O adeus a João Donato e a reformulação da política de drogas
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🔸 “Muitas histórias começam sob lonas de circo. A minha é mais uma delas. Foi num modesto picadeiro de Rio Branco, no Acre, que, sem tirar os olhos de um motoqueiro do Globo da Morte, pela primeira vez toquei acordeão em público. […] Naquele dia ouvi meus primeiros aplausos. Gostei.” Era 2008, e João Donato abria seu depoimento à piauí contando suas origens para rever toda sua trajetória a pedido da revista. Autor de marcos da MPB, como “A Rã”, e parceiro de nomes como Tom Jobim, João Gilberto e Gilberto Gil, o pianista, arranjador, cantor e compositor da bossa nova morreu ontem, aos 88 anos, em decorrência de diversos problemas de saúde.
🔸 Em áudio: o pioneiro da bossa nova dizia que gostava mesmo era de jazz. Donato teve uma carreira sólida no Brasil e nos Estados Unidos, com 40 discos gravados. “Seu legado e suas contribuições marcam uma revolução na bossa nova, no samba, no jazz e no ijexá”, afirmou a ministra da Cultura, Margareth Menezes. O “Durma com Essa”, podcast do Nexo, mostra a repercussão da morte de João Donato e relembra sua trajetória.
🔸 Depois de trabalhar em condições análogas à escravidão por mais de quatro décadas, uma mulher de 53 anos teve o pedido de indenização negado pela Justiça do Trabalho da Bahia. Ela teria começado a fazer os serviços da casa de uma família em Salvador quando tinha apenas 7 anos, sem nunca ter recebido remuneração. O juiz alegou que ela não “encarnou a condição de trabalhadora, mas de integrante da família”. “É aquela velha história de dizer que a trabalhadora pertence ao seio familiar e, com isso, negar a ela seus direitos”, afirma à Repórter Brasil Admar Fontes Júnior, coordenador estadual de enfrentamento ao trabalho escravo na Bahia. O Ministério Público do Trabalho (MPT) vai recorrer da decisão.
🔸 Cerca de 1,5 milhão de brasileiros com dívidas até R$ 100 terão o nome limpo na fase inicial do Desenrola Brasil, programa de renegociação do governo que começou nesta semana. O Jota explica quem pode participar e como será o processo. Enquanto isso, nas redes sociais, os golpes com o nome do programa já começaram. Entre os anúncios da Meta, empresa responsável pelo Facebook e Instagram, a Lupa identificou ao menos 50 publicações que deram origem a diversos anúncios patrocinados, criados para enganar usuários e colher informações como CPF e dados de cartão de crédito.
🔸 Os acusados de hostilizar o ministro Alexandre de Moraes na Itália depõem hoje à Polícia Federal. O empresário Roberto Mantovani Filho e sua esposa, Andreia Mantovani, já negaram, em nota, os ataques ao magistrado do Supremo Tribunal Federal (STF). O casal classifica o caso como um “mal entendido”. Do outro lado, Moraes enviou à PF uma representação para registrar sua versão. O Aos Fatos organiza o que se sabe do episódio até agora.
🔸 Foi rápido. Depois de registrar mais de 100 milhões de usuários em cinco dias, o Threads desabou. O novo app, criado para concorrer com o Twitter, perdeu 46% dos usuários ativos e metade do seu tempo de uso desde a semana passada. O Núcleo aponta duas possíveis razões para a rápida perda de usuários: o fato de o aplicativo ainda estar em desenvolvimento e a afirmação dos executivos da Meta de que os temas de política e as notícias serão desestimulados.
📮 Outras histórias
Há cerca de 20 anos, indígenas da etnia Karapotó Terra Nova, em São Sebastião (AL), aguardam a construção de uma escola na comunidade. O governo estadual já fez a licitação que escolheu a empresa para fazer a obra, mas o contrato ainda não foi assinado, informa a Mídia Caeté. Nesta segunda-feira, os indígenas decidiram ocupar a Secretaria Estadual de Educação de Alagoas, no bairro do Farol, em Maceió. Eles estimam que, sem a garantia do direito à educação escolar indígena, pelo menos 150 estudantes indígenas estudam em escolas municipais de cidades distintas. “Foi iniciado o projeto da escola, e as nossas crianças da educação infantil hoje já estão cursando faculdade. Tudo isso não faz com que se perca a cultura e a identidade, mas enfraquece a educação, e a educação é complemento da nossa cultura”, afirma a liderança da comunidade, Cacique Nena Karapotó.
📌 Investigação
A vigilância é feita por empresas, governos e até pelos próprios cidadãos, mas pode beirar o autoritarismo e a violação de direitos. Em oito episódios, o “Revoar”, produção da Rádio Novelo para o LAUT - Centro de Análise da Liberdade e do Autoritarismo, revela como o monitoramento de informações está relacionado à democracia, a partir de conversas com especialistas e estudos de caso. Conduzidos pelos pesquisadores Anna Carolina Venturini e Felipe de Paula, os diálogos englobam temas como proteção de dados pessoais, o uso de tecnologias e quem as controla, a formulação de políticas públicas, sua utilização na segurança e as consequências na justiça.
🍂 Meio ambiente
Envolta em sua ligação com o petróleo, Macaé (RJ), a “Capital do Pré-Sal”, agora também recebe a alcunha de “Capital Brasileira das Termelétricas”. Enquanto o mundo corre contra o tempo para implementar uma transição energética, com base em fontes renováveis, o município fluminense vive na contramão, ampliando o uso de combustíveis fósseis para produzir energia. Segundo O Eco, já há duas usinas em funcionamento, uma (Marlim Azul I) em fase de pré-operação, e outras dez sendo licenciadas pelo Ibama ou pelo Instituto Estadual do Ambiente (Inea), para que possam entrar em novos leilões de energia promovidos pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
Ampliar e reclassificar unidades de conservação é uma das propostas do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima ao redor da Terra Indígena Yanomami para dar uma “proteção adicional” ao território. À Pública o presidente do ICMBio, Mauro Pires, explica que há unidades que já estão em estágio bem avançado de finalização em Roraima e no Pará: “Quando a ministra Marina Silva assumiu, foi feito um levantamento e se constatou que esses processos estavam parados. A gente não teve criação de nenhum hectare de unidade de conservação nos últimos anos, ao contrário, tivemos redução”.
📙 Cultura
“A cultura tem uma tarefa de luta e resistência”, afirma Carla Loop, diretora nacional do Coletivo de Cultura do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Em entrevista ao Nonada, ao lado do integrante da frente de teatro, Douglas Estevam, ela explica como a arte é também um dos pilares do movimento para pensar na transformação da sociedade. “Para além de construir escola, posto de saúde, casas para as pessoas morarem, a gente precisa pensar na construção de espaços culturais, de modo que aquilo que já foi produzido chegue no campo. E que as pessoas que ali vivem, e produzem cultura – seja artística, alimentar, das diversas maneiras, também possam acessar formas de fomentar e desenvolver arte”, diz Loop.
A série pernambucana “Pretas da História” resgata as trajetórias de dez mulheres negras em episódios de três minutos de duração a serem transmitidos nos intervalos da programação da TV Pernambuco, a partir desta quinta. “Ainda somos um país muito carente de informações sobre a nossa própria história. Nesse sentido, ao ser exibida numa TV pública e aberta, para todas as faixas sociais e etárias, a série contribui para uma reparação histórica que é urgente”, relata a produtora executiva Pollyanna Melo. A revista O Grito! conta que o material, dirigido e roteirizado por Danielle Valentim, aprofunda essas histórias trazendo o legado dessas mulheres na construção do país.
🎧 Podcast
As crianças passam por quase uma década na escola em um modelo engessado que dá pouco espaço às vivências dos alunos. A “Rádio Escafandro”, produção da Rádio Guarda-Chuva, mergulha em questionamentos sobre a forma como se dá a educação escolar e experiências alternativas que podem tirar os estudantes da zona de conforto. Uma delas é a do professor, educador e fundador do Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento, Tião Rocha, que transformou o modo de dar aulas a partir de um evento traumático que ocorreu com um aluno.
🧑🏽⚕️ Saúde
O Ministério da Saúde vai reformular a política de atendimento a usuários de drogas tanto lícitas quanto ilícitas, com maior foco na redução de danos e garantindo serviços com ações de educação. O objetivo (e também) desafio da pasta é implementar uma dinâmica transversal, envolvendo áreas da saúde, assistência social, justiça, trabalho e moradia, por exemplo. O Projeto Colabora detalha que a estratégia vem três anos após o ex-presidente Jair Bolsonaro criar a nova Política Nacional sobre Drogas, voltada para a abstinência, abrindo espaço para criminalização dos consumidores e maior emprego de violência por parte do Estado.
O episódio de Rádio Escafandro citado nessa edição da newsletter ficou fantástico! Todo mundo que gostaria de conhecer alternativas para educação deve escutar.