O dia de caos na Câmara e as mulheres resgatadas da escravidão
Uma curadoria do melhor do jornalismo digital, produzido pelas associadas à Ajor. Novos ângulos para assuntos do dia
🔸 O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), pautou ontem a votação do PL da Dosimetria, que reduz penas de condenados por crimes ligados à trama golpista. Relator do projeto de lei, o deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP) calcula que o tempo de Jair Bolsonaro (PL) em regime fechado pode cair, caso o texto seja aprovado. Segundo o Metrópoles, hoje, com a condenação de 27 anos e três meses, o ex-presidente ficaria cerca de seis anos e dez meses em regime fechado; com as novas regras, esse período poderia ficar entre dois anos e quatro meses e quatro anos e dois meses, com parte maior da pena cumprida em semiaberto ou domiciliar.
🔸 Pouco antes, a Câmara foi tomada pelo caos. O deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ) precisou ser retirado à força por policiais da Mesa Diretora da Casa. A CartaCapital conta que, sob risco de cassação, ele ocupou por cerca de uma hora a cadeira de Hugo Motta, em protesto contra a decisão do presidente da Câmara de incluir na pauta a análise do parecer que recomenda sua cassação. Braga é acusado de quebra de decoro parlamentar por ter expulsado, aos empurrões, um militante do Movimento Brasil Livre, em 2024. Outra votação ocorrerá em paralelo para decidir sobre a perda do mandato dos deputados Carla Zambelli (PL-SP) e Alexandre Ramagem (PL-RJ), ambos condenados pela Justiça.
🔸 O Senado aprovou ontem a PEC do Marco Temporal, restringindo o direito dos povos indígenas a seus territórios. Segundo a Proposta de Emenda à Constituição, só têm direito às terras os povos que as estavam ocupando ou disputavam sua posse em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Carta Magna. O Congresso em Foco destaca que a aprovação aprofunda o embate entre Senado e Supremo Tribunal Federal (STF): a Corte contestou a tese do Marco Temporal e declarou, em 2023, que “os direitos territoriais indígenas são originários e não podem ser condicionados à presença física em 1988”. A votação da PEC agora soa como uma reação dos senadores à decisão de Gilmar Mendes que limitou à Procuradoria-Geral da República os pedidos de impeachment de ministros da Corte.
🔸 Mesmo com a prisão de Jair Bolsonaro (PL), o bolsonarismo perdeu força nas ruas e enfrenta uma crise de imagem que dificulta a pré-candidatura de Flávio Bolsonaro em 2026. A Agência Pública obteve um mapeamento exclusivo da frequência de manifestações bolsonaristas no Brasil desde 2018, feito por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP). Os dados revelam que, após o auge de 1.822 atos em 2022 e 46 protestos nos primeiros dias de 2023, as manifestações de apoio a Bolsonaro caíram para apenas 62 no restante daquele ano e 41 em todo 2025, todas classificadas com baixa adesão. Em paralelo, consolida-se a imagem de um líder fragilizado física e emocionalmente, inelegível até 2060 e com apoio fragmentado no Congresso, nas ruas e dentro da própria família.
📮 Outras histórias
Marisqueiras, pescadores e moradores de Guamaré, cidade a três horas de Natal (RN), se reuniram para um curso de valorização da culinária local, o Projeto Vale Sustentável. A formação de cinco dias foi conduzida pelo chef Johelber Moraes, que ensinou 17 receitas. A Saiba Mais conta que as técnicas profissionais foram combinadas com o afeto e a tradição da cozinha potiguar em pratos como a feijoada de frutos do mar, o arroz de siri e clássicos brasileiros, como a coxinha. “Cada ingrediente carrega uma história, e ver esses sabores tradicionais ganhando novas técnicas é gratificante. Este curso foi uma troca – eu ensinei, mas também aprendi muito com o talento e a dedicação das mulheres e homens do mar de Guamaré”, afirma o chef.
📌 Investigação
O ambiente rural concentra o maior número de casos de mulheres submetidas a trabalho análogo à escravidão. Entre 2003 a 2023, 83% das 2.244 resgatadas exerciam alguma atividade no campo – das quais 69% são negras (pretas ou pardas). A Repórter Brasil compilou os dados oficiais do Ministério do Trabalho e Emprego nas últimas duas décadas. A pecuária concentra 21% dos casos de trabalho escravo feminino no Brasil, considerando tanto os resgates feitos no meio rural quanto os no meio urbano, com 471 casos no período. Em seguida, vem a produção de café e a de carvão vegetal. Já Minas Gerais e Pará são os estados com mais mulheres resgatadas no campo. A escravização de mulheres recebe ainda uma camada a mais de violação de direitos: o risco de assédio e violência sexual. “Tem mulher que evita tomar água para não correr o risco de ser violentada ao ir em um banheiro compartilhado com homens”, afirma Elisabeth Vitor, que denuncia ter sido escravizada em uma fazenda em Minas Gerais.
🍂 Meio ambiente
“É importante percebermos as dificuldades e as limitações do Acordo de Paris. Ele traz milhares de coisas maravilhosas, mas temos que reconhecer que algumas das coisas que precisam acontecer talvez demorem muito, e não temos esse tempo para perder. Então, por exemplo, fóruns regionais podem abraçar o mapa do caminho para o fim dos combustíveis fósseis, e os próprios países podem fazer isso de uma maneira mais explícita”, afirma Ana Toni, diretora-executiva da COP30, em Belém, e ex-secretária de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente. Em entrevista à Sumaúma, ela fala sobre os bastidores e as limitações da Conferência do Clima, sobretudo quando o tema é o fim do uso de combustíveis fósseis. “Uma das coisas que estão claras é que não são só os produtores de combustíveis fósseis que não querem avançar rapidamente ou querem cada um do seu jeito. Muitos países consumidores se expressaram contra a criação de um mapa do caminho”, explica. “A COP30 mostrou que agora tem um movimento que quer aprofundar esse debate, que quer pensar em mapas do caminho – não um mapa só.”
📙 Cultura
“O Agente Secreto”, dirigido por Kleber Mendonça Filho e estrelado por Wagner Moura, é um dos finalistas do Globo de Ouro 2026 nas categorias Melhor Filme de Drama, Melhor Filme de Língua Não Inglesa e para Melhor Ator em Drama. Na primeira categoria, o longa assumiu um protagonismo inesperado e tem a melhor nota no site de crítica especializada, Rotten Tomatoes, com avaliação em 99%. O filme “Foi Apenas um Acidente”, de Jafar Panahi, vinha sendo cotado como um dos prováveis líderes da temporada e recebeu 98%. O Tangerina conta que o desempenho da produção brasileira surpreendeu pelo domínio absoluto entre os principais veículos de crítica, algo raro no circuito hollywoodiano. A premiação ocorrerá em janeiro de 2026.
🎧 Podcast
“Na Carta Constitucional, temos a cultura no mesmo lugar de direito social, como é a saúde, educação e habitação. É preciso que a política pública compreenda a cultura nessa dimensão”, diz o gestor cultural Alexandre Santini, presidente da Fundação Casa Rui Barbosa e ex-diretor de Cidadania e Diversidade Cultural no Ministério da Cultura (2015-2016). O “Diálogos com a Inteligência”, produção do Meio, conversa com Santini, que participou da formulação da Lei Aldir Blanc, legislação criada emergencialmente durante a pandemia para apoiar o setor cultural que se transformou na Política Nacional Aldir Blanc – instrumento permanente de fomento à cultura. Para o gestor, esse foi um marco importante para a ampliação da escala de incentivo, com impacto direto na garantia do direito à cultura.
👩🏾⚕️ Saúde
Pela primeira vez as mulheres lideram um ranking relacionado ao tabagismo no país, e as jovens são as que mais usam. Segundo o Levantamento Nacional de Álcool e Drogas, os dados de 2023 mostram que entre meninas adolescentes de 14 a 17 anos o uso de produtos fumígenos – que incluem cigarros, charutos, cachimbos, narguilés e cigarros eletrônicos – alcança 10,5%. Entre meninos, o percentual é de 8,3%. O Joio e O Trigo analisa a tendência de crescimento do fumo entre as adolescentes. Entre os motivos estão o barateamento dos cigarros, a popularização dos vapes e a redução de políticas de combate ao tabagismo. Para o pneumologista Sebastião Costa, a principal preocupação diante do aumento de meninas e mulheres fumantes é a continuidade do hábito. “Por questões hormonais, as mulheres têm mais dificuldade de parar de fumar, a relação com a nicotina é mais persistente por ser uma droga ansiolítica. O período menstrual provoca mais tensões. No consultório fica evidente: apesar de fumarem menos cigarros por dia, elas precisam de mais esforço para parar”, explica.




