A CPI dos atos golpistas e os crimes com vozes infantis geradas por IA
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🔸 Em debate desde o dia seguinte ao 8 de janeiro, a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar os ataques a Brasília foi, enfim, aberta ontem no Congresso Nacional. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), num primeiro momento, foi contra, como lembra a Lupa. Os bolsonaristas passaram então a reforçar a tese de que os atos ocorreram por descaso do governo. Agora, com a CPMI instalada, o próximo passo é a indicação pelos partidos de seus representantes para o colegiado da comissão. São 16 senadores e 16 deputados federais.
🔸 Em tempo: já existe uma CPI dos Atos Antidemocráticos. Ela atua há três meses e foi instaurada na Câmara Legislativa do Distrito Federal, logo após os ataques golpistas. Embora tenha as mesmas funções daquela que foi criada ontem, segundo o Nexo, a diferença está no peso do jogo político: a comissão formada por deputados e senadores, com lideranças do Congresso Nacional, dá mais visibilidade à disputa de versões de governo e oposição sobre o tema. A reportagem explica o trabalho da CPI da Câmara do Distrito Federal que ouviu até agora seis pessoas, a maioria membros das forças de Segurança Pública do DF e da Polícia Militar.
🔸 “Sem querer” e sob efeito de medicamentos. Assim Jair Bolsonaro (PL) justificou a postagem de um vídeo contendo mentiras sobre o resultado das eleições logo após os atos criminosos em Brasília. Em depoimento à Polícia Federal, ele confirmou ter publicado o conteúdo, mas disse que pretendia apenas “salvar para ver depois” e acabou postando “sem querer”. A CartaCapital informa ainda que os advogados do ex-presidente sugeriram que ele havia tomado medicamento – na ocasião, ele tratava uma erisipela na perna.
🔸 A Justiça suspendeu o Telegram no Brasil. Isso porque a empresa não respondeu a um pedido da Polícia Federal: deveria entregar informações sobre um canal e um grupo de conteúdo neonazista hospedados na plataforma, em meio às investigações sobre atentados a escolas. O Mobile Time explica que o pedido foi motivado pelo ataque a uma escola em Aracruz (ES), em novembro de 2022. O assassino participava do grupo neonazista do Telegram.
🔸 O Complexo da Maré viveu ontem a quarta operação policial em um mês. Os 140 mil moradores do conjunto de 16 favelas na zona norte do Rio de Janeiro amanheceram com blindados nas ruas e confrontos que inviabilizam sua circulação nas comunidades. O Maré de Notícias ressalta que pelo menos 35 escolas interromperam o funcionamento por mais um dia, o que tem impacto na vida de mais de 12 mil estudantes. Também se repetem os relatos de invasões a residências sem mandados judiciais.
📮 Outras histórias
“Eu tinha deixado a louça por último e não lavei porque tinha passado do meu horário. O apartamento era muito grande e, nesse dia, eu limpei toda a casa e as geladeiras. Me chamaram a atenção por não ter lavado a louça.” O relato de uma empregada doméstica cujo nome foi preservado expõe a falta de valorização e o desamparo de uma classe trabalhadora que, dez anos atrás, recebeu direitos por lei, por meio da PEC das Domésticas. O Desenrola e Não Me Enrola compila outros relatos que revelam a ausência de benefícios trabalhistas para que essas mulheres tenham uma jornada condizente com os direitos previstos na PEC, algo que poderia evitar desgastes físicos e mentais a longo prazo.
Em vídeo: na zona sul de São Paulo, são mais de 10 mil famílias ameaçadas de despejo e remoção, como estima a União dos Movimentos de Moradia (UMM). Neste ano, no Morro do Ketchup, em Parelheiros, mais de 70 famílias foram notificadas sobre a remoção, mas não sabem para onde vão. O direito à moradia e a luta coletiva das comunidades estão em debate no documentário “Meu Endereço É a Luta”, feito pela Periferia em Movimento em parceria com o Laboratório de Justiça Territorial (LabJuta) da UFABC e diversos movimentos sociais.
📌 Investigação
O pau-brasil apreendido internacionalmente saiu de unidade de conservação. A 20 metros de um espaço aberto a turistas no Parque Nacional do Pau Brasil, em Porto Seguro, no sul da Bahia, estavam árvores cortadas, incluindo o raro pau-brasil. Antes que seguissem para abastecer mercados ilegais, elas foram interceptadas por fiscais ambientais que atuam no parque. A revista piauí e a Fiquem Sabendo tiveram acesso a laudos e relatórios inéditos da Polícia Federal e da agência governamental estadunidense US Fish and Wildlife Service. Os documentos atestam que parte da madeira encontrada saiu ilegalmente da unidade localizada na Costa do Descobrimento, patrimônio natural mundial da Unesco e abrigo de espécies da Mata Atlântica. A região ainda enfrenta problemas como violência contra servidores, ameaças a moradores e disputa por terras.
🍂 Meio ambiente
Fazendas fornecedoras da Coca-Cola e Nestlé fazem pulverização aérea de agrotóxicos perigosos. Moradores do município de Rancharia, no interior de São Paulo, frequentemente sentem o cheiro forte e as gotículas na pele dos produtos despejados em plantações de laranja e cana-de-açúcar pelo avião contratado pela Usina Atena. Os efeitos de intoxicação são sentidos por eles: coceira, manchas no corpo e dores no estômago. A Repórter Brasil revela que a usina fornece açúcar para uma empresa chinesa que, por sua vez, revende para a Nestlé e Coca-Cola. Os pesticidas usados incluem aqueles que são proibidos pela União Europeia.
Cientistas de 15 instituições apontam que o governo brasileiro precisa incluir o combate à degradação florestal no Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), que voltou a vigorar. O Eco explica que apenas o combate ao desmatamento não soluciona a questão da degradação – enquanto o desmate se dá por meio do corte seco e da retirada da vegetação, a degradação ocorre por meio do fogo e da exploração madeireira ilegal. As medidas de prevenção a incêndios são um motivo a mais de preocupação com a previsão de que a probabilidade de ocorrência do fenômeno El Niño entre junho e agosto é de 75%. Para a Amazônia, isso significa uma temporada mais seca e mais quente que o normal.
📙 Cultura
Apenas dois autores negros foram premiados pelo Prêmio Camões em 32 edições. Atribuída anualmente desde 1989, a premiação é considerada a maior honraria literária dos países de língua portuguesa – Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Portugal e Timor Leste. Ao lado de Portugal, o Brasil é o país que mais venceu, com 14 premiados cada. O Notícia Preta destaca a falta de autores negros vencedores do prêmio e resgata a pesquisa da Universidade de Brasília (UnB) que aponta que, entre 2004 e 2014, 97,5% dos autores publicados no país eram brancos e apenas 6,9% dos personagens retratados em romances eram negros.
As histórias de cozinheiros da Rocinha, favela da zona sul do Rio de Janeiro, ganham curtas-metragens. Ao longo de três meses, o projeto “Vozes da Cozinha: Sabores, Saberes e Memória na Rocinha" documentou a trajetória de sete moradores que recheiam a culinária local. Realizada pela equipe do Centro de Criação de Imagem Popular (CECIP), a iniciativa resultou em seis curtas documentais e um podcast dividido em seis episódios. Uma dessas histórias é a do confeiteiro Nilton da Silva, de 58 anos, um dos vendedores de sonho mais antigos e conhecidos da região. O Fala Roça conta que o material audiovisual agora compõe o acervo do Museu Sankofa Memória e História da Rocinha.
🎧 Podcast
Organização de nacionalistas perseguiu compatriotas japoneses que aceitavam a derrota da Segunda Guerra. A Shindo Renmei se instalou entre os imigrantes no Brasil com uma crença conspiratória de que o Japão havia vencido o conflito. Conhecidos como kachigumi, eles passaram a perseguir os makegumi (ou derrotistas). A “Rádio Escafandro”, produção da Rádio Guarda-Chuva, traz a segunda parte do episódio que mergulha na história do grupo com depoimentos de parentes dos kachigumi e dos makegumi, refletindo sobre os impactos desse período, no final dos anos 1940, para a comunidade nipo descendente até os dias de hoje.
👩🏽💻 Tecnologia
Os golpes com vozes de crianças geradas por inteligência artificial. A partir de conteúdo publicado nas redes sociais, grupos criminosos têm usado programas de clonagem de voz ou deepfakes para enganar as vítimas. Segundo o Lunetas, foi registrado um caso do tipo nos Estados Unidos. Especialista em tecnologia de geolocalização, Eduardo Pires afirma que o material falso criado nessas tecnologias vem de informações compartilhadas pelos próprios alvos na internet. “Essas ferramentas têm acesso e são alimentadas por arquivos de voz ou de imagem utilizados para gerar recortes e tentar criar um novo conteúdo, que emula aquele padrão de imagem e de som iniciais. O que antes era feito apenas com imagens, hoje também é feito com a voz das pessoas”, aponta.