Uma bancada cristã na Câmara e a ação contra o petróleo no Amazonas
Uma curadoria do melhor do jornalismo digital, produzido pelas associadas à Ajor. Novos ângulos para assuntos do dia
🔸 “Vou disputar um quarto mandato no Brasil.” O presidente Lula confirmou ontem que vai concorrer à reeleição em 2026. A afirmação foi feita durante visita oficial a Jacarta, capital da Indonésia. O Notícia Preta destaca que, embora Lula já tenha indicado que gostaria de disputar o pleito em 2026, esta é a primeira vez que ele confirma presença na corrida eleitoral. O presidente também dissipou preocupações com a saúde que levantavam dúvidas sobre a possibilidade de concorrer mais uma vez: “Eu vou completar 80 anos, mas pode ter certeza que eu tô com a mesma energia de quando eu tinha 30 anos de idade e vou disputar um quarto mandato no Brasil. Nós ainda vamos nos encontrar muitas vezes. Este meu mandato só termina em 2026, no final do ano. Mas eu estou preparado para disputar outras eleições”.
🔸 Em Brasília, a Câmara aprovou a urgência do projeto que prevê uma bancada cristã. Com a medida, o texto será votado diretamente em plenário, sem passar pelas comissões. A proposta, apresentada pelos deputados Gilberto Nascimento (PSD-SP) e Luiz Gastão (PSD-CE), recebeu 398 votos favoráveis e 30 contrários. A Alma Preta explica a proposta, que, se aprovada, dará aos representantes da bancada o direito à palavra por cinco minutos semanalmente no plenário da Casa, além do direito ao voto no colégio de líderes. Segundo Nascimento, o projeto “busca dar voz a milhões de brasileiros que desejam ver representados, no Parlamento, seus princípios éticos e espirituais”. A deputada Talíria Petrone (PSOL-RJ) lembra que o Estado é laico: “Transformar a fé em instrumento institucional de poder é inconstitucional e perigoso. O Congresso não pode se tornar um púlpito. O uso político da religião ameaça a democracia e fere a igualdade entre as religiões, inclusive aquelas historicamente perseguidas, como as de matriz africana”.
🔸 Oito organizações ajuizaram uma ação civil pública contra Ibama, Petrobras e União para anular a licença concedida à petroleira para a exploração de petróleo na Foz do Amazonas. O grupo – formado, entre outros, pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), o Greenpeace Brasil, Instituto Arayara, Observatório do Clima e WWF-Brasil – pede uma liminar suspendendo imediatamente as atividades de perfuração, sob risco de danos irreversíveis ao meio ambiente. A Eixos detalha a ação que aponta ao menos três falhas na licença: ausência de consulta adequada aos povos indígenas, insuficiências na modelagem de dispersão de óleo e os impactos climáticos da abertura de nova fronteira. Segundo as organizações, a modelagem desconsidera correntes de subsuperfície, o que poderia levar ao afundamento do óleo e contaminação do leito marinho. Em tempo: a ação tem como base as conclusões técnicas do próprio Ibama. Servidores do órgão negaram recurso da Petrobras, que só obteve a licença após um segundo parecer pelo presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho.
🔸 A propósito: “No papel, a licença é de pesquisa, para checar se de fato existe petróleo na região de modo viável para só depois ser explorado. Mas ela abre caminho para que vários outros poços acabem sendo explorados na mesma região”, escreve Giovana Girardi, em artigo na Agência Pública. Ela lembra que, “em toda a Margem Equatorial (faixa que vai do litoral do Amapá, onde fica a foz do Amazonas, até o litoral do Rio Grande do Norte), a Petrobras tem planos de perfurar 15 poços até 2029, em um investimento de 3 bilhões de dólares”. “O bloco 59 é, portanto, apenas a porta de entrada”, completa. Girardi destaca ainda a autorização às vésperas da COP30, em Belém: “Que a licença ia acabar saindo mais dia menos dia já não era mais uma dúvida há algum tempo. (...) Mas que isso ocorra às vésperas da COP foi, sim, surpreendente. Lula tem repetido que quer que essa seja a ‘COP da verdade’, a COP em que os países vão mostrar se estão levando a sério o que a ciência diz sobre a crise climática”.
📮 Outras histórias
“Hoje eu entro nas escolas falando para os alunos: vocês têm a sua voz, e a sua voz é algo extremamente importante, é algo que causa muito impacto e vocês precisam falar.” A frase é de Anne Souza, artista sergipana que, ao lado da irmã Yala, levou o slam às escolas públicas com o projeto educacional Sankofa. O objetivo: uma educação libertadora e a formação de cidadãos críticos. A Mangue Jornalismo narra a trajetória das irmãs criadas na ocupação da Matinha, em Aracaju. Elas captaram expressões artísticas que emergiam daquela área, em especial o movimento hip hop com os elementos do grafite, rap e breaking. “Eu comecei a ouvir muito rap, foi aí que eu comecei a ter uma noção de pertencimento mesmo, de me identificar enquanto mulher negra, como mulher periférica, através das músicas que eu ouvia de rap, aí eu tive a vontade de querer escrever”, conta Yala. Hoje, ela tem 31 anos e Anne, 30. O projeto criado por ambas já percorreu dezenas de escolas públicas de Sergipe e do país, com oficinas de slam, campeonatos e projetos de leitura.
📌 Investigação
Enquanto o governo federal busca apresentar na COP30 os biocombustíveis como estratégia central para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, a expansão do setor é marcada por desmatamento, trabalho escravo e conflitos agrários. O relatório “A Conta dos Biocombustíveis”, produzido pela Repórter Brasil, revela custos socioambientais da produção de biocombustíveis e de seus insumos. Em março de 2023, 32 trabalhadores foram resgatados em uma fazenda de cana-de-açúcar em Pirangi (SP), em condições precárias, sem acesso a banheiros ou água potável, segundo a fiscalização. A empresa autuada tinha histórico de fornecimento de etanol à Raízen, uma das maiores produtoras mundiais de etanol. O avanço da fronteira agrícola pressiona também áreas de vegetação nativa, e a produção de sebo bovino, matéria-prima do biodiesel, não é rastreada até as fazendas, onde ocorrem as principais irregularidades.
🍂 Meio ambiente
Apesar de sua importância, a adaptação climática é subestimada e subfinanciada. É o que afirma o presidente da COP30, o embaixador André Corrêa do Lago. Em sua oitava e última carta endereçada à comunidade internacional antes da Conferência do Clima, no próximo mês, em Belém (PA), Corrêa do Lago considera a adaptação como a “própria essência” do desenvolvimento sustentável em um mundo de mudanças climáticas. O Eco reúne os principais pontos do documento, que expressa a necessidade de avançar nessa agenda. “A falta crônica de investimentos deixa os países vulneráveis, obrigando-os a desviar recursos escassos da saúde, da educação e da infraestrutura para respostas emergenciais e ações de recuperação.” Ele ressalta que atualmente a meta que existe para recursos em adaptação é de US$ 20 bilhões por ano, mas ela nunca foi cumprida.
📙 Cultura
“O racismo estrutural que atravessa a sociedade brasileira impôs barreiras históricas à presença negra no audiovisual. É nesse contexto que o cinema negro se ergue não apenas como linguagem, mas como uma demarcação política. Ele nasce como um território de disputa simbólica, de afirmação e de sobrevivência cultural”, escreve o escritor e produtor cultural Herlon Miguel. Em artigo no Le Monde Diplomatique Brasil, ele analisa o lançamento de “Malês”, dirigido por Antônio Pitanga, que narra a Revolta dos Malês, levante de escravizados muçulmanos em Salvador, em 1835. Herlon destaca a trajetória do ator Heraldo de Deus, que compõe o elenco do longa: “As experiências do intérprete ajudam a apontar caminhos que vão além da simples denúncia. Sua trajetória evidencia que políticas afirmativas no audiovisual precisam dialogar diretamente com a circulação: é essencial que as plataformas de streaming, hoje centrais no consumo audiovisual, adotem percentuais mínimos de obras nacionais e, dentro delas, garantam espaço significativo para produções dirigidas ou protagonizadas por pessoas negras”.
🎧 Podcast
Em novembro, Brasília será ocupada pela segunda Marcha Nacional das Mulheres Negras, dez anos depois da primeira edição, que reuniu mais de 100 mil manifestantes. O encontro pretende reunir agora um milhão de mulheres de todo o país para reivindicar reparação e bem viver. O “Conversa de Portão”, produção do Nós, Mulheres da Periferia, resgata cinco movimentos marcantes que ajudaram a construir a marcha por meio de associações e grupos locais que começaram a se articular desde os anos 1950 e ganharam mais força nas décadas seguintes, como o primeiro Encontro Nacional de Mulheres Negras no Brasil, em 1988, e a Marcha Zumbi dos Palmares contra o Racismo, pela Cidadania e a Vida, em 1995.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
“Trabalhar com moda marajoara, pesquisar e criar peças que carregam toda essa tradição é a minha alma. É a memória da gente, é parte de quem somos”, a costureira Rosilda Angelim. Ela vive no município de Soure, no Arquipélago do Marajó, no Pará, onde se instalou um polo de moda, em que costureiras e bordadeiras transformam tradição em pertencimento, renda e valorização da cultura. O Amazônia Vox narra como o projeto Polo de Moda do Marajó, criado a partir de um acordo de cooperação entre o Sebrae/PA, o governo do estado, prefeituras locais e outros parceiros, como Senar e Senai, tem desenvolvido a produção de moda artesanal local com referências culturais da arte marajoara.




