A disputa da oposição por Bolsonaro e os empresários do agro na China
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🔸 Há uma disputa aberta na oposição do governo para ver quem leva Jair Bolsonaro. Para além do PL, a legenda do ex-presidente que desembarcou ontem no Brasil, o Republicanos e o PP disputam o protagonismo dele, como informa o Congresso em Foco. “Não vejo ele sentado, dentro de uma sala do PL. Vejo Bolsonaro andando pelo país. Ser líder da oposição é estar com seu povo”, afirmou a senadora Damares Alves, ex-ministra de Bolsonaro e atual presidente do Republicanos Mulher. O PL, por sua vez, já disponibilizou até um salário de R$ 41,6 mil, o mesmo que um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), para que ele seja presidente de honra do partido. Na conta do ex-presidente, aliás, já caem duas aposentadorias: uma como militar da reserva, no valor de R$ 11,9 mil, e outra como ex-deputado, de R$ 35,2 mil.
🔸 Para entender a nova regra fiscal proposta pelo governo Lula: apresentada ontem, a norma que vai substituir o teto de gastos combina meta fiscal e limitação do crescimento dos gastos públicos e impõe um piso para os investimentos. Trocando em miúdos, o aumento da despesa terá um teto e um piso. Ao Nexo Emerson Marçal, professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas, explica: “É uma regra possível de ser implementada. É factível, se o governo tiver a capacidade de dizer uma série de ‘nãos’. E vai colocar a dívida pública dentro de uma certa estrutura de estabilidade. Não vamos ter nenhuma grande melhora da dívida nesses anos, mas também, se for cumprido, não vamos ter nenhum grande desarranjo”.
🔸 Para o novo arcabouço fiscal ser bem-sucedido, é preciso que o governo amplie a geração de receitas. Em artigo no Jota, os analistas Fabio Graner e Bárbara Baião ressaltam que “fazer a arrecadação crescer não é tarefa fácil”. Os dois completam: “E depende muito do Congresso. As primeiras reações de parlamentares já mostram isso. Lideranças políticas do centrão na Câmara usaram a expressão ‘ousada’ para se referir a aposta da equipe econômica em atrelar a viabilidade da regra ao esforço para reduzir benefícios aos setores contemplados por isenções, por exemplo”.
🔸 A criação de um Código de Conduta de Enfrentamento à Desinformação. Foi a proposta enviada pelo governo Lula ao Congresso ontem. O código, segundo o texto, vai estabelecer ações para impedir a “disseminação de desinformação com potencial de causar dano significativo, individual ou coletivo”, além de definir medidas para garantir a desmonetização de conteúdo que contenha desinformação. A Agência Lupa destaca que a proposta é também uma forma de o governo apertar o cerco contra as big techs. As plataformas poderão ser responsabilizadas por conteúdos de terceiros “quando demonstrado conhecimento prévio e comprovado o descumprimento do dever de cuidado”.
🔸 Decisão histórica na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. O nome do eugenista Amâncio de Carvalho foi retirado de uma sala da instituição de ensino ontem, depois de votação da congregação da entidade. Como revelou reportagem da Ponte em 2021, Amâncio manteve mumificado o corpo de Jacinta Maria Santana, uma mulher negra que foi embalsamada e exposta na faculdade durante cerca de 30 anos. Agora, ao ver que o racista não nomeia mais uma sala da universidade, ativistas comemoram. “A gente trabalhar contra a perpetuação da memória dos racistas já é um motivo de muita festa, mas com a juventude preta da faculdade de direito do Largo de São Francisco é muito melhor”, afirmou Regina Lúcia dos Santos, de 67 anos, militante histórica do Movimento Negro Unificado (MNU).
📮 Outras histórias
Uma indenização de R$ 200 mil deverá ser paga à família de Luiz Felipe Rangel Bento, criança morta em 2014 durante operação da Polícia Militar no Morro da Quitanda, em Costa Barros, no Rio de Janeiro. Segundo o Maré de Notícias, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) determina que o valor deverá ser pago pelo poder público e cria jurisprudência para outras vítimas de operações policiais nas favelas cariocas. Luiz Felipe foi baleado na cabeça quando dormia em casa, em junho de 2014.
No ano passado, aumentou em 15% o número de mulheres nordestinas sob medidas protetivas de urgência, com relação a 2021. O percentual parte de informações dos tribunais de Justiça de Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe. Os dados referentes à Paraíba e ao Piauí ainda não chegaram, mas a Agência Tatu mostra que quase 80 mil medidas foram concedidas em sete estados da região, o que equivale à toda a população do município de Goiana, em Pernambuco.
📌 Investigação
Jornalistas e influenciadores de extrema direita usaram desinformação para atacar os Yanomami. Quando a situação dos indígenas em Roraima, com desnutrição grave e alta taxa de mortalidade infantil, passou a circular na imprensa e nas redes sociais, personalidades associadas ao ex-presidente Jair Bolsonaro tentaram associá-los ao garimpo ilegal e negar a identidade da comunidade. Por meio do monitoramento do projeto Mentira Tem Preço, o InfoAmazônia mapeou vídeos que atribuem a crise sanitária ao jogo político com “novas narrativas” para prejudicar a gestão Bolsonaro. O primeiro foi do jornalista Alexandre Garcia, que afirmou não entender o impacto do garimpo na fome dos Yanomami, já que “as árvores dão frutos, os rios dão peixes, a terra brota alimento, dá para criar animais”. A realidade, porém, é outra: o mercúrio usado na atividade ilegal contamina os peixes, a terra para plantio e a saúde da população.
🍂 Meio ambiente
Empresários do agronegócio que foram em comitiva do governo à China acumulam multas ambientais. Organizado pelo Ministério da Agricultura e Pecuária, o grupo que viajou na semana passada incluiu representantes de empresas que devem mais de R$ 32 milhões em infrações ambientais ao Ibama. A partir de levantamento feito pelo Lagom Data, a revista piauí informa que a principal devedora é a JBS, maior processadora de proteína animal do mundo. Sozinha, ela tem 37 multas pendentes – ao todo, são R$ 26,7 milhões. Na comitiva, estavam oito representantes da empresa, como os irmãos Joesley e Wesley Batista, sócios do grupo. A lista levanta questionamentos sobre o compromisso do governo com o combate ao desmatamento, reiterado em diversos momentos pelo presidente Lula.
Áreas de mangue no Sudeste e Sul estão mais vulneráveis às consequências das mudanças climáticas. É o que aponta estudo publicado por pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA), da Universidade Federal da Bahia (UFBA), da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto Tecnológico Vale (ITV). De acordo com a pesquisa, as causas seriam as características geomorfológicas dos manguezais dessas regiões na capacidade de adaptação ao aumento do nível do mar. A Agência Bori explica que os ecossistemas costeiros não teriam para onde se expandir devido à altitude da Serra do Mar, diferentemente da região Norte, onde a expansão seria possível por causa das planícies.
📙 Cultura
“Onde estão os museus? E quais histórias esses espaços contam? No geral, estão concentrados nas partes ricas [da cidade] e contam sobre a história das mesmas pessoas.” João Pedro Rodrigues, de 32 anos, é museólogo, mas nunca se viu representado nos museus. Nascido em Itaquera e tendo vivido na Cohab Juscelino, na zona leste de São Paulo, ele estuda a falta de preservação das memórias das quebradas. À Agência Mural Rodrigues detalha a distribuição desigual desses espaços pela capital paulista: “A zona leste tem mais de 4 milhões de habitantes, quase um terço da cidade. Em São Paulo, são 123 museus oficiais, mas na zona leste são apenas sete [três estão fora dos dados da prefeitura]. Mesmo sendo regiões populosas, não temos museus oficiais institucionalizados”. A maioria desse aparato cultural está na zona oeste e no centro de São Paulo.
A peça “Karaíba” chegou ao Festival de Curitiba trazendo o genocídio indígena para o centro do palco. Baseado no livro infantojuvenil “O Karaíba: Uma História do Pré-Brasil”, do escritor e ativista indígena Daniel Munduruku, o espetáculo musical ampliou a faixa-etária do público e narrou o outro lado da chegada dos portugueses ao território chamado hoje de Brasil. A história é contada pela visão dos povos originários e colocando os “descobridores” no lugar de monstros, que, segundo um sonho premonitório de um sábio – o Karaíba –, destruirão tudo e todos. O Plural conversa com o diretor e os atores, que veem no teatro uma linguagem de impacto para promover o reconhecimento da identidade dos povos indígenas. “O processo ainda é tão intenso que a gente precisa provar que somos humanos, que somos gente, que estamos vivos. Parece que esse imaginário do índio, que foi colocado, é muito selvagem; é alguém que precisa ainda ser doutrinado, que precisa ser civilizado”, afirma a atriz Jéssica Meireles.
🎧 Podcast
Quando trabalhou como figurinista da TV Polishop, Viviane Motta conheceu diversas apresentadoras. Tornou-se amiga de uma delas, cujos relacionamentos amorosos conturbados desaguaram num surto psicológico. No “Rádio Novelo Apresenta”, produção da Rádio Novelo, Motta narra como foi compor a rede de apoio dessa amiga e como conheceu os amigos dela apenas pelo Facebook no início da década de 2010, quando termos como “catfishing” – quando uma pessoa cria uma identidade falsa nas redes sociais para enganar alguém, muitas vezes mantendo um relacionamento romântico – ainda não eram tão conhecidos. A história se desenrola durante anos de sua vida, com um elenco que mudaria sua forma de ver o mundo.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
O Quilombo de Catucá é o maior de Pernambuco e um dos mais importantes da história do Brasil. Não se sabe ao certo a data de sua fundação. Os registros disponíveis, levantados pelo historiador pernambucano Marcus Joaquim de Carvalho, indicam que seu surgimento aconteceu às vésperas da Independência, durante a Revolução Pernambucana de 1817, quando os escravizados se refugiaram nas matas. Sua localização também não é precisa, uma vez que se tratou de um quilombo móvel – com presença desde a Zona da Mata até os subúrbios de Recife. O Marco Zero narra a história do quilombo, sua presença na cultura pernambucana e as iniciativas de pessoas negras que buscam reconhecimento como descendentes de quilombolas.