A eleição de Ailton Krenak para a ABL e a temporada do fogo no Cerrado
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🔸 Aos 70 anos, Ailton Krenak tornou-se ontem o primeiro indígena a ocupar uma cadeira na Academia Brasileira de Letras (ABL). Ele foi nomeado imortal com 23 dos 39 votos e ocupa agora o posto deixado em agosto pelo historiador José Murilo de Carvalho. A revista Cenarium lembra que o líder indígena é autor de uma trilogia de livros curtos, adaptados de palestras e lançados nos últimos anos, “Ideias para Adiar o Fim do Mundo”, “A Vida Não é Útil” e “Futuro Ancestral”. Mas sua atuação é histórica e teve um momento emblemático na Assembleia Constituinte, em 1987, quando contribuiu para incorporar demandas dos povos originários na Constituição, promulgada no ano seguinte.
🔸 No Rio de Janeiro, três médicos foram executados num quiosque na praia, na Barra da Tijuca, zona oeste da cidade. Eles estavam na capital fluminense para um congresso de ortopedia. A principal linha de investigação, informa a CartaCapital, indica que um dos médicos teria sido confundido com o miliciano Taillon de Alcântara Pereira Barbosa. Ele obteve liberdade condicional em setembro passado, depois de ter sido preso, em 2020, numa operação comandada pelo Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado. O quiosque onde ocorreu o assassinato fica a mesma avenida onde Barbosa tem um imóvel. O Metrópoles conta que ontem à noite a Polícia Civil encontrou quatro corpos dentro de carros – dois deles seriam de suspeitos de executar os médicos.
🔸 Um dos médicos assassinados era irmão da deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP). Horas depois do crime, ela passou a ser alvo de discurso de ódio nas redes sociais. Entre as publicações, a Lupa identificou comentários que culpavam a parlamentar pela morte do irmão e criticavam a “hipocrisia” da deputada por “defender bandidos”. O tom é semelhante no YouTube e no Instagram. Nesta rede, uma das publicações com mais engajamento é de Mário Frias (PL-RJ). Ele associa as execuções a uma “política pública leniente” e afirma que o problema deve ser combatido “sem romantismo”. O post desencadeou uma série de comentários ofensivos à deputada.
🔸 Em visitas a lojas, 70% das pessoas negras dizem ter sido seguidas ou ter visto alguém seguido por funcionários ou seguranças. Outros 54% afirmam evitar estabelecimentos ou seções onde possam se sentir discriminados. A Alma Preta detalha os dados de uma pesquisa que revela como o racismo no momento das compras impacta diretamente nos hábitos e comportamentos de consumo das pessoas negras no Brasil. No estudo, 35% das pessoas negras contam ter passado a fazer mais compras online para evitar experiências de racismo em lojas físicas.
📮 Outras histórias
Mais de 71 mil transplantes de órgãos e tecidos foram realizados no Nordeste entre 2001 e 2021. A Agência Tatu coletou dados do Ministério da Saúde segundo os quais rim, fígado e coração estão entre os órgãos mais transplantados. Pernambuco é o estado da região com maior número de transplantes no período, seguido pelo Ceará e a Bahia. Mas a fila de espera por órgãos ainda é longa. Se não houvesse aumento ou queda na quantidade de pessoas na lista, a estimativa é de que seriam necessários nove anos para zerar a fila.
📌 Investigação
Mesmo alertado sobre o risco para a reputação do banco, o diretor de agronegócio Itaú, Pedro Barros, teria atuado para autorizar um crédito de R$ 25 milhões para a AgroSB. É o que revela gravações obtidas pel’O Joio e O Trigo e pela Repórter Brasil. A AgroSB é o braço agropecuário do Grupo Opportunity, fundado pelo banqueiro Daniel Dantas, e atualmente conta com 13 fazendas na Amazônia, onde há produção de soja, milho e cacau, além de pastagens para um rebanho de 110 mil cabeças de gado. Nos últimos 15 anos, a companhia recebeu R$ 344 milhões em multas ambientais, segundo o Ibama, que também mantém duas áreas embargadas.
🍂 Meio ambiente
No Cerrado, o fenômeno do El Niño adiou o começo da temporada de fogo, que geralmente ocorre no inverno. O cenário, no entanto, pode mudar nos próximos meses com o aumento da temperatura no verão, com temporais mais fortes e espaçados. A Agência Pública ouviu os pesquisadores do Centro de Sensoriamento Remoto da Universidade Federal de Minas Gerais (CSR-UFMG) que realizam o monitoramento do risco de incêndios no bioma para entender as alterações causadas pelo El Niño neste ano, somado aos efeitos das mudanças climáticas.
Uma pesquisa feita em nove áreas protegidas de uso sustentável – cinco reservas extrativistas (Resex), duas reservas de desenvolvimento sustentável (RDS) e duas florestas estaduais – da Amazônia Legal mostrou que a existência de comunidades ribeirinhas e tradicionais não configura um risco para espécies de aves e mamíferos consideradas alvos de caça para subsistência, como mostra O Eco. O estudo, porém, sugere que, para diminuir os efeitos negativos da atividade, seria importante promover estratégias de manejo, entre elas reduzir o consumo local de espécies sensíveis – como anta, queixada e mutum – e proibir o comércio de carne de caça nas áreas urbanas.
📙 Cultura
Os valores afro-brasileiros permeiam a produção de ilustradores negros na literatura infantil na exposição “Karingana”, em cartaz no Sesc Bom Retiro, em São Paulo, até janeiro de 2024. São 92 trabalhos de 47 profissionais que revelam como as populações de diásporas negras se organizam socialmente. Ao Lunetas a curadora Ananda Luz lista livros que se relacionam a cada um dos valores, como ancestralidade, musicalidade e memória, presentes na mostra. “Foram consideradas as diversas infâncias, representadas por diferentes técnicas de ilustrar, bem como ambientes e elementos significativos de cotidianos afro-referenciados”, relata.
O Museu Virtual Rio Memória lançou a galeria Rio de Marés nesta semana. A seção reúne uma curadoria de textos e imagens da história do Conjunto de Favelas da Maré, composto por 16 comunidades na zona norte do Rio de Janeiro. O Maré de Notícias destaca que a iniciativa traz depoimentos de moradores para mostrar “a história que não é contada”, nas palavras da idealizadora do Rio Memórias, Lívia de Sá Baião. O projeto pretende também expandir a pesquisa para outras favelas cariocas.
🎧 Podcast
“Para quem pode ficar em casa na pandemia, o tempo ganhou uma dimensão completamente diferente. Alguns dos demarcadores de tempo mais importantes, que são nossa movimentação e nosso trânsito entre os espaços, foram perdidos”, afirma Luiz Mauro Sá Martino, jornalista, cientista social e autor de “Sem Tempo para Nada”, livro lançado em 2022. A “Rádio Escafandro”, produção da Rádio Guarda-Chuva, mergulha no universo do tempo, como os dias estão cada vez mais acelerados, o modo como a produção capitalista dita essa percepção e como isso se relaciona com a entropia, um dos conceitos mais importantes da física.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
Fundado por Lélia Gonzalez e outras ativistas, o Nzinga Informativo foi o primeiro jornal do feminismo negro que se tem conhecimento no país e atuou para defender os direitos das mulheres negras e a justiça social. O Nós, Mulheres da Periferia resgata a história do veículo, que em apenas cinco edições, entre 1985 e 1989, desdobrou-se para falar sobre política, agendas culturais, história e educação em prol da comunidade negra como um todo. Entre as páginas do Nzinga Informativo, estiveram também explicações sobre a Constituinte – convocada em 1985 e que resultou na Constituição que temos hoje – com textos sobre a importância de se ter mulheres negras nessa construção.