precarização em razão da reforma trabalhista, abriram espaço para todo tipo de exploração sem responsabilização das empresas que contratam”, afirma o deputado estadual Miguel Rossetto (PT), que deve produzir um relatório para o governo federal com as informações do estado.
🔸 Ao todo, 2.575 casos de trabalho escravo foram registrados no país em 2022. Só em Minas Gerais, foram 1.071 trabalhadores encontrados em situação análoga à escravidão. Já o Nordeste responde por 17% dos registros, com 437 casos. Os dados do Radar SIT (Secretaria de Inspeção de Trabalho), o Painel de Informações e Estatísticas da Inspeção do Trabalho no Brasil, foram obtidos pela Agência Tatu. A reportagem explica como se dá o processo de resgate dos trabalhadores, detalha as punições às empresas que cometem o crime e lembra como denunciar. A saber: basta ligar para o Disque 100, canal de denúncias de violações de direitos humanos. Ou ainda por meio do portal do Sistema Ipê. Tudo é feito de forma anônima.
🔸 O racismo nas abordagens policiais entrou em pauta no Supremo Tribunal Federal na última semana. “Não há crime e nem pode haver castigo pela cor da pele”, disse o ministro Edson Fachin em meio ao julgamento do habeas corpus que pede a anulação da sentença contra Francisco dos Santos Júnior. Homem negro, como disseram os policiais logo no início do registro de ocorrência, ele foi condenado por tráfico de drogas após ser flagrado com 1,53 gramas de entorpecentes em 2020, em Bauru (SP). A Ponte detalha o caso e traz algumas das falas dos ministros. Alexandre de Moraes, por exemplo, afirmou: “As provas não podem ser obtidas com perfilamento racial. Não só a prova é ilícita como aquele que praticou perfilamento deve ser processado por racismo”.
🔸 A propósito: Edson Fachin considerou que a abordagem policial foi direcionada em razão da cor da pele de Francisco e, por isso, anulou a condenação. O julgamento, porém, não está concluído e há dois votos contrários ao de Fachin. O podcast “Sem Precedentes”, do Jota, debate os limites do STF em relação ao caso.
🔸 “A psicologia não tem se preocupado suficientemente com a problemática do racismo, bem como os impactos que ele causa no sujeito.” Para Michelle Carvalho, psicóloga e mestranda em Psicologia Analítica Junguiana, é preciso desenvolver uma abordagem para o indivíduo negro que, “constantemente, tem sua subjetividade violentada”. Em artigo no Alma Preta, ela defende que devem ser considerados dois fatores essenciais: a identidade e a autoestima. Carvalho ressalta que doenças como a depressão, a síndrome do pânico, o alcoolismo, entre outras, podem surgir a partir da discriminação racial.
🔸 “Me espancaram e me queimaram dizendo: ‘Você não gosta de queimar as coisas? Faz o L agora!’” O entregador Paulo Roberto da Silva Lima, conhecido como Galo, diz ter sido torturado na delegacia duas semanas atrás, após ser flagrado por policiais andando de moto sem capacete em São Paulo. Ele publicou nas redes sociais marcas no corpo, como bolhas nos braços e escoriações na boca, e disse que não denunciou antes por medo de expor à família, como narra a CartaCapital.
🔸 Joias de R$ 16,5 milhões na mochila, nada a declarar. O ex-ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, foi responsável por trazer o mimo milionário que o governo da Arábia Saudita deu a Michelle Bolsonaro. Transportados na mochila de um assessor, os itens foram confiscados pela Receita Federal. Se eram presentes para a ex-primeira-dama, deveriam ser pagos o correspondente a 50% do valor dos bens e uma multa de 25% pela não declaração da joia à Receita. O Congresso em Foco esmiúça as regras do Tribunal de Contas da União e debate se os limites entre público e privado quando se trata de bens recebidos de outros países. O Nexo recapitula o caso e as tentativas de Bolsonaro de reaver os diamantes.
📮 Outras histórias
Em disputa entre traficantes e milicianos, o bairro do Campinho, na zona norte do Rio de Janeiro, sediou os desfiles das divisões de acesso do Carnaval carioca e também foi palco de quatro dos 11 conflitos armados registrados em fevereiro, no Grande Rio. Segundo o relatório mensal do Instituto Fogo Cruzado, uma juíza proibiu que crianças e adolescentes desfilassem nas agremiações devido ao risco de balas perdidas no Morro do Fubá, no Campinho. Para Carlos Nhanga, coordenador regional do Fogo Cruzado no Rio, o caso ilustra o impacto da violência armada na cidade. “Mostra como a violência armada afeta todos os aspectos da vida de quem mora nessas áreas: durante a semana, em dia de tiroteio, muitos não conseguem sair de casa para trabalhar, o transporte público é interrompido, escolas e clínicas fecham. No Carnaval, não é possível desfilar por conta dos tiroteios. Isso mostra como a violência armada aumenta a desigualdade de uma cidade: parte da população tem mais direitos garantidos do que aqueles que vivem nas áreas mais afetadas”, afirma.
📌 Investigação
O tratamento hormonal de homens trans está envolto em incertezas com a alta nos preços do Deposteron, nome comercial do cipionato de testosterona. O valor do remédio subiu 500% em agosto de 2022, passando de R$ 50 para cerca de R$ 250. A Agência Diadorim lembra que, desde 2013, portaria do Ministério da Saúde redefiniu e ampliou Processo Transexualizador no Sistema Único de Saúde (SUS). Ainda assim, a testosterona não é disponibilizada por toda a rede pública, a depender de cada cidade. Na Região Metropolitana do Recife, por exemplo, não há o hormônio nos postos de saúde. Embora a prefeitura de Recife disponibilize o tratamento, ele é restrito a quem comprova residência na capital.
🍂 Meio ambiente
Apesar de ser uma alternativa aos combustíveis fósseis, a produção de etanol a partir do milho pode trazer impactos ambientais. As condições em que o grão é cultivado para o biocombustível faz o desmatamento avançar pela Amazônia e o Cerrado, mesmo que indiretamente. A Repórter Brasil explica que o aumento da demanda também pode impactar na procura por terras, pressionando as fronteiras agrícolas nos dois biomas. Doutor em ecologia pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Lucas Ferrante alerta ainda que a expansão do cultivo do grão pode gerar insegurança alimentar entre os pequenos produtores e comunidades locais. “No Pará, por exemplo, você tem o caso de comunidades que aderiram à produção de dendê para biocombustíveis. Eles abriram mão da agricultura de subsistência para isso”, lembra.
A tragédia no litoral norte de São Paulo vem na sequência de uma série de outros desastres, cada vez mais frequentes. Para preveni-los, o primeiro passo é “entender a natureza não como um mal a ser enfrentado, mas como parte da solução”, nas palavras de Henrique Evers, gerente de desenvolvimento urbano do WRI Brasil. O Eco conta como funcionam as Soluções Baseadas na Natureza (SBN), que cumprem tanto a função de favorecer o equilíbrio climático dos territórios quanto a de prevenir enchentes e deslizamentos. Um exemplo é o adensamento florestal: ao contribuir diretamente para a drenagem do solo, permite bons resultados no enfrentamento a inundações. Já os deslizamentos demandam soluções hídricas, como drenagem e saneamento, somadas às chamadas soluções cinzas, como a construção de estruturas de contenção.
📙 Cultura
“A gente está falando de lugares que são físicos, mas que desenvolvem ali relações e afetos que engendram questões que são principalmente políticas, e políticas no sentido do que nos afeta coletivamente.” Ao lado de Camilo Soares, Alcione Ferreira dirigiu o documentário “Muribeca”, que narra o processo de demolição do Conjunto Habitacional da Muribeca, em Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco. À revista O Grito! Alcione contextualiza a ideia da obra e mostra que a história vai além da luta por moradia: ali se construiu um espaço comunitário e afetivo.
A ligação entre Brasil, África e o Complexo da Maré está presente em “Negras Marés”, exposição que busca compreender as identidades negras e políticas que compõem esses territórios. O Maré de Notícias relata que a mostra tem obras de 20 artistas de diferentes localidades pretas e que expressam isso de diversos modos. “Quando você é convidada como artista, isso reflete de certa forma o quanto você está sendo referência no território”, afirma Nlaisa Luciano, uma das artistas na exposição, disponível para visita gratuita no Centro de Artes da Maré.
🎧 Podcast
A presença de mulheres muda o jogo político. A partir de uma carta entregue à Constituinte em 1987, o podcast “Jogo de Cartas”, produção da Rádio Novelo em parceria com o Instituto Update, traça o movimento que revolucionou a democracia brasileira em busca da ocupação dos espaços por mulheres. Em oito páginas, elas descreveram dezenas de propostas em prol das mulheres para a nova Constituição. Mais de 30 anos depois, o percentual de parlamentares mulheres no Congresso é baixo: mesmo com eleição recorde, o número na Câmara não chega a um quinto de deputados e, no Senado, mulheres ocupam apenas dez das 81 cadeiras.
🧑🏽🏫 Educação
Embora professores se preocupem com a inclusão de pessoas com deficiência, a educação inclusiva ainda não é uma prática recorrente na formação docente. Para além das necessidades específicas, o Porvir destaca que o principal ponto da educação inclusiva é que o foco está em permitir que todos os estudantes participem da construção do conhecimento. Em entrevista, o professor e coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Inclusão da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), José Eduardo Lanuti, relata que os cursos de graduação nesse sentido estão baseados em políticas “ultrapassadas”: “As universidades de modo geral apresentam esse tema – a educação inclusiva – a partir de um modelo idealizado de estudante”.