O alto preço das hospedagens na COP30 e os agrotóxicos no Xingu
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🔸 A brasileira Juliana Marins, de 26 anos, foi encontrada sem vida ontem, depois de quatro dias isolada na trilha do vulcão Rinjani, na Indonésia. Publicitária de Niterói, ela fazia o percurso com um guia local e outros turistas quando sofreu uma queda, ainda no sábado. Nas redes sociais, a família da publicitária informou que ela estava a 650 metros da trilha, uma distância maior do que previa a equipe de resgate, formada por 48 pessoas. O Notícia Preta informa que um dos planos era usar helicópteros, que estavam de sobreaviso em Sumbawa e Jacarta, mas, devido às condições climáticas, o acesso aéreo não foi possível. Segundo dados do próprio governo indonésio, o Parque Nacional do Monte Rinjani registrou um aumento expressivo de acidentes: foram oito mortes e 180 acidentes nos últimos cinco anos.
🔸 O preço das hospedagens para a COP30 em Belém abriu uma crise diplomática. Na conferência preparatória em Bonn, na Alemanha, diplomatas de países como Belize, Maldivas e Timor-Leste afirmaram que os preços de até mil dólares por diária podem inviabilizar suas participações na Conferência do Clima da ONU marcada para novembro na capital paraense. “Brincamos entre nós que por esse preço poderíamos comprar um imóvel no nosso país”, contou uma representante da Indonésia. Diplomatas de quatro países disseram ao Reset ainda não ter lugar para ficar durante a COP30. Alguns chegaram a sugerir oficialmente a transferência da conferência para outra cidade. O problema se estende a representantes da sociedade civil que temem não conseguir participar da COP30 por falta de recursos – uma ameaça à diversidade do encontro. Depois de três edições em países autoritários, a expectativa era de que a Conferência do Clima no Brasil oferecesse um espaço mais democrático, com ampla participação pública, o que pode não se concretizar.
🔸 Falando em COP30… a transição energética é tratada como tabu pelo governo brasileiro, embora seja crucial para garantir que a conferência no país seja histórica. Se os dados mostram que boa parte da produção do petróleo é exportada, o discurso oficial ainda associa o petróleo ao desenvolvimento econômico e à autossuficiência. O Colabora mostra que, em 2024, o país arrecadou R$ 108 bilhões com petróleo, mas apenas 0,16% foi destinado a políticas ambientais. Por outro lado, investir em energia limpa é economicamente vantajoso: segundo o Instituto Clima e Sociedade, o Brasil pode adicionar R$ 100 bilhões ao PIB e criar até 6,4 milhões de empregos com a transição até 2030. O físico Shigueo Watanabe Junior, do Instituto ClimaInfo, conta que “está muito difícil colocar qualquer referência a combustíveis fósseis na discussão”, já que há forte resistência dos Estados Unidos, de países árabes e da China. Mas não só: o tema é delicado internamente, com o avanço da exploração de petróleo na Foz do Amazonas.
🔸 No ano passado, 30 milhões de hectares queimaram no Brasil, valor 62% acima da média histórica, segundo o Relatório Anual do Fogo (RAF) do MapBiomas. O Eco destaca que, pela primeira vez, as florestas da Amazônia superaram as pastagens como cobertura vegetal mais afetada pelo fogo, somando 6,7 milhões de hectares. Cientistas alertam que isso indica uma mudança na dinâmica da floresta, que pode estar entrando em processo de savanização em áreas localizadas. O relatório também aponta recordes em outros biomas: a Mata Atlântica teve aumento de 261% na área queimada, com 1,2 milhão de hectares afetados; o Pantanal teve alta de 157%, com 2,2 milhões de hectares queimados; e o Cerrado, de 10%, com 10,6 milhões de hectares atingidos. Já o Pampa e a Caatinga foram os únicos biomas com queda na área queimada.
📮 Outras histórias
Entre 2019 e 2023, o número de casamentos heterossexuais caiu 9,33% no Nordeste. Seis estados da região registraram queda, com destaque para Pernambuco, Rio Grande do Norte e Bahia. Análise da Agência Tatu a partir de dados do IBGE mostra que, se os casamentos entre homens e mulheres caíram, as uniões homoafetivas cresceram 33%, impulsionadas sobretudo pelos casamentos entre mulheres. O Maranhão lidera esse movimento, com alta de 127% nas uniões entre mulheres. Ceará, Sergipe, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Bahia também acompanharam esse avanço. Já Alagoas ocupa a última posição no ranking, com apenas 3% de aumento nas uniões homoafetivas. Para Andréa Pacheco, professora na Universidade Federal de Alagoas, isso é resultado do conservadorismo no estado. “Muitas vezes a população LGBTQIA+ não se casa por medo da família, de perder o emprego, de perder os amigos ou da violência externa. A discriminação e o preconceito acabam por construir um grande pacto coletivo do silêncio em que um lado finge não vê e outro fica dentro do armário para não ser visto”, afirma.
📌 Investigação
Grifes internacionais, como Chanel, Balenciaga e Gucci, compram couro de empresas vinculadas a fazendas que criam animais em terras indígenas e em áreas desmatadas ilegalmente na Amazônia, revela estudo da ONG Earthsight, em parceria com a Repórter Brasil. É o caso da Frigol, um dos cinco maiores frigoríficos do país, apontado como comprador de gado criado em áreas embargadas por desmatamento e em fazendas instaladas ilegalmente dentro da Terra Indígena Apyterewa, em São Félix do Xingu (PA). A empresa se vale da prática da “lavagem de gado” – esquema que consiste no repasse de bois criados em locais irregulares para áreas consideradas “ficha limpa”. A Frigol é uma das fornecedoras da matéria-prima exportada para as grandes marcas de luxo.
🍂 Meio ambiente
O avanço do agronegócio no entorno do Território Indígena do Xingu contaminou com agrotóxicos as águas, os peixes, a caça – e até o leite materno das comunidades indígenas. É o que revelou estudo do pesquisador Francco Antonio Neri de Souza e Lima, da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/Fiocruz). O trabalho identificou 28 compostos tóxicos em amostras da Terra Indígena Wawi, onde vive o povo Khisêtjê. A revista piauí detalha os achados da pesquisa e os impactos dos agrotóxicos na população local. Os indígenas relatam problemas respiratórios, doenças de pele, alterações no sabor da caça e do peixe, além da redução de abelhas e das colheitas. Médicos e cientistas alertam para os riscos da “multi-intoxicação” e da exposição crônica a pequenas doses, ainda pouco estudadas pela ciência.
📙 Cultura
Com mais de 250 atividades gratuitas na Praça Charles Miller, em São Paulo, A Feira do Livro celebrou 40 anos da redemocratização do país, reunindo milhares de leitores na última semana. Produtora do festival literário, a Quatro Cinco Um ressalta que o evento se consolidou no calendário oficial da cidade: no dia 17, durante a feira, foi sancionada a Lei 18.274/2025 pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB), que determina que o festival literário será sempre realizado no feriado de Corpus Christi e dias próximos. A nova legislação, de autoria das vereadoras Renata Falzoni (PSB), Marina Bragante (Rede) e Keit Lima (PSOL), tem o objetivo de promover a cultura do livro e a leitura e o desenvolvimento socioeconômico do mercado editorial, além do direito à cidade. “Quando a cidade abraça um evento desses que é gratuito, que ocupa um espaço público descoberto e de fácil acesso, ela estimula as pessoas a caminhar, a pedalar, a trazer as crianças”, afirma Falzoni.
🎧 Podcast
Embora não seja um termo de origem indígena, a agroecologia é reconhecida por povos originários como um método eficaz para disseminar a sabedoria ancestral e diversa de suas comunidades. Exercê-la é preservar o meio ambiente e o bem viver, refletindo práticas que vão além da simples produção agrícola. “É um modo de vida, uma relação com a terra, com os outros seres. Por isso entendemos que faz sentido usarmos esse conceito”, explica Raquel Tupynambá, liderança do Baixo Tapajós (PA) e integrante da Articulação Nacional de Agroecologia. O “Narrando Utopias”, produção do Catarinas, esmiúça a conexão entre a saúde do solo, a biodiversidade e o bem-estar humano, mostrando como a demarcação de terras indígenas e o empoderamento das comunidades são um pilar para um futuro sustentável.
✊🏾 Direitos humanos
“Mesmo que a pessoa trans esteja inserida no ambiente de trabalho formal, ela se depara com discriminações institucionalizadas que reafirmam essas desigualdades. As desigualdades, discriminações e violências enfrentadas por pessoas trans no ambiente de trabalho impactam diretamente as possibilidades de estabilidade financeira, desempenho em certas ocupações e desenvolvimento de carreira”, afirma Zett Ribeiro, cientista social que pesquisa as experiências de pessoas trans no mercado de trabalho formal. Em artigo na Gênero e Número, o pesquisador explora a falta de dados quantitativos e qualitativos sobre essas vivências, necessários para a formulação de políticas públicas, programas de inclusão e educação antidiscriminatória e incentivos para empresas comprometidas com diversidade, para garantir não apenas o acesso da população trans a postos de trabalho, mas também sua permanência com dignidade.