A atuação de mulheres no STF e a poluição sonora nos oceanos
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🔸 O número de evangélicos contra a prisão de mulheres por aborto cresceu nos últimos cinco anos: passou de 50% em 2018 para 56% neste ano. O percentual também aumentou entre os brasileiros de forma geral – de 52% em 2018 para 59% em 2023. Parte da série “A Cara da Democracia”, realizada pelo Instituto da Democracia, dados inéditos obtidos pela revista piauí mostram ainda que a proporção de pessoas contrárias à prisão por aborto também cresceu entre os católicos e revela que os que mais se opõem à medida são os jovens com idade entre 18 e 24 anos.
🔸 Como as três ministras do Supremo Tribunal Federal (STF) colocaram (ou não) a desigualdade de gênero em pauta na mais alta Corte do país? Foram elas: Ellen Gracie, Cármen Lúcia e Rosa Weber. Esta última, que deixou o STF na semana passada, lembrou que as mulheres estão inseridas numa “sociedade machista e patriarcal” ou ainda que “a criminalização [do aborto] perpetua o quadro de discriminação com base no gênero”. Não se viu o mesmo com Ellen Gracie, que assumiu um posto na Corte em 2000, ano em que o uso de calças por mulheres no plenário foi liberado. Ela, porém, manteve o protocolo antigo e seguiu vestindo saias e vestidos: “Ainda me apego a códigos ʽdemodésʼ”, disse à época. O Nexo detalha a atuação de cada uma das magistradas e lembra a importância das mulheres na Corte.
🔸 Nesse sentido, Rosa Weber deixa um legado. Não só o recente voto pela descriminalização do aborto, mas também o fato de ter pautado no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a equidade de gênero na magistratura. Ainda em 2019, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Weber criou uma Comissão Gestora de Política de Gênero. O Jota lista ações da ministra em defesa das mulheres. Pouco antes de se aposentar, aliás, ela lembrou que antes de 12 anos, nem o STF nem o CNJ terão uma mulher como presidente.
🔸 “Longe de ser uma querela, a campanha por uma ministra negra progressista para o STF – ênfase em progressista, porque há conservadores de todas as etnias e identidades de gênero – está afinada com os valores defendidos pela frente super ampla que elegeu Lula, que assumiu reiterando um compromisso de governar para todo o Brasil. Mulheres pretas e pardas não podem mais ser vistas apenas como votos. Desde a campanha, Lula tem feito escolhas pragmáticas. É hora de fazer uma por princípios.” Em artigo na revista AzMina, Fhoutine Marie, jornalista e doutora em Ciência Política pela PUC-SP, lembra que ter uma mulher negra progressista no Supremo “coloca uma outra perspectiva para o enfrentamento de problemas que, via de regra, atingem a carne mais barata do mercado”.
🔸 Ainda o STF: o ministro André Mendonça levou para o plenário presencial da Corte o julgamento de dois réus do 8 de janeiro. Antes, o tribunal já havia formado maioria para condenar cinco réus a penas que variam de 12 a 17 anos de prisão, como explica a CartaCapital. Com a manobra de Mendonça, os dois julgamentos devem ser retomados do zero em data a ser marcada pelo presidente do STF, Luís Roberto Barroso.
📮 Outras histórias
“Comunicamos o falecimento do senhor Francisco Leite Albuquerque, conhecido como Chico do Armarinho. Sua esposa, Rosa do Saudoso Lalanca, seus filhos, Rita do Laboratório, Francisco, conhecido como Nego, Rose da Loja Paixão…” O anúncio fúnebre feito por um carro de som em Maragogipe (BA) segue listando familiares do falecido, sempre com referências que vão além de seus sobrenomes. Foi registrado em áudio pelo Meus Sertões. Como escreve a pesquisadora Helenita Monte de Hollanda sobre a nota de falecimento, comum em cidades do interior do Brasil, é possível perceber que “o importante não é o nome ‘que na pia lhe foi dado’ nem do que ‘dos pais foi herdado’, mas as referências sociais que identificam não apenas o falecido, mas os familiares que convidam para o seu sepultamento”.
📌 Investigação
Com a mudança na lei de isenção de tarifa de passagem em 2021, estudantes de Porto Alegre (RS) sofrem para se manter no ensino médio. O desafio é maior para os que vivem nas periferias – quando não conseguem vagas em unidades próximas a suas casas, precisam se deslocar para as áreas centrais da cidade. O Matinal mostra que, neste ano, segundo dados da Empresa Pública de Transporte e Circulação, foram aprovadas apenas 6.200 isenções (entre todas as faixas de desconto) de um total de 42.981 estudantes. Atualmente, alunos com renda familiar a partir de R$ 2.220, ou seja, menos de dois salários mínimos, não recebem nenhum tipo de benefício. O resultado é o aumento da evasão escolar.
🍂 Meio ambiente
Em vídeo: a poluição sonora nos oceanos afeta o ecossistema marinho. Sons de embarcações e plataformas offshore para extração de petróleo, por exemplo, são atividades que alteram a dinâmica debaixo d’água e impactam a qualidade de vida dos seres vivos oceânicos. No documentário “Ocean Noise Pollution”, o Correio Sabiá fez mergulhos de cilindro em Arraial do Cabo, no Rio de Janeiro, e ouviu diversos pesquisadores para entender o tamanho desse problema e buscar soluções.
Soldados do Exército, policiais federais e da Força Nacional e agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), do Ibama e da Funai iniciaram ontem operação para retirar invasores da Terra Indígena Apyterewa, considerada o território indígena na Amazônia mais desmatado nos últimos quatro anos. A Repórter Brasil lembra que 98% da floresta destruída na área deu lugar ao pasto para a criação de bovinos, e o número de não indígenas no local já era maior que a população originária. O governo reconheceu 292 pessoas como ocupantes de boa-fé, com direito a compensações por benfeitorias, e outras 883 como de má-fé, sem qualquer direito às terras onde estavam instaladas.
📙 Cultura
Com um estilete na mão, a artista Gê Viana corta imagens de produções dos colonizadores e de gravuras de livros do período colonial brasileiro. É assim que ela faz sua obra em colagens e fotomontagens, que define como “remixagens”. Nascida em Santa Luzia (AM) e pertencente ao povo Anapuru Muypurá, Gê busca libertar os corpos historicamente aprisionados por imagens brancas, como explica em entrevista ao Nonada: “Quero trazer outras possibilidades para o corpo negro e indígena através de uma felicidade e de uma liberdade”. Atualmente, seu trabalho integra importantes exposições nacionais: “Dos Brasis”, no Sesc Belenzinho, em São Paulo; “Bienal das Amazônias”, em Belém, e “Funk: Um Grito de Ousadia e Liberdade”, no Museu de Arte do Rio.
“O museu, desde sua origem, é uma estrutura colonial e hierárquica. Ela vê o restante do mundo além do Ocidente como incivilizado, o que permite a apropriação de objetos”, afirma a cientista política Françoise Vergès, especialista em estudos pós-coloniais. Ao Le Monde Diplomatique Brasil a autora detalha as principais ideias de seu novo livro “Decolonizar o Museu – Programa de Desordem Absoluta”, em que analisa as relações de raça, classe e gênero sobre as quais a ideia de museu ocidental se constrói e propõe um um projeto de decolonização desse espaço com base na teoria de Frantz Fanon.
🎧 Podcast
Benta Martins Carvalho, a dona Benta, é parteira há mais de 50 anos e já realizou mais de cem partos. Ela vive na região do Médio Solimões, no Amazonas, e fala com orgulho sobre o ofício que percorreu gerações na sua família. As parteiras são uma parte essencial dos direitos reprodutivos entre os povos tradicionais. O “Cirandeiras”, produção da Rádio Guarda-Chuva, conversa com dona Benta e joga luz sobre a realidade ribeirinha e amazônica do país, onde mulheres negras e indígenas também se deparam com momentos de interrupção da gravidez.
✊🏽 Direitos humanos
Em meio ao medo e ao silêncio, redes feministas oferecem apoio, informação e cuidado a mulheres que vão abortar. As “acompanhantes de aborto”, “socorristas” ou “aborteiras” atuam sob a sombra das restrições e das regras morais discriminatórias para transformar as trajetórias de quem passa por uma gravidez indesejada. A Gênero e Número, em parceria com o Portal Catarinas e a revista AzMina, ouviu ativistas de quatro países latinoamericanos que cumprem o papel de apoiar essas mulheres. O Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde no Brasil, por exemplo, tem o objetivo de reduzir danos com o compartilhamento de informações seguras baseadas em evidências científicas.