O aumento da violência contra indígenas e as 'casinhas da ONU' no RS
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🔸 Em 2023, o número de assassinatos de indígenas aumentou 15,5% com relação ao ano anterior. Foram 208 casos no ano passado, e 180 registros em 2022. Os números estão no relatório “Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil – Dados de 2023”, elaborado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Com a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a criação do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), o ano começou com expectativas de mudança, depois do mandato de Jair Bolsonaro (PL). “Sem demora, contudo, a realidade política se impôs. O Congresso Nacional atuou para esvaziar o MPI e atacar os direitos indígenas”, diz o relatório, referindo-se à lei do marco temporal. O Colabora detalha o documento e ouve os pesquisadores. “Antes, tínhamos um governo federal contra indígenas, incitando invasão de terras e violência. Hoje temos um governo que não faz isso. Mas tem um Congresso que faz isso”, afirma a coordenadora do trabalho, a antropóloga Lucia Helena Rangel.
🔸 A propósito: Roraima é o estado que concentra a maior parte dos assassinatos, com 47 homicídios de indígenas, seguido de Mato Grosso do Sul (43) e Amazonas (36). A Agência Pública destaca a situação dos Guarani-Kaiowá. No início deste mês, depois de retomar parte de seu território ancestral que estava ocupado pela monocultura, a Terra Indígena (TI) Panambi – Lagoa Rica, em Douradina (MS), foi invadida por jagunços de fazendeiros que começaram a atirar. “Nós estamos numa guerra onde o povo Guarani-Kaiowá é massacrado. A gente não vai ficar em paz sem a demarcação, homologação e posse do nosso território”, afirma um indígena que, por segurança, não quis se identificar.
🔸 Na Terra Indígena Yanomami, na Amazônia, a força-tarefa iniciada em 2023 está parada, e o garimpo ilegal não foi desarticulado por completo. A InfoAmazonia explora o que o relatório do Cimi traz sobre a situação na região. Em agosto do ano passado, por exemplo, os garimpeiros voltaram a invadir o território. Uma nova invasão foi registrada também em novembro. “A Operação Yanomami mostrou-se ineficaz. A desnutrição, a desassistência e a morte de mulheres, crianças e homens no território constam dos próprios dados oficiais. Pressionado, o governo buscou dar respostas, porém sempre de forma desarticulada e desorganizada”, escrevem Lucia Helena Rangel e Roberto Antonio Liebgott, em artigo no relatório.
🔸 No Pará, um grupo do povo Parakanã foi mantido refém por pistoleiros quando colhia cacau. A denúncia dos indígenas ocorre quatro meses depois de o governo anunciar a retirada de ocupantes ilegais da Terra Indígena Apyterewa, no sul do estado. Os pistoleiros, fortemente armados, fugiram antes da chegada da Funai e da Polícia Federal. Na Repórter Brasil, o jornalista Daniel Camargos conta que a região é reconhecida como território indígena desde 1982, embora a homologação tenha ocorrido apenas em 2007. As invasões são anteriores a isso, e a Apyterewa, cuja área equivale a cinco municípios de São Paulo, é a terra indígena mais desmatada do Brasil.
📮 Outras histórias
Foram dois meses pulando de abrigo em abrigo, depois de perder a casa no desastre climático no Rio Grande do Sul. Foi só na semana passada que Britney Louise Lima, 39 anos, conseguiu enfim se assentar. Mulher trans e mãe de um menino com transtorno do espectro autista, ela chegou a uma das casas do Centro Humanitário de Acolhimento (CHA) Vida, em Porto Alegre – ou “casinhas da ONU”, como são conhecidos os espaços transitórios erguidos pelas Nações Unidas. São ao todo três centros na capital. O Sul21 visitou a unidade Vida, quando completou a primeira semana de operação, e narra o cotidiano do centro. Lá, mais de 200 pessoas têm moradia até que suas casas sejam reconstruídas.
📌 Investigação
Baixos salários, contratos frágeis e sem direitos trabalhistas. Este é o cenário de trabalhadores que executam tarefas essenciais para o desenvolvimento de sistemas de inteligência artificial, como classificação de dados e moderação de conteúdo. Segundo o Intercept Brasil, por meio de plataformas multinacionais como Tellus, OneForma e a Appen, as empresas de tecnologia Meta, Google e TikTok contratam mão de obra barata, em larga escala e em diversos países, para executar pequenas tarefas. As big tech se beneficiam de uma cadeia que opera à margem da lei – sem representação legal no Brasil –, blindadas por contratos de confidencialidade, em que as pessoas nem sequer sabem para quem ou para quê estão trabalhando.
🍂 Meio ambiente
Há escassez de estudos científicos sobre mamíferos de médio e grande porte em pelo menos 70% da área do Cerrado. É o que indica levantamento inédito feito por pesquisadores da Universidade Federal de Lavras (UFLA), do Museu Paraense Emílio Goeldi e do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), publicado na revista científica “Biota Neotropica”. A Agência Bori ressalta que as regiões com poucas informações sobre esses animais se estendem pelos estados do Maranhão, Bahia, Piauí, Tocantins, uma parte do centro de Goiás e as fronteiras entre o Mato Grosso e Rondônia. A maioria dos estudos sobre mamíferos de médio e grande porte no Cerrado está restrita à divisa com a Mata Atlântica – e inexistem pesquisas publicadas sobre os animais do norte do bioma. A falta de pesquisas dificulta sobretudo as políticas de conservação das espécies.
📙 Cultura
“Somos uma frente performática. Um coro explosivo de corpas livres convulsivas”, afirma Laura Diaz, a Carneosso, da banda Teto Preto, formada também por Matheus Câmara (Entropia) e Marian Sarine (Sarine). O grupo, que completa 10 anos em 2024, é uma das grandes referências da música eletrônica de São Paulo. A Emerge Mag conta que a banda lançou a música e clipe “Te Colocar no Teu Lugar”, com participação da cantora Jup do Bairro. Composta por Laura, a canção trata de territórios, ocupação de lugares e afetos por meio da sensualidade. Já o clipe destaca a importância da Mamba Negra, festa de música eletrônica, voltada para pessoas LGBTQIA+, negras e mulheres, espaço de surgimento da própria Teto Preto. “O grande trunfo do clipe é borrar os limites entre o ficcional e o documental”, diz o diretor e fotógrafo Hick Duarte.
🎧 Podcast
Campeã do LEM Fight, maior evento de lutas do oeste baiano, Jeisla Chaves tem o objetivo de chegar ao Ultimate Fighting Championship (UFC), o maior e mais popular campeonato de Artes Marciais Mistas (MMA) do mundo. Com 21 vitórias, um empate e nenhuma derrota no currículo, a lutadora ganhou a alcunha de “A Braba” e é uma fonte de inspiração para outras mulheres nas artes marciais. A série “Histórias Que Te Contam da Janela”, do “Papeando”, produção do Site Coreto, narra a trajetória da atleta, que vive em Poções (BA), e descobriu sua paixão pelo muay thai a partir de um evento de MMA do qual participou como “ring girl” – função de entrar nos ringues para anunciar o número da próxima rodada.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
As vítimas de violência doméstica no Rio Grande do Sul são as que mais solicitam medida protetiva: representam 41% delas, enquanto a média nacional é de 27%. Os dados são da “Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher”, realizada em 2023, como parte do “Mapa Nacional da Violência de Gênero”, parceria da Gênero e Número com o Instituto Avon e o Observatório da Mulher Contra a Violência do Senado Federal. No Rio Grande do Sul, 92% das entrevistadas também afirmam conhecer a Delegacia da Mulher. “O primeiro passo é a informação sobre o que é a violência”, diz a juíza Madgéli Frantz Machado. Quanto à Lei Maria da Penha, 24% das brasileiras se consideram bem informadas sobre a legislação – o maior número foi no Distrito Federal, com 33%, seguido do Paraná e do Rio Grande do Sul, ambos com 29%.