Uma comunidade contra os agrotóxicos e a ciência indígena na Amazônia
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🔸 “Os governos tendem a ser conservadores. Mas se, por exemplo, empresas asseguram que podem ser mais ambiciosas no combate à mudança do clima, vários governos poderão mudar de posição.” Assim o embaixador André Corrêa do Lago defende a importância do que chama de “mutirão” da sociedade para evitar o colapso ambiental. Em entrevista à Sumaúma, o presidente da COP30, a Conferência do Clima das Nações Unidas, afirma que a “esmagadora maioria” do agro abraça a agenda ambiental (“A sustentabilidade é uma enorme oportunidade para o setor, e acredito que a grande maioria do setor está convencida disso”) e se vale da experiência de 42 anos como diplomata para não se posicionar sobre temas espinhosos, como a exploração de petróleo na Foz do Amazonas. “É perfeitamente legítimo que esse debate ocorra dentro dos limites da soberania nacional, porque não há nenhuma obrigação internacional para que o Brasil vá numa direção ou noutra neste momento”, argumenta.
🔸 Por falar em clima… as cem cidades mais populosas do mundo estão cada vez mais vulneráveis a secas e inundações extremas, segundo estudo das universidades de Bristol e Cardiff, em parceria com a ONG WaterAid. No ranking da pesquisa, mostra o Colabora, São Paulo e Rio de Janeiro aparecem como a 13ª e a 20ª metrópoles mais atingidas por estiagens prolongadas. O estudo aborda o fenômeno do “chicote climático”, em que cidades alternam entre períodos de secas e inundações intensas. Cidades do sul da Ásia enfrentam cada vez mais enchentes, enquanto metrópoles europeias, como Madri, Paris e Londres, registram secas prolongadas.
🔸 O lobby da indústria de ultraprocessados, do agronegócio e do setor varejista atuou no Congresso para evitar a tributação extra desses produtos, prevista na reforma tributária pelo Imposto Seletivo, o chamado “imposto do pecado”. É o que revela um estudo feito pelo Instituto de Defesa de Consumidores e pela ACT Promoção da Saúde. A Repórter Brasil detalha a publicação, segundo a qual esses setores não só impediram a taxação elevada de itens prejudiciais à saúde, como também conseguiram incluir ultraprocessados na cesta básica, que será isenta de impostos. Além das reuniões da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia) com o governo para influenciar a reforma, a União Nacional da Cadeia Produtiva de Alimentos e Bebidas (Uncab), que reúne indústrias de proteína animal e refrigerantes, lançou campanhas para convencer a população de que a taxação prejudicaria os mais pobres.
🔸 A Receita Federal abriu ontem o período de entrega da declaração do Imposto de Renda 2025, referente ao ano-base 2024. O prazo vai até 30 de maio, e a expectativa é de que 46,2 milhões de declarações sejam enviadas. O Nexo explica quem precisa declarar, como declarar e quais os prazos. É possível deduzir gastos com saúde, educação, previdência privada e pensão alimentícia. E quem perder o prazo pagará multa de no mínimo R$ 165 e no máximo 20% do imposto devido.
📮 Outras histórias
Espécie de entidade amazônida de três olhos e mascarada, Bonikta surgiu para Caio Aguiar quando, aos 16 anos, ele saiu do interior para morar em Belém. Artista natural de Ourém (PA), ele a desenha com traços retos e uma boca grande quadrada. Bonikta está presente em desenhos e pinturas que Caio mostrou em exposições como a Bienal das Amazônias e a Bienal do Mercosul. “Eu considero que ela sempre andou comigo, a Bonikta é uma extensão da minha pessoa”, conta. Em entrevista ao Nonada, o artista fala sobre o lugar da entidade em suas criações (“As boniktas são espíritos que conversam comigo pelos sonhos, que estão comigo, que vivem e habitam nesse lugar”), detalha seu processo criativo e conversa sobre o futuro. “Eu e Bonikta estamos acessando lugares inimagináveis, no sentido de que eu nunca imaginei chegar. Venho de um interior pequeno, onde nunca tinha acessado a arte nesse formato. Então, para mim o futuro está acontecendo agora.”
📌 Investigação
Apesar do acesso ao aborto legal ser uma pauta de competência federativa, vereadores de extrema direita usam seus mandatos e gastam dinheiro público para produzir e replicar projetos de lei inconstitucionais sobre direitos reprodutivos. Entre 2017 e 2024, foram apresentados 103 propostas sobre os temas aborto ou nascituro em Câmaras Municipais das capitais – a maioria buscando a restrição do acesso ao direito. Levantamento da revista AzMina revela que parlamentares homens são responsáveis por 76% dos 69 projetos de lei antiaborto, enquanto vereadoras mulheres são responsáveis por 68% das 34 propostas que buscam proteger o acesso ao aborto legal. Em um movimento chamado de “ofensiva antigênero”, o projetos de lei antiaborto buscam estabelecer uma série de exigências para acessar o serviço legal de interrupção da gestação, como a obrigatoriedade de ouvir batimentos cardíacos do feto ou receber informações falsas sobre supostos efeitos colaterais e psíquicos de um aborto.
🍂 Meio ambiente
“Aqui você planta alface, tá o trem mais lindo. Quando eles começam a jogar veneno, no outro dia você olha e dá vontade de chorar. Tudo amarelinho assim”, afirma Maria Rodrigues dos Santos, agricultora do acampamento do Leonir Orback, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), no município de Santa Helena de Goiás. O Joio e O Trigo conta que os acampados, à beira da rodovia GO-210, estão encurralados pelas monoculturas de soja e cana-de-açúcar e lutam pelo direito de não se intoxicar. Em março de 2022 e janeiro de 2023, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) coletou amostras de água do poço da comunidade e de um rio e um açude próximos e encontrou agrotóxicos proibidos na União Europeia como o fipronil e a atrazina. Também foi identificado o 2,4 D em valor 28 vezes superior ao máximo permitido pela legislação do bloco europeu.
📙 Cultura
Com agulha, linha e talos de coqueiro ou mandacaru, as mulheres de Água Branca e Marechal Deodoro, em Alagoas, criam padrões a partir de nós repetidos, conhecidos como bico e renda singeleza, patrimônio imaterial do estado. Sem moldes, as rendeiras constroem a peça diretamente sobre o tecido. Na série “Tamborim”, a Cajueira destaca patrimônios e bens imateriais alagoanos, do saber-fazer à culinária. Além da renda singeleza, o bordado filé é um símbolo de identidade do estado, e o ofício de filezeira é passado de mãe para filha. Apesar de sua riqueza cultural, Alagoas é o único estado do Nordeste que ainda não possui nenhum bem imaterial local e próprio registrado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). O órgão, porém, tem atuado há uma década junto à Secretaria de Cultura de Alagoas para realizar uma pesquisa de campo dedicada a identificar e mapear esse patrimônio.
🎧 Podcast
Os saberes ancestrais e as práticas milenares de manejo da floresta a partir da observação da natureza e da interação com os espíritos que a habitam são a base da ciência indígena na Amazônia. O “Olhos d’Água”, produção da Amazônia Latitude, explora como o conhecimento tradicional revela caminhos para a conservação e restauração dos ecossistemas amazônicos. Acadêmico indígena do povo Utã pino pona-Tuyuka, Justino Rezende tem atuado como ponte entre os conhecimentos ancestrais e as metodologias acadêmicas ocidentais: “A ciência indígena que nós aprofundamos tentando fazer uma equivalência linguística para fazer a sociedade não indígena entender é de que os nossos conhecimentos também são elaborados por pessoas especialistas que se especializaram em diversas áreas de conhecimentos, os territórios, como compreendem as árvores, frutas, ciclos de vida, ciclos de constelações, enchente dos rios, época de secas”.
🩺 Saúde
“A desinformação no campo da saúde se tornou uma estratégia política para um processo de consolidação de um autoritarismo de extrema direita e de um tipo de populismo anti-ciência, anti-Estado”, afirma Igor Sacramento, pesquisador e professor em Comunicação e Saúde na Fiocruz e na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Em entrevista à Agência Lupa, ele analisa o impacto das narrativas anticientíficas no aumento do negacionismo sobre vacinas, o funcionamento da desinformação sobre saúde e o uso do tema pela extrema direita. Para Sacramento, é necessário investir em educação midiática e científica para enfrentar os conteúdos que vão da negação dos imunizantes a curas milagrosas.