Os resíduos de agrotóxicos na comida e os vencedores do Jabuti
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🔸 Um em cada quatro alimentos de origem vegetal no país tem resíduos de agrotóxicos proibidos ou acima do permitido. É o que informa relatório da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) divulgado ontem. O estudo é feito a partir de dados de 2018, 2019 e 2022, já que, em 2020 e em 2021, a análise foi suspensa por causa da pandemia. O Notícia Preta explica como funciona a avaliação: as informações foram coletadas em supermercados de 79 municípios, de todas as regiões do Brasil. Batata, brócolis, café em pó, laranja e feijão estão entre os 13 alimentos analisados.
🔸 O presidente Lula tem até o dia 17 para sancionar ou vetar o PL do Veneno, como é conhecido o projeto de lei que flexibiliza as regras para o uso de agrotóxicos no país. O termo “agrotóxico”, aliás, sumiu da lei: foi substituído por eufemismos como “defensivos agrícolas” e “herbicidas”. O texto passou pelo Senado às vésperas da COP28, mas outras propostas abraçadas pela bancada ruralista estão por vir, como informa o Projeto Colabora. Na semana que vem, a Comissão do Meio Ambiente do Senado deve votar a Lei Geral do Licenciamento Ambiental, alvo de críticas de ambientalistas. Eles alertam que o texto, se aprovado sem alterações, enfraquecerá o licenciamento ambiental no país, eliminando critérios nacionais e dispensando certidão do uso do solo. Indígenas e quilombolas seriam afetados, já que empreendimentos nessas áreas só precisariam de licença se estivessem em terras demarcadas.
🔸 Por falar em retrocesso: em meio à COP28, o governo deu incentivos fiscais a um projeto que explora gás no Amazonas, nos municípios de Silves e Itapiranga. No primeiro dia da Conferência do Clima das Nações Unidas, o Ministério de Minas e Energia (MME) publicou portaria em que classificou o empreendimento do Complexo do Campo do Azulão como prioritário. Isso significa que o negócio terá o financiamento a longo prazo facilitado, como mostra a Info Amazonia. A reportagem lembra que a empresa chegou a perder as licenças de operação depois de a Justiça entender que o projeto desconsiderou a existência de comunidades indígenas da região de Silves. Mas em apenas um dia a decisão judicial foi revertida.
🔸 Alvo de greves e protestos, a privatização da Sabesp foi aprovada nesta semana pela Assembleia Legislativa de São Paulo. O Nexo explica como se dá o processo de desestatização – por meio de concessão, venda de ativos e parcerias público-privadas, entre outras – e o que acontece depois da aprovação na assembleia. Atualmente, a Sabesp é uma empresa de capital misto, ou seja, apesar de ser controlada pelo governo de São Paulo, tem participação privada, com ações negociadas nas bolsas de valores de São Paulo e de Nova York.
📮 Outras histórias
O filho pródigo no Museu de Arte do Rio (MAR). Conhecido como Albarte, Raphael Albuquerque é morador do Gogó do Chapadão, em Guadalupe, zona norte do Rio de Janeiro. Aos 25 anos, o filho da costureira Fabiana Albuquerque teve o primeiro contato com arte a partir da mãe: em 2008, ela costurava fantasias para grupos de bate bola no Carnaval. Albarte estudou desenho e, em seis meses de curso, já era professor. O Voz das Comunidades conta que agora ele integra a mostra “Funk: Um Grito de Ousadia e Liberdade”, em cartaz no MAR até agosto de 2024. Também mantém o projeto Mobilização Marginal, em que leva conhecimento artístico para jovens da favela. Fundado por ele e dois amigos durante a pandemia, o projeto vendeu obras dos três artistas, revertidas em doações de cestas básicas na comunidade.
📌 Investigação
De 114 serviços de referência para realização do aborto legal no Brasil, apenas quatro – 3,5% do total – realizam a interrupção de gestações acima de 20 semanas em casos de violência sexual, como revela levantamento do Portal Catarinas. Dois estão no Nordeste, e dois no Sudeste. Entre eles, estão o Hospital de Clínicas de Uberlândia (MG), e o Centro Universitário Integrado de Saúde Amaury de Medeiros (Cisam), no Recife (PE). Os demais pediram para não ser identificados. O aborto é permitido em apenas três situações no país, e a legislação não coloca limite para interromper gestações avançadas. A maior parte dos serviços de saúde, no entanto, não faz abortos acima da 20ª ou 22ª semana de gestação, podendo variar desde que o feto tenha até 500 gramas.
🍂 Meio ambiente
Iniciada em abril sem licitação e estudo de impacto ambiental, a duplicação da Estrada do Alvarenga, na zona sul de São Paulo, pela prefeitura está envolta em questionamentos e irregularidades, como falta de licenciamento ambiental, desmatamento em Área de Preservação Permanente, soterramento de represa e descumprimento de determinações legais. Segundo a Agência Mural, o Ministério Público pediu a paralisação da obra em
agosto, com multa de R$30 mil por dia de descumprimento. A prefeitura, no entanto, só suspendeu as atividades dois meses depois e recorreu à Justiça no dia 31 de outubro. Apenas um dia após o recurso, o presidente do Tribunal, Ricardo Anafe, suspendeu a decisão liminar do MP e permitiu a retomada das obras, ainda que sem licitação.
📙 Cultura
O quadrinista Marcelo D’Salete, a historiadora Lilia Moritz Schwarcz e o cientista social Marcos Nobre foram alguns dos autores que tiveram suas obras premiadas pela 65ª edição do Prêmio Jabuti. A coletânea de 56 sonetos “Engenheiro Fantasma”, do poeta Fabrício Corsaletti, venceu a categoria Livro do Ano e também em Poesia. A obra é narrada em primeira pessoa por um personagem que seria o artista Bob Dylan. A história contada pelo cantor é revelada ao autor em sonho. A Quatro Cinco Um lista todos os vencedores, além dos finalistas em cada categoria, divididas em quatro eixos temáticos.
A propósito: na categoria infantil, o vencedor foi “Doçura”, de Emília Nuñez e Anna Cunha. A obra é um livro-imagem que trata a formação leitora na infância, tal como o afeto e dedicação para criar uma nova geração de leitores. “Ler para uma criança é uma declaração de amor. A gente se conecta, fortalece vínculos e cria espaços de qualidade. É uma forma de dizer ‘eu te amo’ e de receber todo esse carinho de volta”, afirma Nuñez. O Lunetas detalha, a partir do livro, a centralidade do afeto e a responsabilidade coletiva para promover o acesso das crianças à literatura.
🎧 Podcast
Por séculos, a arqueologia e a paleontologia foram dominadas por homens brancos à frente das pesquisas e das narrativas. O resultado está nos museus da Europa e dos Estados Unidos, que guardam coleções de materiais arqueológicos e artefatos valiosos de países colonizados. Esse é o pano de fundo cristalizado também no imaginário social a partir de obras como a franquia “Indiana Jones”, em que os povos que tiveram seu patrimônio histórico e cultural roubado não têm seu lado contado nos filmes. O “Ciência Suja”, produção da Rádio Guarda-Chuva, mergulha no mundo desses campos científicos e traz as dificuldades enfrentadas por pesquisadores do Sul Global em publicar artigos, principalmente quando eles mexem com princípios do Norte Global.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
Na Bahia, professora de inglês aposentada Conceição Rodrigues, ao lado de outros oito colegas, desenvolveu o Black Matters Matter (assuntos sobre negros importam), um livro com métodos e atividades para debater questões étnico-raciais com os estudantes no ensino do idioma. O Meus Sertões narra a história de Conceição e como ela buscou ao longo de sua trajetória atender a transversalidade da lei 10.639, de 2003, que tornou obrigatório o curso de história da África e cultura afro-brasileira nas escolas de todo o país. “Eu estava em uma sala, em uma comunidade onde a maioria das pessoas eram negras. Então por que não tratar dessas questões que diziam respeito a elas?”, conta a docente.