A conivência do governo com Lira e as tradições do candomblé no Ano Novo
Uma curadoria do melhor do jornalismo digital, produzido pelas associadas à Ajor. Novos ângulos para assuntos do dia
Oi, gente,
bom dia!
Esta é a última edição da Brasis em 2024. Vamos entrar em recesso e voltamos em janeiro.
Neste ano, mais uma vez, a newsletter da Ajor cresceu junto com a organização: quando começamos, eram cerca de 90 associadas; agora, são mais de 150. Esse salto enriqueceu as perspectivas que trazemos na Brasis, com uma presença cada vez maior de organizações do Norte do país, por exemplo.
Completamos o segundo ano de circulação com nossa primeira cobertura de eleições municipais – e buscamos afirmar ainda mais a força do ecossistema do jornalismo digital, com uma curadoria que contemplou todas as regiões do Brasil. Ao longo de 2024, escrevemos em tempo real sobre acontecimentos que marcaram a história.
Acompanhamos o desastre sem precedentes no Rio Grande do Sul a partir do jornalismo local. Noticiamos o inquérito e a condenação dos assassinos de Marielle Franco por meio do rigor do jornalismo investigativo. Cobrimos as Olimpíadas de Paris com recorte de gênero, e a letalidade policial com perspectiva de raça. Contamos histórias de personagens de todo o país, das mulheres rendeiras de Alagoas à mototaxista pioneira do Morro do Vidigal.
Fazemos agora uma pausa e voltamos em 2025. Entre os dias 6 e 10 de janeiro, vocês vão receber edições especiais com uma curadoria de assuntos que marcaram 2024. A partir do dia 13, voltamos com as edições regulares.
Boas festas e até já,
Audrey Furlaneto (editora) e Tainah Ramos (redatora).
🔸 “Tudo combinado com o governo.” Assim o deputado José Guimarães (PT-CE), líder do governo na Câmara, respondeu à revista piauí sobre a recente manobra de Arthur Lira (PP-AL), que carrega várias ilegalidades. O repórter Breno Pires revelou que o presidente da Câmara transformou as emendas feitas pelas comissões permanentes em “emenda de líderes” – uma forma de driblar decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) que exigem transparência no processo. O jornalista ouviu mais de dez deputados para entender o grau de envolvimento do governo na manobra. “O que está acontecendo é que o governo está sendo chantageado, a exemplo do STF, pela esmagadora maioria do Centrão aqui”, afirmou o deputado Ivan Valente (PSOL-SP), que se declara a favor das medidas definidas pelo Supremo.
🔸 “Não fui pega de surpresa, porque no Brasil em que nós vivemos não existe justiça, em especial para preto e pobre.” A frase é de Luciana Nogueira, viúva do músico Evaldo Rosa, morto com tiros de fuzil disparados por agentes do Exército em 2019. Ontem, o Supremo Tribunal Militar (STM) absolveu os militares envolvidos da morte do músico. Eles tiveram as penas reduzidas a cerca de três anos – em regime aberto. A Agência Pública acompanhou Luciana, que viajou a Brasília para ver o julgamento ao lado do filho, David Bruno. Embora os ministros tenham apertado a mão da viúva, a ministra Elizabeth Rocha, única mulher a integrar a Corte, foi a única que disse: “Sinto muito. Sinto muito, mesmo”.
🔸 Por dia, quatro brasileiras que moram no exterior são vítimas de violência. É o que mostram dados inéditos do Mapa Nacional da Violência de Gênero. Os números foram disponibilizados pelo Ministério das Relações Exteriores em iniciativa viabilizada pela Gênero e Número, Observatório da Mulher Contra a Violência (OMV) do Senado Federal e Instituto Natura. Segundo os registros consulares, em 2023, 1.556 brasileiras sofreram violência doméstica ou de gênero fora do país e buscaram ajuda. A Europa concentrou 61% dos registros, com destaque para Itália (350 casos) e Reino Unido (188), enquanto os Estados Unidos lideraram na América do Norte com 240 casos. A principal forma de violência registrada foi a violência vicária, envolvendo disputas de guarda ou subtração de menores, representando 58% dos casos. Na Europa, 78% dos registros foram desse tipo.
🔸 O governo do Pará facilitou as regras para licenças de garimpo, medida que amplia o impacto ambiental na Amazônia paraense. A Repórter Brasil explica que a nova norma transferiu para os municípios a emissão de licenças ambientais para garimpos de até 50 hectares, o que enfraquece o controle sobre a atividade. Na APA Tapajós, maior Unidade de Conservação invadida por garimpeiros no Brasil, a medida tem impulsionado o desmatamento e a contaminação dos rios. Segundo o ICMBio, as licenças municipais são “precárias” e ignoram planos de recuperação ambiental. A reportagem mostra ainda que, nesse modelo, o licenciamento abre brecha para a aprovação de grandes empreendimentos garimpeiros fragmentados em pequenas áreas contíguas.
📮 Outras histórias
No ano em que viveu sua pior crise ambiental, Rondônia ostenta uma decoração natalina de R$ 3 milhões – com dinheiro público. O Varadouro lembra que, em 2024, a fumaça das queimadas provocada pela ação criminosa encobriu cidades inteiras. O impacto na saúde foi visto nos hospitais superlotados. O governo, então, dizia não ter estrutura, brigadistas e aeronaves para combater os incêndios na floresta. O Rio Madeira ficou sem água, e centenas de ribeirinhos ainda sofrem as consequências. A reportagem destaca que, com os R$ 3 milhões gastos na iluminação de Natal, seria possível construir cerca de 30 unidades habitacionais de interesse social.
📌 Investigação
Entidades ultraconservadoras que atuam no lobby contra o aborto legal, como o Instituto Isabel, têm atuado para impedir a regulação das plataformas digitais no Congresso, sob a bandeira de uma suposta defesa da liberdade de expressão. No início do mês, a organização foi convidada a discursar na instalação da Frente Parlamentar em Defesa da Liberdade de Expressão, que reúne deputados de direita e promete monitorar iniciativas do Legislativo relacionadas à agenda digital. Segundo o Aos Fatos, o instituto mantém uma parceria com a organização fundamentalista dos Estados Unidos Alliance Defending Freedom (ADF) – parte do movimento antiaborto – para atacar o Brasil no exterior a partir da alegação de que o país vive um regime autoritário.
🍂 Meio ambiente
O nascimento do primeiro filhote de arara-azul saudável após os incêndios que atingiram o Pantanal no início de agosto emocionou os pesquisadores do Instituto Arara Azul, que atuaram para garantir a sobrevivência da espécie em meio ao fogo. As chamas chegaram a consumir os ninhos naturais e artificiais que a equipe da iniciativa disponibilizava. “Esse é o primeiro filhote da estação reprodutiva, primeiro filhote depois do fogo, é um filhote que traz muita esperança pra gente”, disse a médica veterinária Maria Eduarda Monteiro. No Conexão Planeta, a jornalista Cláudia Gaigher acompanhou o trabalho dos pesquisadores no maior refúgio da vida silvestre do Pantanal no Mato Grosso do Sul: “Depois que as chamas são apagadas, o trabalho dos pesquisadores continua e até se intensifica. Tem sido necessário um gigantesco esforço para garantir a reprodução das araras-azuis”.
📙 Cultura
A infância da jornalista e escritora Catharina Vale foi banhada pelas lendas e histórias ligadas à água. As narrativas eram contadas por seu avô, que era pescador em Barreirinhas, onde ficam os Lençóis Maranhenses. Em entrevista ao Portal Assobiar, ela fala sobre seu livro-reportagem “Lendas que Atravessam o Rio Preguiça”, que documenta as lendas tradicionais de Barreirinhas e como o turismo predatório na região está destruindo a cultura local. “Agora existem poucos pescadores porque lá não se vive mais da pesca, se vive agora do turismo. Pesca, para eles, era uma arte, pois teciam as próprias redes para pescar, fazer os próprios barquinhos de madeira e era uma coisa que era passada de geração para geração. Só que com o tempo, com as famílias indo pra cidade deixando a beira do rio, foi uma coisa que foi se perdendo”, conta.
🎧 Podcast
Como pensar a política e o futuro quando se está perto da morte? Esta foi a pergunta que guiou a jornalista Carol Pires na entrevista que fez com o ex-presidente do Uruguai, José Mujica. No “Rádio Novelo Apresenta”, produção da Rádio Novelo, a repórter relembra quando foi ao país vizinho, em 2012, para escrever o perfil de um dos maiores nomes da esquerda latinoamericana. Doze anos depois, Carol reencontra Mujica, na mesma chácara de onde nunca se mudou. Com um câncer no esôfago aos 89 anos, o ex-presidente uruguaio fala sobre a necessidade de formar sucessores e reflete sobre a imaginação política da esquerda.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
Vestir branco, pular ondas e flores ao mar são alguns dos costumes populares nas celebrações de Ano Novo no Brasil. São tradições com origem no candomblé, religião de matriz africana que carrega histórias e rituais transmitidos por gerações. A Alma Preta explica que popularizar as raízes desses costumes é um modo de combater o racismo religioso. “Celebrar o Ano Novo com essas práticas é, de certa forma, honrar a ancestralidade africana que construiu a base de muitos costumes brasileiros. Reconhecer isso é um passo importante para combater a intolerância religiosa e valorizar a riqueza cultural do Brasil”, afirma o sacerdote Baba Thales.