Uma 'cracolândia' na Amazônia e o impacto do clima na cultura do RS
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🔸 Na COP30, os países estão discutindo como unificar as três convenções criadas na Rio-92 – Clima, Biodiversidade e Combate à Desertificação – para enfrentar de forma coordenada crises que são interdependentes. “Esse alinhamento criará sinal político e de confiança para atores públicos e privados avançarem em iniciativas concretas”, avalia Hugo Mendes, parte da delegação brasileira na conferência. O Eco explica que o Brasil lidera o movimento por uma decisão que crie um grupo de trabalho permanente entre os secretariados, enquanto o bloco árabe pede cautela, temendo novas obrigações. “Se não houver acordo, fica tudo para o ano que vem e a janela para transformar sinergia em entregas concretas se estreita”, diz a gerente de política climática e mercados de carbono do instituto LaClima, Juliana Marcussi.
🔸 A ministra Sonia Guajajara deixará o Ministério dos Povos Indígenas para buscar a reeleição a deputada federal por São Paulo em 2026. Ela confirmou a informação em entrevista exclusiva à InfoAmazonia. “Enquanto mulher indígena, eu quero fazer valer essa construção da bancada do Cocar, de já ter uma bancada de mulher indígena no Congresso Nacional. Então, a gente quer aumentar ainda mais essa bancada, essa representação indígena no Congresso e também nas assembleias legislativas”, disse. Na COP30, a ministra disse ver “possibilidade real” de demarcações durante o evento, desde que os processos não sejam afetados pela Lei 14.701 (do Marco Temporal) e tenham segurança jurídica. “Se o presidente Lula assina sem a segurança devida para que prevaleça um ato de homologação, não vai adiantar. Depois, esse território será judicializado. Nós estamos trabalhando para ter processos concluídos, seguros, para que não haja questionamentos.”
🔸 Central no debate da COP30, a Amazônia se tornou o principal corredor do tráfico de drogas que liga os Andes aos portos atlânticos. Assim, o Brasil passou a liderar o abastecimento apreendido rumo à Europa. O estudo “Floresta em Pó”, produzido pelo Fogo Cruzado em parceria com a Iniciativa Negra e a Coalizão Internacional pela Reforma da Política de Drogas e Justiça Ambiental, identificou 550 laboratórios de refino no país entre 2019 e 2025 – número 32 vezes superior ao reconhecido oficialmente. O Intercept Brasil detalha o estudo e lembra que, atualmente, as facções criminosas PCC e Comando Vermelho estão presentes em 71% dos municípios amazônicos. O tráfico se mistura à grilagem, ao garimpo e à extração ilegal de madeira, o que levou a um salto de 73% no desmatamento entre 2019 e 2022 e criou uma economia ilícita cada vez mais estruturada. A reportagem mostra ainda como o cultivo e o consumo de drogas atingem comunidades indígenas, com jovens aliciados para o transporte e meninas levadas para trabalho doméstico e sexual, fenômeno que gerou até uma “cracolândia indígena” em Tabatinga (AM).
🔸 Moradores da maior favela de palafitas de Belém, a Vila da Barca, levaram uma denúncia a autoridades do governo federal: eles são vítimas de racismo ambiental em seu território. A denúncia foi feita à primeira-dama Rosângela Lula da Silva, a Janja, e aos ministros Marina Silva, Anielle Franco, Márcia Lopes, Margareth Menezes e Guilherme Boulos. Segundo a Alma Preta, a Vila da Barca não tem saneamento básico adequado, mas recebeu esgoto e entulho das obras da Nova Doca, obra da COP30 na zona nobre de Belém. Os moradores também se mobilizaram contra a tentativa do governo estadual de instalar uma estação de esgotamento sanitário sem consulta prévia e sem estudos de impacto ambiental. “A gente não vai aceitar que governo algum queira nos expulsar do nosso território. Quando a gente luta pelo território, a gente está dizendo que quer viver aqui, com dignidade, com moradia, emprego e renda”, afirma a professora e liderança comunitária Inêz Medeiros.
🔸 O ministro Alexandre de Moraes mandou suspender o inquérito que investigava moradores que retiraram corpos da mata nos complexos do Alemão e da Penha, no Rio de Janeiro, depois do massacre policial que deixou mais de 120 mortos. A decisão veio após denúncias de que familiares teriam sido obrigados a depor antes de reconhecer os corpos. O Voz das Comunidades lembra que, no dia seguinte à chacina, moradores levaram os corpos de vítimas a uma praça. Diante da imagem dos corpos resgatados, a Polícia Civil anunciou que investigaria essas pessoas por “fraude processual”, alegando que elas teriam “alterado a cena do crime”. Na mesma decisão, Moraes determinou que sejam preservadas todas as imagens de câmeras corporais de policiais civis e militares e enviar ao STF cópias de todos os laudos periciais, com registros fotográficos e busca de projéteis.
📮 Outras histórias
Ambulantes e comerciantes da avenida Guararapes, no centro de Recife, não sabem seu destino. A prefeitura criou um projeto chamado Distrito Guararapes, que consiste em conceder uma fatia do bairro de Santo Antônio para a iniciativa privada por 30 anos. A Marco Zero ouviu quem trabalha na área. A maioria reconhece que o centro da cidade precisa de uma revitalização. A queixa é quanto à falta de transparência. Como poucos viram o projeto, há temor de remoções e perda da identidade local. “A Guararapes já está há muito tempo degradada. Está abandonada e esquecida”, afirma o dono da tradicional Banca Globo, Orlando Patrocínio Oliveira. “Mas isso de entregar uma parte do bairro para a iniciativa privada eu não sei se é certo ou errado”, completa. O secretário Felipe Matos diz que haverá quiosques para 446 comerciantes fixos e 200 móveis, sem aluguel para cadastrados, construídos e mantidos pela concessionária. A prefeitura prevê desapropriar 14 edifícios e iniciar obras em 2027.
📌 Investigação
Os eventos climáticos extremos e a devastação ambiental no Rio Grande do Sul afetam as expressões culturais, como festas e artesanatos tradicionais, de comunidades indígenas, quilombolas. A cacica Kaingang Gãh Te/Iracema Nascimento, da etnia Kaingang, relata que os cipós e as taquaras, usados no artesanato, tornaram-se escassos no território Retomada Gãh Ré como consequência das queimadas e dos alagamentos que acontecem durante os temporais, revela o Nonada. “Por causa dessa falta, a gente acaba tendo que buscar outros espaços. E arriscando a vida, porque o morador não gosta que a gente entre no mato dele. Então tem que ir escondido pra tirar as taquaras”, conta a liderança. “A gente também costumava ir pegar cipó perto do Agronomia, da Lomba do Pinheiro. Mas agora os donos do cemitério por onde a gente entrava não querem mais permitir que a gente entre no mato.”
🍂 Meio ambiente
Questionada em painel da COP30 sobre a rota do Brasil para a eliminação dos combustíveis fósseis, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, afirmou que “não faz sentido investir nos modelos sujos e ineficientes do século 20”. Ela recebeu apoio de representantes do Reino Unido, Alemanha, França, Dinamarca, Colômbia e Quênia. O Conexão Planeta destaca que especialistas acreditam que seja pouco provável que o tema seja incluído nas negociações oficiais da conferência, cujo documento precisa ser acordado por todos os países membros. No entanto, ter o assunto em pauta com apoio de economia fortes é um “tremendo primeiro passo”, nas palavras de Claudio Angelo, coordenador de Política Internacional do Observatório do Clima.
📙 Cultura
De três gerações diferentes, Juliana Linhares, 35, Anna Torres, 53, e Chico Buarque, 81, são influenciados pelo cantor, compositor e músico João do Vale. Nascido em 1934, no Lago da Onça, comunidade quilombola de Pedreiras, no Maranhão, o talento e a sensibilidade de suas composições marcaram a história da música brasileira, com gravações nas vozes de nomes como Maria Bethânia, Nara Leão, Luiz Gonzaga, Alceu Valença, Caetano Veloso e Gilberto Gil. Suas músicas reverberam também na nova geração: a potiguar Juliana Linhares, quase cinco décadas mais nova que Chico Buarque, estreou o espetáculo “Juliana Linhares canta João do Vale”, em Salvador, neste ano. Série especial do Meus Sertões narra a trajetória do cantor maranhense e sua influência para a formação musical de gerações de artistas brasileiros.
🎧 Podcast
O caça às bruxas nos séculos 16 e 17 institucionalizou a perseguição às mulheres no Ocidente e tem elementos reais ainda hoje. Em 2022, quando a jornalista Natalia Viana estudava nos Estados Unidos, conheceu uma senhora cuja antepassada foi morta acusada de bruxaria. A série “Caça às Bruxas: Uma História de Terror Real”, produção da Agência Pública, mergulha em documentos históricos e relatos de especialistas para desvendar o processo de perseguição às mulheres, que foram condenadas à morte em tribunais civis, com juízes e testemunhas.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
“A minha atividade é cheia de vivências que trago ao longo da minha existência. A charcutaria tradicional me ensinou isso: cada corte, tempo de cura e tempero escolhido é um convite a respeitar a história e a transformá-la em legado. Ao longo da minha jornada, compreendi que inovar não é apagar o passado, mas aprender a dialogar com ele”, afirma a historiadora Cristiana Vasconcelos. A partir de frutas nativas e saberes tradicionais da Amazônia, ela criou 48 cervejas autorais. O Amazônia Vox reúne iniciativas amazônidas que usam ingredientes e conhecimentos ancestrais para criar bebidas com sabores únicos da localidade e reforçar a possibilidade de uma economia que conviva com a biodiversidade da floresta.



