O aumento da temperatura em Belém e a lei anti-Oruam nas capitais
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🔸 Nos últimos cinco anos, os rios do Amazonas ficaram mais secos entre julho e outubro. É o período em que ocorreram 94% dos focos de calor no estado, revela a InfoAmazonia a partir da análise de dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e do Serviço Geológico do Brasil (SGB). Tanto a seca quanto os incêndios têm relação com o mesmo problema – a redução de chuvas causada pelas mudanças climáticas. A fumaça das queimadas prejudica a formação de nuvens e reduz a eficiência da chuva. Já o carbono negro liberado pelo fogo contribui para o aquecimento global. No período analisado, o ano de 2024 foi o pior com recorde de focos de calor e rios em níveis históricos de baixa. A biodiversidade sofre: “Parte da vegetação queimada se decompõe, liberando sulfato e outros compostos químicos. Esses elementos se misturam à água, levando à intoxicação e asfixia de muitos peixes que permanecem na região”, explica o biólogo Guillermo Estupinan, especialista em recursos pesqueiros na Wildlife Conservation Society Brasil.
🔸 Em Belém, a temperatura máxima aumentou 1,9°C nos últimos 50 anos. É o que mostra um estudo conduzido pelo pesquisador Júlio Cézar Patrício, morador da capital paraense e doutor em desenvolvimento socioambiental pela Universidade Federal do Pará (UFPA). O Amazônia Vox detalha o trabalho e mostra que o aumento da temperatura está ligado à urbanização, à baixa arborização e às mudanças climáticas. Embora tenha o título de “cidade das mangueiras”, Belém é a penúltima capital brasileira em nível de arborização. O crescimento populacional de quase 40% entre 1970 e 2020, sem planejamento urbano adequado, intensificou o problema. “Esse aumento da população muitas vezes aumenta a pressão na franja, na periferia, que são as áreas com piores condições de saneamento e arborização. O Plano Diretor de Belém é de 2008, e não foi atualizado. Ou seja, vai completar 20 anos que não se pensa na cidade de forma planejada”, afirma Patrício.
🔸 O diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) pediu o afastamento do cargo na semana passada. Clézio De Nardin ocupou o posto por quatro anos, e sua saída era esperada desde outubro de 2024, quando acabou oficialmente seu mandato. O Eco informa que o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação anunciou a formação de um Comitê de Busca para selecionar o novo diretor. A saída de Nardin marca o fim da gestão de indicados do governo Bolsonaro, período em que o Inpe sofreu cortes de verba e questionamentos sobre os dados de desmatamento que divulgava.
🔸 A COP16 da Biodiversidade será retomada hoje, em Roma. A Conferência das Nações Unidas foi suspensa em novembro, na Colômbia, depois que os quase 200 países do encontro fracassaram na tentativa de chegar a um consenso. O Reset explica que, se em 2024 tiveram duas semanas para negociar, agora os representantes dos países terão apenas três dias. No centro do embate, está o financiamento: os países ricos não querem compromissos financeiros adicionais; já as nações em desenvolvimento cobram mais recursos para cumprir as metas de conservação. “Se chegarmos em Roma exatamente no mesmo estágio em que estávamos em Cali, corre o risco grande de termos um grande fracasso novamente”, diz a negociadora-chefe da delegação brasileira na COP16, Maria Angélica Ikeda.
📮 Outras histórias
A primeira Reserva Particular do Patrimônio Natural do Rio Grande do Norte foi criada em 2024 pelo ambientalista inglês David Maurice Hassett. Trata-se do Santuário Ecológico de Pipa, protegido por força da legislação. “David sempre foi apaixonado e comprometido com o meio ambiente. Era algo raro de se ver. Ele tinha exemplos de proteção ambiental na Europa, então veio com essa bagagem, de olhar sensível em reconhecer o valor da biodiversidade, a riqueza e a beleza que o Brasil tinha”, afirma Marjorie Madruga, procuradora do estado. A Saiba Mais lembra a batalha do ativista, que recebeu várias propostas para vender santuário, mas recusou todas. “Parece que foi a última missão dele porque David passava por dificuldades financeiras, mas tirava dele para investir em projetos ambientais. Para ele, o coletivo sempre foi mais importante que o individual”, completa a amiga do ambientalista. Hassett morreu neste domingo, aos 76 anos.
📌 Investigação
Com fuzis do tipo Arad, fabricados em Israel, a Polícia Militar da Bahia matou 12 homens negros. As mortes ocorreram em um intervalo de seis meses entre 2023 e 2024 nas cidades de Cruz das Almas e Itamaraju. A Alma Preta revela que os casos têm narrativas semelhantes: de que os supostos criminosos atiraram nos agentes de segurança. A resposta dos policiais teria sido atirar de volta, embora apenas os civis tenham sido feridos. Em uma das chacinas analisadas, o exame de perícia mostrou que nenhuma das vítimas tinha partículas de chumbo na mão, ou seja, não havia sinais de que usaram alguma arma de fogo. Já os fuzis empunhados pela PM são feitos para uso de “infantaria” e “unidades especiais” pela empresa IWI, que fornece armamentos para o exército de Israel.
🍂 Meio ambiente
Pelo quarto ano consecutivo, os agricultores do Rio Grande do Sul terão quebra de safra. Embora não seja possível estimar o tamanho dos danos, os analistas agrícolas já preveem que a colheita no estado será abaixo do potencial devido ao calor excessivo e o tempo seco deste verão. Segundo o Agribiz, o Rio Grande do Sul apresenta historicamente uma das melhores produtividades estaduais, mas os fatores climáticos já atingem o estado há quatro safras. Em 2021/22, ano de La Niña mais intenso, a colheita caiu pela metade em comparação com a anterior devido ao calor e à seca características do fenômeno climático. Já em 2023/24, com o El Niño, a safra caminhava para atingir todo o seu potencial, mas os temporais perto da colheita reduziram a produtividade.
📙 Cultura
Ao menos 12 capitais têm projetos em tramitação com o teor da “Lei anti-Oruam”, com o objetivo de proibir a contratação de shows, artistas e eventos abertos ao público que envolvam “apologia ao crime organizado ou ao uso de drogas e dá outras providências”. A proposta, na prática, criminaliza gêneros musicais periféricos, como o funk. Levantamento da Agência Lupa identificou 80 propostas com viés ideológico protocoladas entre 1º de janeiro e 15 de fevereiro. Embora a contratação de shows tenha sido o tema mais frequente, há oito propostas relacionadas ao controle de músicas nas escolas, que citam nominalmente o funk como estilo a ser proibido. É o caso do PL nº 15/2025, protocolado pelo vereador Vile (PL), em Belo Horizonte, que institui o programa “Integridade Cultural Escolar”.
🎧 Podcast
Em outubro do ano passado, três caminhões chegaram à aldeia Ulupuwene, do povo Wauja, no Território Indígena do Xingu, no Mato Grosso, com uma pedra enorme. Não era uma pedra qualquer, mas a réplica feita com impressora 3D de uma gruta sagrada para as etnias xinguanas que foi destruída. No centro dela está o Kamukuwaká, personagem central das histórias ancestrais desses povos. O “Rádio Novelo Apresenta”, produção da Rádio Novelo, resgata a história da gruta e de Kamukuwaká. Apesar da importância da réplica, ela lembra a todo momento o que não está ali – o original. “A réplica é uma forma de a gente se fortalecer, convidar mais uns parentes e promover mais a luta para dizer que a gente está vivo. Mas aquele pedaço que tem lá… Se perdeu, perdeu”, diz Tukupé Waurá, liderança da aldeia Piyulewene.
✊🏽 Direitos humanos
As mudanças na Meta são mais perigosas para pessoas LGBTQIA+. Se anteriormente as ameaças e os discursos de ódio disseminados nas redes sociais já impactavam a segurança dessa população na internet e fora dela, agora a vulnerabilidade é maior, explica a Agência Diadorim. Com sua nova diretriz, a empresa de tecnologia permite publicações que descrevam pessoas LGBTQIA+ como doentes mentais ou anormais e defendam sua exclusão de profissões, espaços públicos e da sociedade. “Os crimes contra a comunidade LGBTQIA+ muitas vezes recebem aprovação coletiva online, mostrando como esses espaços podem alimentar agressões fora da internet. A banalização do ódio corrói o debate público e mina os esforços para a garantia de direitos”, afirma Renato Contente, pesquisador de mídias digitais e autor de estudos sobre LGBTfobia na internet.