O apagão em São Paulo e o impacto do PL do streaming no audiovisual
Uma curadoria do melhor do jornalismo digital, produzido pelas associadas à Ajor. Novos ângulos para assuntos do dia
Oi, gente, bom dia!
Esta é a última edição da Brasis em 2025. Entramos em recesso agora para preparar os especiais que vão abrir 2026, reunindo as histórias que marcaram nosso percurso ao longo do ano – relatos que mostraram o cotidiano das periferias, tensões políticas que moldaram o país, investigações fundamentais e vozes que nos ajudaram a ler o Brasil com mais profundidade.
Voltamos em breve, no início do ano. Até lá, desejamos boas festas e um recomeço cheio de respiro. Obrigada por nos acompanhar – e até já.
🔸 A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) elevou o tom contra a Enel São Paulo após um novo apagão provocado pelo ciclone que atingiu a região nos últimos dias e deixou mais de 2 milhões de unidades sem luz, o equivalente a 31,81% da área atendida pela empresa. Em ofício ao presidente da distribuidora, o diretor da Aneel, Fernando Mosna, cobrou explicações em até cinco dias e avisou que “a constante recorrência e a gravidade das falhas na prestação do serviço constituem descumprimento de cláusulas contratuais”. Segundo a Eixos, ontem, cerca de 1,3 milhão de clientes ainda estavam sem energia na Grande São Paulo, com mais de 200 semáforos apagados, 408 voos cancelados e falta de água em várias regiões por paralisação das bombas da Sabesp.
🔸 O saldo da semana na Câmara dos Deputados terminou negativo para Hugo Motta (Republicanos-PB), presidente da Casa. Em votações consecutivas, o plenário rejeitou a cassação de Glauber Braga (PSOL-RJ) e barrou também a perda de mandato de Carla Zambelli (PL-SP), contrariando o roteiro traçado por Motta. Ele pretendia cassar um nome da esquerda e outro da direita para reforçar sua autoridade. A CartaCapital narra a reviravolta nos planos do deputado. Orientado por Lula, o PT articulou com o PSOL uma reação em duas frentes: estimulou a abstenções para evitar os 257 votos necessários e propôs uma punição alternativa, com a suspensão de seis meses para Glauber Braga. Em seguida, o PL organizou sua própria operação para preservar o mandato de Zambelli, mesmo com condenações no Supremo Tribunal Federal (STF) e afastamento do cargo.
🔸 Entre os 20 deputados com maior engajamento no Instagram em 2025, dez não tiveram nenhum projeto de lei aprovado desde 2023 e outros três só aprovaram matérias simbólicas. A Agência Pública cruzou os dados de engajamento na plataforma com a relação de projetos de lei e mostra que, dos 20 com melhor performance no Instagram, 11 são da extrema direita (PL, Novo, PSD) e apenas três se vinculam à esquerda. Quatro nomes – Carla Zambelli, Maurício Marcon, Guilherme Derrite e Fábio Teruel – não têm nem autoria nem coautoria em projetos aprovados, e outros seis apenas “pegam carona” como coautores em propostas de colegas.
🔸 A produtora que prepara “Dark Horse”, cinebiografia de Jair Bolsonaro (PL), recebeu R$ 108 milhões da Prefeitura de São Paulo para instalar Wi-Fi em áreas vulneráveis da cidade. O Intercept Brasil revela que Karina Ferreira da Gama não tinha experiência nem com Wi-Fi nem com grandes produções cinematográficas, mas venceu a licitação de julho de 2024 da prefeitura de Ricardo Nunes (MDB). Além de produtora executiva do filme sobre Bolsonaro, ela comanda o Instituto Conhecer Brasil (ICB), único participante de um edital com ao menos 20 irregularidades apontadas pelo Tribunal de Contas. A ONG, que cobrou valores muito superiores aos praticados pela própria gestão municipal, instalou 3,2 mil dos 5 mil pontos previstos, subcontratou empresas com contratos milionários e acumula relatos de serviço falho. Quanto ao filme sobre Bolsonaro, também há denúncias de irregularidades trabalhistas e falta de transparência.
🔸 O uso de inteligência artificial para criar deep nudes de meninas em escolas brasileiras escancara falhas na proteção de crianças e adolescentes e o silenciamento de colégios diante dessa violência. A Lupa mostra que, segundo levantamento da SaferNet, foram ao menos 72 vítimas em dez estados entre 2023 e 2025, todas em escolas privadas, num fenômeno marcado por recorte de classe e gênero, em que meninas são expostas e meninos raramente responsabilizados. O Ministério da Educação, as associações de escolas e o próprio governo não têm dados sistematizados nem protocolos específicos para casos de deep nudes. A legislação atual, seja o Código Penal ou o Estatuto da Criança e do Adolescente, continua mais punitiva do que preventiva.
📮 Outras histórias
Na Rocinha, um espaço com acesso difícil até mesmo para moradores resiste: o Centro Comunitário da Rua 2 (CCR2). Fundado há mais de 40 anos, oferece acolhimento, educação, cultura, lazer e qualificação profissional para cerca de 250 crianças, além de apoiar adultos e idosos e distribuir cestas básicas mensais. O Fala Roça revê a história do centro comunitário e de seu coordenador, o morador Davi Pereira. Hoje com 56 anos, ele cresceu frequentando e sendo ajudado por projetos sociais, inclusive do espaço que coordena. “Eu não vivo do social, eu vivo para o social. Eu não vivo de lá, eu vivo para lá”, afirma Davi. A reportagem mostra que o CCR2 criou uma Colônia de Férias que leva crianças a praias, museus e trilhas fora da favela, e destaca como isso alivia o cotidiano de famílias como a de Cléo, mãe solo. “Se você analisar, uma criança ter a oportunidade de ir ao Costa Brava – que custa caro para entrar –, de passear todo dia, de ir ao museu, no Parque Lage, para a Urca… fora que você sai em paz para trabalhar com a certeza de que a criança está bem”, diz.
📌 Investigação
Os casos de contaminação por agrotóxicos aumentaram 545% nos últimos cinco anos em Santarém, Belterra e Mojuí, municípios do oeste do Pará. Levantamento da Repórter Brasil, em parceria com o Tapajós de Fato, analisou dados do Ministério da Saúde. Foram 200 casos registrados entre 2021 e 2025, ante 31 no quinquênio anterior. Juntos, os três municípios respondem por 10% das intoxicações no Pará na década. A análise, que considera apenas “casos não intencionais”, revela que o avanço das lavouras de soja e milho é o principal vetor do uso de pesticidas e impacta diretamente as populações rurais, povos indígenas e comunidades tradicionais. “As famílias que utilizavam os igarapés para seu próprio lazer ou para consumo, hoje em dia não usam mais por estarem impróprios”, afirma Sileuza Barreto, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais da Agricultura Familiar de Mojuí dos Campos. Esta reportagem foi produzida por meio da Bolsa de Reportagem do edital Sala Colaborativa, promovido pela Ajor (Associação de Jornalismo Digital), em parceria com a InfoAmazonia e com apoio do Instituto Serrapilheira.
🍂 Meio ambiente
Em Tomé-Açu (PA), no coração da Amazônia, uma comunidade de descendentes de japoneses usa o modelo agroflorestal há décadas, combinando tradição, ciência e adaptação. A diversidade dessa agricultura reúne fileiras de cacau sombreado por açaizeiros, palmeiras altas, pimenteiras antigas e cupuaçuzeiros que brotam de troncos grossos, em uma área de de 7 mil hectares. Organizados em uma cooperativa que impacta diretamente 10 mil pessoas, os pequenos produtores garantem renda contínua. E o sistema implementado mantém comunidades inteiras no campo e preserva a floresta, como conta o Amazônia Vox. “Antes era monocultura, com desmatamento e queimadas. Com a doença da pimenta, tivemos de mudar completamente. Entrou o consórcio, depois chamado de agrofloresta, que protege o solo e cria um microclima favorável para insetos, pássaros e pequenos animais. É bom para a renda, para as famílias e para o meio ambiente”, afirma Alberto Oppata, presidente da Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu.
📙 Cultura
O atual cenário do audiovisual preocupa profissionais e especialistas do setor. A Netflix anunciou a intenção de adquirir a Warner Bros., o que incluiria os seus estúdios de cinema e TV e os serviços de streaming, como HBO Max. O anúncio acendeu o alerta para a configuração de um monopólio no audiovisual mundial. No Brasil, o PL 8.889/2017, conhecido como PL do Streaming, foi aprovado na Câmara e vai ao Senado. A proposta regulamenta as plataformas de vídeo sob demanda, mas, segundo os profissionais do campo, esvazia o Fundo Setorial do Audiovisual, principal mecanismo de fomento no país. A Escotilha esmiúça como o poder da Netflix, coroado com a fusão com a Warner e somado ao projeto de lei em tramitação no Congresso, pode precarizar o audiovisual brasileiro.
🎧 Podcast
Há dez anos, o festival Balaio da Oxum reúne povos de terreiro em Manaus (AM) para celebrar a orixá das águas doces e combater a intolerância religiosa. Com práticas sustentáveis, rituais tradicionais e apresentações culturais, o evento é um marco da resistência e religiosidade afroamazônica. O “Griot Podcast”, produção da Cenarium, conversa com a organizadora do festival, a sacerdotisa e ialorixá Agonjaí Flor Ty Navê. Ela conta o significado e história do evento. “O balaio é um grito de liberdade dentro dessa sociedade que não nos vê, que não nos olha como pessoas de axé”, afirma.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
“Eu sou a única mulher negra no Brasil presidente de uma associação de cannabis medicinal”, afirma Marilene da Silva Lima de Oliveira, líder comunitária e fundadora da Abrario, associação de cannabis medicinal sediada em Niterói que atende mais de 3.500 pessoas em 17 estados. Fundada em 2019, a organização conta com 23 funcionários CLT, incluindo mães atípicas. O Colabora mergulha na história de mulheres negras que transformaram suas vidas e geram impacto social ao garantir a democratização aos tratamentos com a planta. “As mulheres negras estão sempre à frente dos cuidados. Na periferia, a economia gira com mães solo, mulheres pretas. Se a gente não tem saúde, a gente não tem nada”, diz Rafaela França, coordenadora do Núcleo de Estimulação Estrela de Maria (NEEM), que promove o acesso da cannabis medicinal para mães de crianças atípicas.




