O assédio sexual no meio acadêmico e a inteligência artificial no RH
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🔸 Deputada brasileira engrossa o coro de denúncias contra o professor Boaventura de Sousa Santos, da Universidade de Coimbra, em Portugal. Bella Gonçalves, deputada estadual pelo PSOL em Minas Gerais, foi orientanda de Boaventura durante seu doutorado no Centro de Estudos Sociais entre 2013 e 2014. “Um dia, ele pediu para marcar uma reunião no apartamento dele. Colocou a mão na minha perna. Falou que as pessoas próximas dele tinham muita vantagem e sugeriu que a gente aprofundasse a relação”, conta em depoimento à Agência Pública. Essa é a primeira vez que ela fala sobre o caso, após a publicação de um artigo sobre má conduta sexual no meio acadêmico, escrito por outras três ex-alunas do sociólogo. No texto, publicado em março, elas não citam nomes, mas relatam assédios sexuais de professores da universidade e narram abusos de poder contra “jovens pesquisadoras que dependem de aprovação acadêmica para construir suas carreiras”, “extrativismo intelectual e sexual” e “impunidade”. Há referências de assédios sexuais praticados por um “professor-estrela” e seu auxiliar.
🔸 A propósito: situações de assédio moral e sexual no ambiente acadêmico são realidade em diversos países. O Sul21 mostra que 70% das instituições federais de ensino superior brasileiras não possuem qualquer medida de combate ao crime, segundo estudo feito em 2020 pela pesquisadora Bianca Spode Beltrame. Na coletânea de artigos “Panorama da Violência Contra Mulheres nas Universidades Brasileiras e Latino-Americanas”, publicado em 2022, autores do Brasil, Chile, Colômbia, Equador e Uruguai apontam que as mulheres, pessoas negras e LGBTQIA+ são os principais alvos de assédio.
🔸 O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se encontrou na sexta com Xi Jinping, presidente da China. Em Pequim, o petista assinou uma série de acordos comerciais entre os dois países. A agenda passou por diversos temas, desde uso de energias renováveis até tecnologia da informação. Maior parceiro comercial do Brasil, o agronegócio também foi contemplado na reunião no Grande Palácio do Povo. O Congresso em Foco lista os 15 acordos assinados. Lula seguiu em viagem aos Emirados Árabes Unidos. Durante coletiva em Abu Dhabi ontem, defendeu a criação de um “G20 pela paz”, um grupo político-econômico para debater questões como guerras, violência e taxas de juros. Por lá, também assinou tratados de cooperação em áreas como comércio, esporte e inteligência artificial.
🔸 Mesmo com a subida de tom do governo, perfis de apologia a ataques em escolas permanecem no Twitter. As novas regras implementadas pelo Ministério da Justiça na quinta-feira surtiram algum efeito: a plataforma começou a derrubar algumas dessas contas e pelo menos cem conteúdos denunciados foram removidos. O Núcleo revela, porém, que os usuários estão encontrando formas de evitar detecção ou de voltar à plataforma logo depois de serem expulsos. Em poucas horas, eles recriam seus perfis com nomes idênticos aos suspensos e continuam a utilizar fotografias de autores de ataques em escolas. As pesquisadoras Tatiana Azevedo e Letícia Oliveira, que conduzem monitoramentos sobre o extremismo online, contam que, das 225 contas que monitoram, 131 continuam no ar e abertas e 39 foram privadas pelos usuários.
🔸 Os conteúdos acessados por crianças e adolescentes precisam de atenção dos pais. As ameaças de atentados e a propagação de discursos de ódio na internet não são mais coisas da “deep web” e podem ser encontrados nas redes sociais, nos chats de jogos e nos fóruns. Relatório sobre o extremismo de direita entre jovens, publicado pela equipe de transição do governo atual, lista alguns dos métodos de cooptação de adolescentes a estas ideologias, como uso de humor em memes nazistas ou de discursos de ódio “irônicos”. Segundo o Lunetas, os pais e responsáveis precisam abrir um canal de diálogo com crianças e jovens baseado na confiança, no qual eles não tenham medo de falar, de serem castigados ou julgados.
📮 Outras histórias
Dois ataques em um mesmo dia contra pequenos agricultures de Correntina (BA). Três pessoas foram baleadas na última terça-feira na comunidade tradicional de fecho de pasto do Cupim. Algumas horas antes, um dos fecheiros de Porcos, Guarás e Pombas foi perseguido por criminosos, mas conseguiu escapar. A polícia está investigando se os pistoleiros seriam “seguranças” das fazendas vizinhas. O Meus Sertões conta que, como de costume no período de estiagem, os criadores locais soltam gado em área com vegetação nativa. “Se quiser criar gado, compra terra”, teria dito o criminoso a um dos vaqueiros. Não só eles, mas os animais também têm sido vítimas desses grupos.
📌 Investigação
As propostas de regulação das plataformas digitais deixam de fora as com menos de 10 milhões de usuários no Brasil. Regras diferentes de acordo com o alcance da rede podem fazer com que conteúdos desinformativos ou discursos de ódio migrem para plataformas menores, que serviriam de refúgio para grupos extremistas. O Aos Fatos apurou o limbo em que ficam plataformas como Rumble, Gettr, Cos.TV, BitChute, Odysee e Truth Social, que somam cerca de 8,5 milhões de downloads em todo o mundo apenas no Google Play. Para Yasmin Curzi, professora e pesquisadora do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV, o número de usuários “não é uma boa métrica” para definir a regulação. Por outro lado, a legislação atual já permite enquadrar como crime o conteúdo radical que é claramente ilegal e que circula nas redes sociais de nicho.
🍂 Meio ambiente
O governo divulgou o novo Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm). O documento apresenta quatro eixos de atuação entre 2023 e 2027: atividades produtivas sustentáveis, monitoramento e controle ambiental, ordenamento territorial e fundiário e instrumentos normativos e econômicos. A InfoAmazonia destrincha esses pontos e destaca o envolvimento de 13 ministérios na execução do projeto. A importância das florestas públicas não destinadas, pontos críticos do desmatamento, foi reforçada pelo secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, João Paulo Capobianco: “Ao destinar essas áreas, a gente impede que isso possa ocorrer e certamente nós vamos diminuir muito a sanha da grilagem”.
Os conflitos por água e terra marcam os polos de fruticultura para exportação. Moradora da comunidade de Melancia, em Casa Nova (BA), Nazareth da Rocha Silva, de 59 anos, afirma que a escassez hídrica na região é crônica. Os moradores cultivam mandioca, feijão, milho, batata doce, coentro, cebolinha e plantas medicinais, mas apenas para consumo – tudo é pensado para a falta d’água. Realidade que não se aplica às enormes fazendas da GVS Fruit Company, com 100 hectares dedicados ao cultivo de manga e uvas, localizadas no caminho de Petrolina (PE) à comunidade. O Joio e O Trigo detalha que a irrigação das frutas, voltadas para o mercado externo, sugou 1,5 trilhão de litros de água em 2019, último ano com dados oficiais disponíveis.
📙 Cultura
De repente as pegadas de uma anta se transformam em pessoas que confundem folha com peixe e onça com porco. Esse é o enredo de “O Garrincha da floresta”, um dos 11 relatos presentes em “Ficções Amazônicas”, de Aparecida Vilaça e Francisco Vilaça Gaspar. A Quatro Cinco Um resenha a obra, que adentra o patrimônio poético e narrativo dos povos originários – ignorados por séculos no Brasil. Embora o elemento índigena tenha sido utilizado diversas vezes na literatura brasileira em busca de se distinguir das produções europeias, sua função sempre foi a de personagem literário preso ao passado colonial. Para a revista, o traço mais característico da coletânea está na desconstrução destes estereótipos e na imersão nos conhecimentos mítico e cosmológico ameríndios.
“As pessoas não estão acostumadas a assistir indígenas na TV.” Ellie Makuxi é uma das três artistas indígenas que protagonizam o segundo episódio da série “Histórias Impossíveis”, da TV Globo. Ao Nós, Mulheres da Periferia a atriz relata que sua personagem converge para suas próprias experiências: “Ela saiu de sua comunidade por não aguentar aquela realidade de violências, mas sempre carregou a questão de que poderia colaborar com aquilo, lutar pelo seu povo, pelas mulheres”. Ellie também revela ter esperança de que a obra desperte empatia no público: “Eu espero que traga curiosidade nas pessoas, para que elas procurem saber o que acontece nos territórios indígenas, porque são violentados dentro do seu próprio lar.”
🎧 Podcast
A inteligência artificial (IA) como recrutadora de emprego. O resultado é a eliminação de candidatos qualificados por critérios questionáveis. O “Trabalheira”, produção da Repórter Brasil, mergulha no uso dos algoritmos na área de recursos humanos. A combinação de filtros por meio de sistemas ATS (Sistema de Rastreamento de Candidatos, em português) ranqueia o perfil dos concorrentes à vaga. Apesar da tecnologia economizar o tempo dos recrutadores diante de inúmeros currículos, ela também pode reforçar preconceitos. O episódio conversou com especialistas e resgatou o caso da Amazon, no qual a IA criou padrões que favoreciam homens em detrimento das postulantes mulheres.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
O Ceará é o estado que mais mata pessoas trans. Nos três primeiros meses de 2023, foram sete assassinatos, segundo relatório divulgado pela Rede Trans Brasil. Em seguida, estão São Paulo e Minas Gerais, ambos com quatro mortes. Em todo o país, foram contabilizados 36 homicídios de população trans e travesti no período – 68% das vítimas eram negras. A Agência Diadorim lembra que o Ceará também liderou os dados de mortes em 2022. A Trans Brasil ainda aponta que foram registrados 96 casos de violações de direitos humanos contra a comunidade no ano passado – a mais comum delas foi a de proibição do uso de banheiros públicos, seguida de agressão física.