A crise do IOF no Supremo e o avanço da tarifa zero no país
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🔸 O governo entrou com ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para manter o decreto que aumentava o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), derrubado pelo Congresso em junho. O advogado-geral da União, Jorge Messias, afirmou que a medida é “jurídica, não política” e visa garantir as prerrogativas do Executivo. O Nexo explica a tese do governo e os contextos político e fiscal da judicialização do caso. O argumento da ação é que o Congresso só pode sustar atos do Executivo em casos excepcionais, quando ultrapassam competências constitucionais. Segundo Messias, a derrubada do decreto de Lula viola a separação dos Poderes e cria insegurança jurídica para quem já pagou o imposto em junho. A decisão, porém, aprofunda as tensões entre Executivo e Legislativo. Nos bastidores, aliados veem risco de retaliação no Congresso, que resiste a cortar privilégios como supersalários ou isenções fiscais.
🔸 O caso será relatado por Alexandre de Moraes, que já analisa outras duas ações sobre o tema, do PL e do PSOL. O ministro aproveitou a questão para criticar quem acusa o STF de ativismo social, informa o Jota. Em seminário na Universidade de Coimbra, Moraes afirmou: “Há uma ação do maior partido da oposição, o PL, há uma ação da situação, o PSOL, e há uma ação do governo. Veja, todo o mundo político diz: ‘Que o Supremo resolva, porque nós não conseguimos resolver’. E aí o que ocorre? A hora que o Supremo resolve, quem não gostou fala em ativismo, esquece que ele mesmo pediu que o Supremo resolvesse”. E completou: “E vocês terão certeza. Qualquer que seja a decisão, todos vão criticar”.
🔸 Em tempo: 17 frentes parlamentares, ligadas ao lobby do setor privado, divulgaram manifesto contra a decisão do governo Lula de recorrer ao STF para reverter a derrubada do aumento do IOF. “Ao judicializar uma derrota política, o governo demonstra incapacidade de articulação e desprezo pelo diálogo com a sociedade, além de expor a fragilidade das contas públicas, uma vez que busca-se cumprir a meta fiscal somente com ampliação de impostos, sem reavaliação de despesas”, diz o texto. O Canal MyNews conta ainda que o manifesto chama a ação da Advocacia-Geral da União de “manobra” e pede que o STF preserve decisões soberanas do Congresso e evite “artifícios judiciais que aprofundam a instabilidade entre os Poderes”.
🔸 Impulsionada por efeitos econômicos e políticos, a tarifa zero avança no Brasil. Hoje, 136 cidades oferecem transporte público gratuito no país e beneficiam 8 milhões de pessoas. Em artigo na revista piauí, o urbanista Roberto Andrés afirma que a política cresceu por “contágio” – prefeitos replicam experiências bem-sucedidas – e “cálculo” – financiar todo o sistema sai mais barato que subsídios parciais. “Há, ainda, um segundo cálculo nessa operação – o cálculo político. A medida é popular e costuma ser bem avaliada nas cidades em que é implantada", completa ele, lembrando que prefeitos que implementaram a tarifa zero e tentaram reeleição em 2024 tiveram 89,1% de taxa de vitória, contra 81,25% da média nacional. Cidades que têm o transporte gratuito tiveram resultados significativos: alta de 3,2% em empregos e 7,5% em empresas, além de queda de 4,1% em emissões de gases de efeito estufa.
📮 Outras histórias
Niterói caiu do 1º para o 6º lugar no ranking fluminense de qualidade de vida do Índice de Progresso Social (IPS) 2025. Agora, está atrás de Resende, Rio, Cordeiro, Carmo e Teresópolis. No ranking nacional, a cidade despencou do 133º para o 404º lugar. A Agência Nossa explica que a piora ocorreu depois da inclusão de novos indicadores de inclusão social no IPS. Niterói teve nota negativa para indicadores que tratam de moradia, inclusão social e cuidados médicos básicos, entre outros, mas teve bom desempenho em meio ambiente, saneamento, comunicação e acesso à educação superior. “No caso de Niterói, o índice de famílias em situação de rua e a violência contra a mulher são questões que precisam ser enfrentadas com políticas mais efetivas. Municípios que conseguiram reduzir essas vulnerabilidades se destacaram no ranking estadual”, diz Melissa Wilm, coordenadora técnica do IPS Brasil.
📌 Investigação
Condenado internacionalmente por ser usado na perseguição a jornalistas, opositores políticos e ativistas em países como Rússia, Mianmar, Uganda e Venezuela, o Universal Forensics Extraction Device (UFED) faz parte da Secretaria de Segurança Pública de Sergipe desde 2017. Trata-se de um software israelense capaz de extrair de um aparelho digital dados armazenados – e até deletados – na memória do dispositivo, enviados ou recebidos via aplicativos de mensagens instalados. Na primeira reportagem da série “Quem controla seus dados?”, a Mangue revela o limbo legal do uso da ferramenta no Brasil em relação aos dados pessoais e as condições em que foi adquirida pelo governo de Sergipe. Secretário de Segurança Pública, João Eloy de Menezes conseguiu que a compra fosse feita sem licitação. Em 2017, o custo foi de R$ 189,8 mil para comprar o modelo UFED Touch2 e o software de armazenamento em nuvem UFED Cloud Analyzer. Já a renovação de licença foi feita outras duas vezes, nos valores de R$ 205,2 mil, em maio de 2021, e R$ 658,7 mil, em dezembro de 2023.
🍂 Meio ambiente
Cerca de 98% dos empreendimentos licenciados em Minas Gerais seriam aprovados automaticamente, sem qualquer análise técnica ambiental, se o Projeto de Lei 2.159/2021, conhecido como PL da Devastação, estivesse em vigor. A proposta amplia o chamado licenciamento por autodeclaração para projetos de médio porte, submetidos a algum nível de controle pela legislação atual. Segundo o Projeto Preserva, existe mais um risco no projeto: a separação entre o licenciamento ambiental e a outorga do uso da água, atualmente avaliados de forma conjunta. O PL permite que empresas possam operar sem autorização prévia sobre a água que vão usar ou poluir, abrindo brechas para o agravamento de conflitos socioambientais e da escassez hídrica no estado. “Não é possível dissociar o impacto ambiental da água. As bacias hidrográficas têm limites de uso e qualquer novo projeto precisa ser avaliado em relação à disponibilidade hídrica”, afirma Daniela Diniz, ex-subsecretária de Licenciamento Ambiental de Minas.
📙 Cultura
Com apoio da Lei Paulo Gustavo, o artista Marcos Roberto da Silva, conhecido como Black Alquimista, lançou seu primeiro curta-metragem, “Posse Hausa – A Flor do Baobá”. Respeitado por seu trabalho como produtor musical, MC, beatmaker e sonoplasta, ele conta que a aproximação com a arte foi fundamental para lidar com o racismo enfrentado ao longo da vida. Segundo a Agência Mural, a obra é um documentário híbrido que mistura realidade com ficção. A narrativa acompanha um adolescente de 14 anos que começa a estudar a Revolta do Malês, ocorrida em 1835, em Salvador (BA), e o coletivo Posse Hausa, do qual Alquimista é um dos fundadores. “Como uma pessoa negra, não quero ter que esperar que o outro conte a nossa história”, afirma o artista.
🎧 Podcast
“Não tem como falar sobre os assassinatos do Bruno e do Dom, sem falar do momento político. O fato do crime, para mim e para muitas outras pessoas, está absolutamente vinculado ao contexto político daquele momento no Brasil”, afirma o jornalista britânico Tom Phillips, colega de trabalho de Dom Phillips no The Guardian. Dom foi assassinado junto ao indigenista Bruno Pereira no Vale do Javari, no Amazonas, em 5 de junho de 2022. No “Fio da Meada”, produção da Rádio Novelo, Tom fala sobre seu recém-lançado “Missing in the Amazon”, podcast em que reconstrói os caminhos que levaram Dom e Bruno ao que seria a última viagem, destrincha as teorias sobre o os assassinatos e examina a explosão do crime organizado na Amazônia.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
“É um marco ser a primeira mulher trans a ocupar um cargo de direção em uma organização de jornalismo no Brasil. Isso é importante, claro. Mas, mais importante ainda é que esse seja só o começo”, afirma a jornalista Sanara Santos, diretora da Énois, iniciativa jornalística que começou há 16 anos com objetivo de formar jovens periféricos em comunicadores. Sanara é também cofundadora da Transmídia, veículo pioneiro na cobertura de pautas da população trans. Em entrevista ao Nós, Mulheres da Periferia, ela revisita sua trajetória no jornalismo, como estudante dos cursos da organização em que hoje é diretora, e ressalta o papel da diversidade na imprensa. “Um jornalismo que não olha para gênero e sexualidade não está olhando para a complexidade das existências no mundo. Ele acaba contando só uma parte da história – e, muitas vezes, a parte mais confortável para a maioria.”