A decisão do STF sobre as câmeras da PM e a impunidade na Amazônia
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🔸 O ministro Luís Roberto Barroso determinou o uso obrigatório de câmeras corporais por policiais militares no estado de São Paulo. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) anunciou a decisão ontem, em meio à publicização dos casos de violência policial nos últimos dias. O Jota informa que o magistrado definiu que o governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) deverá manter o modelo atual de gravação ininterrupta dos dispositivos e determinou que o número total de câmeras deve ser de, no mínimo, 10.125 equipamentos. Na decisão, Barroso lembrou que, segundo o Ministério Público de São Paulo (MP-SP), houve um aumento de 46% nas mortes por intervenções policiais em 2024 com relação a 2023.
🔸 A propósito: entidades pedem que o Ministério Público crie um plano para reduzir a letalidade policial no estado. A Ouvidoria das Polícias e um coletivo de organizações e movimentos sociais querem ainda que o MP assuma a investigação de casos envolvendo violência policial e que a perícia também seja independente, detalha a Ponte. A reportagem lembra as ações policiais conduzidas pela gestão de Tarcísio de Freitas, como a Operação Escudo e a Operação Verão, ambas na Baixada Santista. As entidades exigem ainda um pedido público de desculpas, a reparação integral às vítimas e a garantia do direito ao luto sem a interferência de agentes do Estado.
🔸 Em meio à grave crise de segurança, Guilherme Derrite voava em aviões particulares de amigos, como o empresário Zeca Romano, herdeiro da principal empresa de ônibus de São Bernardo do Campo. A revista piauí revela que o secretário de Segurança Pública de São Paulo viajou no jato de 50 milhões de dólares para um compromisso oficial em Brasília. Derrite, porém, diz que tratou a viagem como um “deslocamento particular”. O repórter João Batista Jr. mostra que os voos do secretário nas asas dos amigos já se tornaram um hábito: “A escalada da violência policial não freia a agenda social de Derrite. No dia 8 de novembro, poucas horas depois de Antônio Vinícius Lopes Gritzbach, empresário e delator do PCC, ter sido executado com dez disparos de fuzil no Aeroporto de Guarulhos, Derrite partiu para a praia de Maresias, no litoral norte de São Paulo. Foi celebrar o aniversário do deputado Maurício Neves. Também estavam na festa Artur Dian, o delegado-geral da Polícia Civil, e Fabio Bopp, chefe do Grupo Especial de Reação. O cantor Latino, enquanto entoava a música Conquista, de Claudinho & Buchecha, saudou o secretário que estava na pista de dança: ‘Bora, Derrite!’”.
🔸 A violência também é corriqueira nos serviços de segurança privada em São Paulo. As lesões corporais são o crime mais frequente entre vigilantes particulares na capital. É o que mostra levantamento inédito feito pela Alma Preta e pelo Laboratório de Estudos sobre Governança da Segurança (LEGS) da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Foram analisados 118 boletins de ocorrência envolvendo seguranças privados no período de outubro de 2021 a outubro de 2022. Dos 173 crimes contabilizados nos registros (um boletim pode conter mais de um crime), 32% foram lesões corporais. O relatório da pesquisa destaca: “A ausência de dados e estudos sistemáticos sobre padrões de abuso cometidos por seguranças particulares cria dificuldades para o monitoramento e controle desses agentes. Assim eles se tornam quase invisíveis à crítica da mídia e à atuação de organizações de direitos humanos e de órgãos públicos”.
📮 Outras histórias
Em Pernambuco, duas praias dão uma amostra do que seria a privatização do litoral brasileiro. Em Ipojuca, no sul do estado, Muro Alto e Cupe já enfrentam barreiras criadas por resorts e empreendimentos privados que ocupam terrenos litorâneos. A Marco Zero percorreu sete quilômetros entre a praia de Gamboa e o Pontal do Cupe e identificou pelo menos 35 hotéis, casas e resorts à beira-mar, além de outros sete estabelecimentos em construção. Ao longo de 5,5 km de Muro Alto, há apenas seis acessos públicos, muitos dos quais exigem caminhadas longas e em áreas precárias. Em Cupe, num trajeto de 1,5 km existem quatro acessos. Num deles, o banhista precisa disputar espaço com buggies entre os muros do hotel Ocaporã e da pousada Tabapitanga.
📌 Investigação
Apesar dos recordes de incêndio na Amazônia, quase nunca se chega aos culpados. Das 112 investigações para apurar casos de incêndios ocorridos em 2024 em todas as regiões do país – não há dados apenas para a Amazônia –, somente sete pessoas foram presas, e outras dez foram indiciadas, revela a Sumaúma. Quando se chega aos criminosos, no entanto, a punição é branda: um incendiário pode cumprir toda a pena em regime aberto ou semiaberto. Os dados de transformação do uso da terra mostram que o fogo costuma vir acompanhado da expansão agropecuária, ligando os incêndios ilegais a grileiros e pecuaristas.
🍂 Meio ambiente
“O país tem condições de zerar as emissões, talvez ser um dos primeiros países, dentre os grandes emissores, a zerar as emissões. Porque, por exemplo, em 2022, quando ainda os desmatamentos estavam muito altos, 75% das emissões do Brasil vieram 50% dos desmatamentos Amazonas e Cerrado e 25% da agropecuária”, afirma Carlos Nobre, um dos principais especialistas do mundo em mudanças climáticas. Em entrevista ao Colabora, o cientista ressalta os caminhos que o Brasil deve seguir para zerar as emissões de carbono. “A ministra Marina Silva, muito corretamente, tem dito que precisa zerar todos os desmatamentos, não só os chamados ilegais na Amazônia, quase todos são ilegais, mas tem que zerar os desmatamentos, tem que proteger a floresta.”
📙 Cultura
Centralizada nas vivências de mulheres negras, a 14º Festa Literária das Periferias (Flup) reuniu escritoras, pesquisadoras, artistas e ativistas no fim de novembro, no Rio de Janeiro. Com mais de 200 atrações, a edição homenageou a historiadora, poeta e cineasta sergipana Beatriz Nascimento (1942-1995). Em plena ditadura, ela aliou militância política antirracista e pesquisa acadêmica – e se firmou como expoente dos feminismos negros. O Nós, Mulheres da Periferia narra as atividades do evento e o protagonismo das mulheres negras na construção da identidade brasileira. Presente no festival, a escritora Conceição Evaristo será a homenageada da edição de 2025 – a primeira celebrada em vida pela Flup.
🎧 Podcast
As plataformas digitais não só permitem que a desinformação circule como também lucram com esses conteúdos – e há uma malha de desinformadores profissionais. O “Ciência Suja”, produção da NAV Reportagens, mostra como as empresas de tecnologia ganham dinheiro por meio da desinformação, principalmente via anúncios. Com base nos dados coletados sobre os usuários, os anunciantes conseguem um alcance cada vez maior – e normalmente chegam a um público com interesses, crenças e comportamentos afins ao tema compartilhado. Ao movimentar as bolhas por meio dos algoritmos, os desinformadores conseguem atingir grandes audiências e gerar receita.
👩🏾💻 Tecnologia
Com a volta de Donald Trump à Casa Branca, a geopolítica digital ganha um novo capítulo em uma disputa entre Estados Unidos, China e Rússia pelo controle da agenda tecnológica. Enquanto Trump atua para consolidar o colonialismo tecnológico e de dados e favorecer as big techs, o Sul Global tem a oportunidade de contrapor essa alternativa por meio da soberania de dados e da cooperação entre países. Em artigo no Outras Palavras, James Görgen, especialista em políticas públicas e gestão governamental, analisa como os Brics – bloco formado inicialmente por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – podem reorientar a agenda digital global, sobretudo sob a presidência de trabalho do Brasil no próximo ano.