As chacinas no país e o hip hop como patrimônio cultural
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🔸 A Vila Cruzeiro, no Complexo da Penha, zona norte do Rio de Janeiro, amanheceu ontem com carros blindados nas ruas, helicópteros e tiros de operação das polícias Civil e Militar. O Voz das Comunidades informa que dez pessoas morreram e 16 unidades escolares da região foram impactadas, afetando 3.220 alunos. O número de fechamento de escolas municipais na capital fluminense por conta de operações policiais no primeiro semestre de 2023 (2.129 vezes) já superou o ano passado inteiro (2.128). Mais de 160 mil estudantes foram prejudicados.
🔸 Nos últimos cinco dias, pelo menos 45 pessoas foram mortas em chacinas policiais no Complexo da Penha (RJ), na Baixada Santista (SP), e em Salvador, Itatim e Camaçari, na Bahia. O Fogo Cruzado compila os dados e o período de cada uma delas e lembra que, em 2023, foram registradas 18 chacinas na Grande Salvador, e 20 no Grande Rio – entre as dez maiores desde 2016, três foram na Penha.
🔸 “Sou trabalhador, nunca tive nenhum problema com a justiça, mas sou negro e tenho o braço tatuado. Eu sou um alvo fácil para eles”, relata um morador da região de Guarujá, onde ocorre a operação policial que já deixou 16 mortos desde a última sexta-feira. Ele não quis se identificar com medo de represálias. “Eles não respeitam ninguém. Estão invadindo as casas à procura de qualquer pessoa que tenha passagem pela polícia ou que tenha alguma tatuagem”, declarou à Alma Preta. O ouvidor das Polícias de São Paulo, Cláudio Aparecido da Silva, passou a manhã de ontem ouvindo relatos de pessoas que tiveram suas casas invadidas pela PM. Ele afirma que uma série de violações foram cometidas pelos agentes e exige que a Operação Escudo seja interrompida imediatamente.
🔸 Também pediu a interrupção imediata da ação a Defensoria Pública de São Paulo em documento enviado à Secretaria de Segurança Pública. Segundo a CartaCapital, as defensoras públicas Fernanda Balera, Surrailly Youssef e Cecilia Nascimento também já enviaram ofício ao Ministério Público do estado, solicitando a instauração de investigação das mortes causadas em decorrência da operação.
🔸 Em voto pela descriminalização da maconha para uso pessoal, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), destacou a desproporcionalidade racial no que atualmente é considerado tráfico e defendeu a fixação de uma quantidade de substância apreendida para se caracterizar porte ou tráfico, além de outros critérios como a quantidade de entorpecentes diferentes, a apreensão de balança de precisão e cadernos de anotação ou celular, como explica o Metrópoles. A Corte já tem quatro votos a favor da descriminalização e nenhum contra. Ainda faltam sete ministros, mas o julgamento foi suspenso após pedido de adiamento feito pelo ministro Gilmar Mendes. A data de retorno ainda não foi marcada.
📮 Outras histórias
O quilombo urbano Areal da Baronesa, em Porto Alegre (RS), espera há oito anos um último ato burocrático para sua titulação definitiva. A área pertence oficialmente ao município, que submeteu na Câmara dos Vereadores, em maio de 2015, um projeto que o autorizaria a doar a área aos moradores. A proposta foi aprovada por unanimidade no Legislativo, mas as últimas duas gestões não finalizaram o processo. O Matinal conta que o Areal da Baronesa é um dos principais e mais antigos redutos negros da capital gaúcha e começou a ser ocupado por negros alforriados no final do século 19, além de já ter sido certificado pela Fundação Cultural Palmares e reconhecido pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
📌 Investigação
“Olá, preciso de alguém que grave um depoimento de até 1,30 minuto se passando por um médico (a), e falando bem de uma empresa.” Este é o trecho de um anúncio publicado no VintePila, plataforma de “bicos” online. A Repórter Brasil identificou uma série de publicações nele e em um outro site similar, o Vinteconto. Inicialmente voltadas para a contratação de designers, locutores e outros profissionais freelancers a preços pequenos, as plataformas acabaram criando um mercado paralelo de “marketing de influência” que pode expor os trabalhadores a infrações legais.
🍂 Meio ambiente
Para a maioria da população de Rio Branco (AC), conviver com as queimadas já é algo considerado “cultural” neste período seco no sul da Amazônia – conhecido como verão amazônico. Desde 2019, a fumaça e a fuligem se tornaram mais frequentes na rotina dos rio-branquenses, além do risco de desabastecimento de água. Segundo a InfoAmazonia, os focos de incêndio anteriormente se concentravam na zona rural e hoje também acontecem na área urbana, mesmo sendo o local onde estão os principais órgãos de controle do estado. Entre as capitais da Amazônia, no ano passado, Rio Branco ficou atrás apenas de Porto Velho no registro de queimadas. Ambas integram o “arco do desmatamento”.
Moradores, pescadores e banhistas impediram um trator de aterrar o mangue e o leito de riacho na Garça Torta, em Maceió (AL), na segunda-feira. O grupo formou um “paredão” para travar a ofensiva. Os tratores eram do residencial de luxo Morada da Garça, cujos condôminos estavam incomodados com o avanço do mar dentro do empreendimento – consequência da instalação sobre um manguezal. À Mídia Caeté a comunidade local afirmou que deseja estudos de impacto ambiental e consulta à população. A Morada da Garça invadiu o mangue, e houve autorização, mas onde tem água por baixo, não há o que segure. A natureza vai comendo. E agora a ideia deles é aterrar o mangue, além de tudo privatizando o litoral norte. É uma invasão totalmente errada e predatória”, relata Lindair de Morais Amaral, parte do grupo que impediu a ação.
📙 Cultura
O hip hop pode se tornar patrimônio cultural imaterial do Brasil. É o que pede dossiê da Construção Nacional do Hip-Hop entregue ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). O documento ouviu cerca de 700 integrantes da cultura espalhados pelos 26 estados da federação e Distrito Federal e, ao longo de 73 páginas, analisa como ele está presente, ativo e com força em todas as regiões do país. O grupo ainda defende que, nesses 50 anos, o hip hop brasileiro trouxe características próprias, inclusive com diferenças regionais. O Nonada destaca que, caso o registro aconteça, o Brasil será o primeiro país a reconhecer essa cultura como patrimônio, colocando a arte periférica nacional em um espaço de protagonismo mundial.
Maior convenção geek das favelas, a Perifacon não só garante o protagonismo da periferia, como também a inclusão de mulheres periféricas no universo nerd. A terceira edição do evento aconteceu no último domingo, na Cidade Tiradentes, na zona leste de São Paulo, com mais de 50 atividades, entre painéis, shows, concursos de cosplays, salas de bate-papo e sessão de autógrafo. O Nós, Mulheres da Periferia acompanhou o evento e destaca a proposta de acesso aos materiais. “Observamos nas edições anteriores a necessidade de trazer mais brindes pra galera, porque, mesmo se a grana estiver curta pra comprar nas lojas ou editoras, não voltam para casa de mãos vazias”, diz Andreza Delgado, uma das fundadoras e organizadoras da iniciativa.
🎧 Podcast
Enquanto os aplicativos de delivery prometem entregas rápidas ao consumidor, os entregadores fazem uma corrida contra o tempo e recebem oito reais para percorrer cinco quilômetros. A jornalista Amanda Flora subiu na garupa da moto desses trabalhadores e registrou a condição das entregas no “Prato Cheio”, produção d’O Joio e O Trigo. O episódio conversa com os entregadores e lideranças do movimento Breque, Altemiro Nascimento e Piauí, e com Reinaldo, que presta serviços para Ifood, Rappi e Loggi.
✊🏽 Direitos humanos
“Eu não quero sorte pra minha filha, eu quero direitos. Por isso eu resolvi vir pro ativismo.” Thamirys Nunes é comunicóloga e fundadora da ONG Minha Criança Trans, criada para reivindicar políticas públicas para crianças e adolescentes trans, como sua filha Agatha. A ativista foi convocada para depor na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Transição de Gênero, instaurada na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) e deve ser ouvida neste mês. Em entrevista à Agência Diadorim, Thamirys afirma que a comissão tem o objetivo de “criar pânico moral”: “Eles fingem que estão preocupados com as nossas crianças, mas na verdade só querem atacar as nossas famílias e os profissionais que prestam um atendimento seríssimo”.
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