Os detalhes da denúncia da PGR e a saúde das crianças de Brumadinho
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🔸 Menos de uma hora depois da denúncia contra Jair Bolsonaro (PL) vir a público, seu filho, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), escreveu nas redes que o documento de 272 páginas não tem “absolutamente nenhuma prova” que implique o ex-presidente. O Aos Fatos mostra que a denúncia – apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet – traz evidências claras da participação de Bolsonaro nos crimes investigados pela Polícia Federal. A reportagem destrincha quatro das provas no documento: a minuta golpista, os depoimentos de comandantes das Forças Armadas, os ataques premeditados contra o sistema eleitoral e a “Abin paralela” – o uso ilegal da estrutura da Agência Brasileira de Inteligência para espionar e atacar pessoas, além de espalhar desinformações nas redes.
🔸 Segundo a denúncia, o plano antidemocrático começou ainda em 2021. Naquele ano, tiveram início os ataques sistemáticos ao sistema eletrônico das eleições, com o objetivo de criar um ambiente de insegurança e justificar o rompimento da democracia. As táticas de desinformação seguiam diretrizes estratégicas – descritas por Augusto Heleno numa agenda à qual a Polícia Federal teve acesso. Numa das notas, o general determina: “Não fazer referência a homossexuias, negros, maricas etc”. A Lupa detalha os elementos da denúncia, mostra a forma como Bolsonaro liderou o esquema de ataque às urnas e explora os movimentos da tentativa de golpe até seu auge, a mobilização pós-eleições que culminou na invasão da Praça dos Três Poderes, em Brasília, no dia 8 de janeiro de 2023.
🔸 “Gonet fez um esforço explícito para blindar a acusação de qualquer interpretação política, tentando enquadrar os eventos de forma estritamente jurídica”, avalia Felipe Recondo, em análise no Jota. Segundo ele, o procurador deu “contornos jurídicos de tentativa de golpe a um conjunto de atos que não se encaixa no modelo clássico de ruptura institucional”. Embora tenha papel central na denúncia, a delação de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, é usada com cautela por Gonet, sempre corroborada por outros depoimentos. “Ao tirar o debate da arena política e ancorá-lo no campo probatório e jurídico, Gonet pavimentou o caminho para que a responsabilização de Bolsonaro seja tratada nos tribunais — e não apenas no debate público”, afirma Recondo.
🔸 Sobre Mauro Cid: ele afirmou à Polícia Federal que recebeu R$ 100 mil para financiar um plano que incluía o assassinato do presidene Luiz Inácio Lula da Silva (PT), seu vice Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes. O Congresso em Foco conta que Cid diz ter recebido o montante do general Braga Netto em uma sacola de vinho. A denúncia da PGR mostra ainda que, após o repasse, militares sob comando de Cid monitoraram Moraes entre 21 e 23 de novembro de 2022, registrando seus movimentos em Brasília. O plano foi discutido em uma reunião na casa de Braga Netto e detalhado em documentos internos, como o chamado “Copa 2022”. A defesa do general nega as acusações.
🔸 Na manhã de ontem, Bolsonaro se reuniu com aliados e defendeu sua inocência no apartamento funcional do líder da oposição na Câmara, o deputado Zucco (PL-RS). Segundo Igor Gadelha, colunista do Metrópoles, prometeu não fugir do país e afirmou que, se tivesse feito algo, já teria buscado asilo na Argentina ou nos Estados Unidos. O ex-presidente pediu aos aliados que concentrem suas presenças na manifestação do dia 16 de março no Rio de Janeiro, e não em outras cidades. Também disse que o “fora Lula” deve ser deixado para outro momento.
📮 Outras histórias
Em mais um protesto contra parques eólicos nas comunidades rurais, agricultores e indígenas do povo Kapinawá ocuparam a sede da Agência de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco (Adepe), na zona norte de Recife, no início desta semana. O grupo exige a revogação das licenças dos complexos Ventos de Santa Brígida, Ventos de São Clemente e Serra das Vacas, além da suspensão de novos licenciamentos. A Marco Zero explica que os manifestantes denunciam perda de território, remoções forçadas, contratos abusivos e danos ambientais e à saúde, além de problemas auditivos, ansiedade e prejuízos à criação de animais. Wallison José da Silva, 31 anos, diz que a proximidade dos aerogeradores de sua casa, em Venturosa, está afetando a família: “Eu fiz exame de audiometria que constatou que perdi audição por conta das torres. Além disso, meu menino também vem sofrendo muito com crises de ansiedade”.
📌 Investigação
Soterrados pela lama tóxica da barragem que rompeu em Mariana (MG), em 2015, comunidades afetadas, como Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo e Gesteira, até hoje não conseguiram retomar totalmente suas festividades tradicionais. Há uma década, os moradores reassentados lutam para manter viva sua identidade e memória. O Nonada destrincha o impacto do desastre para o patrimônio cultural da região. A comunidade quilombola de Gesteira ainda não recebeu suas imagens sacras resgatadas da lama pelas mineradoras e perdeu o controle das próprias tradições. Para celebrar a Festa de Nossa Senhora da Conceição, padroeira do distrito, por exemplo, eles precisam solicitar à Fundação Renova, ligada às mineradoras, o empréstimo da imagem da santa.
🍂 Meio ambiente
“Não é porque eu sou bonzinho que não destruo a floresta, que não destruo a cachoeira. Nós temos um conceito ou uma concepção de que todos os ambientes, seja aéreo, terrestre, floresta ou água, são habitados por humanos, que nós chamamos de Ye’pamahsã. Essa ideia é geral para os povos indígenas”, afirma o cientista indígena João Paulo Lima Barreto, pesquisador da Universidade Federal do Amazonas e um dos autores de artigo publicado na revista “Science”. Em entrevista à Agência Bori, o antropólogo do povo Tukano falou sobre os desafios do diálogo entre o conhecimento indígena e a ciência ocidental. Ele também criticou o fato de especialistas indígenas não serem convidados para os grandes eventos sobre o clima. “Sabemos que já existe esse grande investimento de manter a floresta em pé, que é preciso manejar os recursos etc. Todo mundo está nessa questão, indígenas, ONGs, mas não estão discutindo a importância dos conhecimentos indígenas e seus operadores.”
📙 Cultura
Biscoito bricelet, doce de pimenta-do-reino e manauê são algumas das receitas da culinária sergipana registradas como Patrimônio Cultural e Imaterial do estado. Na segunda temporada da série “Tamborim”, a Cajueira traz patrimônios e bens culturais de cada estado do Nordeste. Em Sergipe, além das receitas, ainda há a renda irlandesa de Divina Pastora – e mais de cem mulheres mantêm a tradição viva. Trazida da Europa no século 17, a técnica que combina agulha e fitilho foi ressignificada por mulheres sergipanas. A série ainda inclui manifestações culturais e peregrinações religiosas, como a Romaria de Nosso Senhor dos Passos e a Peregrinação de Nossa Senhora Divina Pastora. Esta última é o maior evento religioso do estado e acontece no terceiro domingo de outubro.
🎧 Podcast
Depois da posse de Donald Trump, bilionários se tornaram líderes de órgãos decisivos do governo dos Estados Unidos. Além da proximidade do poder, eles têm em comum uma ideologia, que chamam de Iluminismo das Trevas. A “Rádio Escafandro”, produção Rádio Guarda-Chuva, explica que, no centro dela, está a negação da igualdade entre os seres humanos. Pela ideologia, eles seriam superiores e deveriam governar o mundo, com a obrigação de passar seus genes adiante numa “prole numerosa”. Para Elon Musk, CEO da Tesla e da SpaceX, o colapso populacional oferece um risco maior do que as mudanças climáticas – o que não tem comprovação científica.
👩🏾⚕️ Saúde
Depois de seis anos do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho (MG), foram encontrados metais pesados, como arsênio, chumbo e mercúrio, na urina de crianças de 0 a 6 anos que vivem na região. O relatório divulgado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) revelou que todas as crianças dessa faixa-etária analisadas na pesquisa estão contaminadas. O Lunetas explica os efeitos do desastre na saúde e como a poeira da mineração também afeta o desenvolvimento infantil. “As crianças que vivem na área mais exposta à poeira, naquelas três localidades próximas da atividade de mineração e do desastre, têm uma chance até três vezes maior de desenvolver um problema respiratório”, afirma Carmen Asmus, coordenadora do Projeto Bruminha, que monitora os impactos das tragédias ambientais na primeira infância.