A 'cortina de fumaça' da Petrobras e as árvores falsas na sede da COP30
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🔸 “Estou sabendo que, na Foz do Amazonas, o senhor está pensando no petróleo que tem debaixo do mar. Eu penso que não. Porque essas coisas, na forma como estão, garantem que a gente tenha um meio ambiente, a terra com menos poluição e menos aquecimento”, disse o cacique Raoni Metuktire ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), na última sexta-feira. O petista condecorou o indígena com a Ordem Nacional do Mérito, no grau Grã-Cruz, o mais elevado das cinco ordens. Segundo a CartaCapital, Raoni disse ainda que já teve “contato com os espíritos” e que eles “sabem dos riscos que a gente tem de continuar trabalhando dessa forma, de destruir e destruir e destruir”. No último dia 31, a presidenta da Petrobras, Magda Chambriard, afirmou que aguarda ainda em abril a autorização do Ibama para a exploração de petróleo na Foz do Amazonas.
🔸 A Petrobras, aliás, concluiu uma obra exigida pelo Ibama para explorar o combustível na região. A petroleira finalizou a construção da Unidade de Atendimento e Reabilitação de Fauna em Oiapoque (AP), uma das exigências do órgão ambiental para a licença. A Eixos explica que a instalação funcionará como hospital para animais afetados por operações offshore e já tem licença estadual para operar. Falta agora uma vistoria do Ibama.
🔸 A propósito: embora a Petrobras afirme que pretende perfurar apenas um poço no bloco FZA-M-59, há um plano estratégico para abrir toda a margem equatorial à exploração petrolífera, revela a InfoAmazonia. A reportagem do especial “Até a Última Gota” mostra que a petroleira planeja perfurar 15 poços até 2029, com investimento de US$ 3 bilhões. A tática seria usar o bloco 59 como precedente para liberar licenças em áreas vizinhas. Técnicos do Ibama já negaram três vezes o pedido da Petrobras, alegando riscos socioambientais. Num caso de vazamento de petróleo na região, a comunidade de Sucuriju, com 387 habitantes, seria a primeira atingida. Isolada entre manguezais e áreas protegidas, como a Reserva Biológica do Lago do Piratuba, a vila já foi base de operações petrolíferas nos anos 1970, quando a Shell instalou tanques de combustível ainda visíveis na comunidade. Hoje, os vestígios são lembranças da primeira tentativa fracassada de extração, mas o temor é que os impactos de uma nova investida possam ser muito mais profundos.
🔸 Enquanto isso, na sede da COP30… o governo do Pará instalou “árvores fake” – feitas com ferro e vasos de plantas, batizadas de “árvores artificiais ecológicas” – em Belém, cidade pouco arborizada e que desmatou ainda mais para abrir espaço à Conferência do Clima das Nações Unidas, marcada para novembro. A Sumaúma conta que a capital perdeu mais de 500 hectares de vegetação urbana em 20 anos e segue derrubando árvores para abrir avenidas. O governo paraense afirma que plantará árvores reais também, mas considera as árvores artificiais ecológicas porque vergalhões de obras foram reaproveitados para simular os caules. “Não é porque está fazendo reaproveitamento de material que é efetivamente ecológica. Quais são os serviços ecológicos de uma árvore? Existem vários: a sombra, o fruto, a irrigação, o filtro de ar. Não se pode dizer que é ecológica quando uma árvore anula vários desses elementos e só faz sombra”, avalia o professor André Farias, da Universidade Federal do Pará.
📮 Outras histórias
Nos bairros periféricos de Salvador, como Nordeste de Amaralina e Tancredo Neves, a ausência de abrigos nos pontos de ônibus obriga os moradores a esperar pela condução sob sol forte, chuvas e ao lado de lixo. “Quando a chuva cai, a gente tem que correr para os pontos comerciais, caso a gente encontre, calhas das casas, barracas espalhadas aqui no bairro, ver uma forma de se proteger”, diz o entregador dos Correios, Paulo Roberto Argolo, 55 anos. A Entre Becos conversa com quem usa o transporte público nos bairros e detalha os problemas enfrentados no dia a dia. Para a arquiteta Gabriela Santiago, a capital baiana sofre com a chamada “espetacularização do espaço”: há regiões planejadas para atingir o turismo e o comércio, mas há intenção não está atrelada às reais necessidades do público. “Este movimento explica o porquê de termos áreas centrais e/ou nobres da cidade com tanto investimento em mobilidade urbana, enquanto as regiões periféricas continuam sem ter infraestrutura básica, como os abrigos em ponto de ônibus”, afirma.
📌 Investigação
“Os eucaliptos secaram as nascentes. O que antes dava para plantar, agora virou terra morta”, afirma João Batista, agricultor de Veredinha, município do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. A monocultura de eucalipto da Aperam, a maior produtora de aço inox da América Latina, gerou uma escassez hídrica para as comunidades locais. A empresa tem 124 mil hectares na região, dos quais 76 mil são de eucalipto. A maior parte dessas terras foi repassada na década de 1970 durante a ditadura militar para uma estatal, a Acesita, privatizada nos anos 1990. A Repórter Brasil mostra que os certificados de boas práticas ambientais da Aperam estão em xeque devido aos conflitos fundiários com as comunidades e à falta de provas de que a empresa não causou a escassez de água. Ao contrário, a maioria dos estudos comprova que o eucalipto tem reduzido a reserva dos lençóis freáticos na região.
🍂 Meio ambiente
Vítima da poluição por esgoto doméstico e industrial e uso inadequado do solo, a Represa Billings, que banha seis municípios da Grande São Paulo, completou cem anos em março. Planejada inicialmente para alimentar a hidrelétrica Henry Borden, em Cubatão, atualmente é um dos principais reservatórios de água da cidade. A Agência Mural traz dez histórias de moradores que usam a represa cotidianamente e fazem da preservação ambiental uma missão de vida. “Muitas pessoas ainda não conhecem a Billings. Algumas moram aqui e têm medo de entrar na água. Sonho que, no futuro, a represa seja um ponto turístico conhecido”, conta Uiara de Souza Dias, viúva do ativista Adolfo Duarte, o Ferruge, assassinado em 2022. A ONG Meninos da Billings, fundada por ele em 2014, promove ações de vivências náuticas na represa, com caiaques, remos e coletes salva-vidas, além de fazer mutirões de limpeza nas margens da represa.
📙 Cultura
“É muito importante reconhecer os patrimônios alimentares do Brasil. A agricultura e a alimentação contêm bens culturais que contam a nossa história e a nossa identidade cultural”, afirma a historiadora e pesquisadora Gabriella Pieroni. Segundo o Nonada, atualmente existem cinco práticas e saberes ligados à alimentação já reconhecidos como patrimônio cultural, e outros quatro estão em processo de registro. “Esses saberes e práticas incluem modos tradicionais de cultivar, colher e preparar alimentos, além das dinâmicas culturais que incluem o significado de determinados alimentos, a transmissão de conhecimentos e o compartilhamento de refeições. Dessa forma, o alimento se torna um elemento simbólico que conecta pessoas, sociedade e cultura”, explica Sabrina Silva, técnica em História pelo Departamento de Patrimônio Imaterial e servidora do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
🎧 Podcast
Material sólido mais usado no mundo, o cimento é responsável por mais de 7% das emissões globais de carbono, não apenas pela energia elétrica necessária, mas também pelo próprio processo químico de fabricação para isolar o óxido de cálcio. No “Economia do Futuro”, produção da Rádio Guarda-Chuva, Marcelo de Oliveira, vice-presidente de ciência de materiais e geologia de uma startup que busca desenvolver um método para reduzir as emissões das cimenteiras, explica os desafios de transformar a indústria toda. Uma das estratégias do projeto é substituir o calcário por silicato de cálcio. Ao mesmo tempo que não libera o CO2, a iniciativa também busca utilizar o silício e o alumínio da mesma rocha para não gerar rejeitos e otimizar a produção.
👩🏾⚕️ Saúde
Apesar de o Brasil ter cerca de dois milhões de pessoas portadoras do Transtorno do Espectro Autista (TEA) – segundo estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) –, ainda existem barreiras que impedem a oferta de terapias adequadas, como o baixo número de profissionais especializados para lidar com o transtorno nas áreas da saúde e da educação, falta de informações corretas e autodiagnóstico. O “Desenrola Aí”, produção do Desenrola e Não Me Enrola, conversa com Rebeca Motta, psicóloga e especialista em TEA, sobre os primeiros sinais na infância, as diferenças entre os graus e o acesso a tratamentos. “Existem dados científicos que comprovam que, quanto antes uma criança for diagnosticada, melhor para o desenvolvimento e a aquisição de novas habilidades. Quando as famílias são impedidas de terem acesso a uma informação que pode mudar a qualidade de vida delas, isso também é uma forma de violência.”