A PEC que blinda parlamentares e uma ameaça ao cultivo da mandioca
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🔸 A Câmara aprovou ontem a PEC da Blindagem. A Proposta de Emenda à Constituição prevê que qualquer investigação ou prisão de deputados e senadores só poderá ocorrer com autorização do Congresso. A única exceção é quando o crime for inafiançável ou cometido em flagrante. O texto cria ainda um foro privilegiado para presidentes de partidos. Segundo o Metrópoles, a PEC diz que a Câmara e o Senado terão de liberar a prisão ou processo por meio de votação, com o apoio da maioria absoluta de seus membros, no prazo de 90 dias após a ordem do Supremo Tribunal Federal (STF).
🔸 Já o PL da Anistia terá a possibilidade de votação em regime de urgência avaliada hoje, em reunião entre lideranças partidárias e o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). O texto que deve ser votado abrange apenas os atos de 8 de Janeiro e manifestações ligadas a ele, mas expande os efeitos do perdão: extingue automaticamente penas e processos, assegura os direitos políticos dos beneficiados, anula multas aplicadas pela Justiça e inclui também quem publicou conteúdos em redes sociais sobre os atos. O substitutivo altera o Código Penal e o de Processo Penal – exige violência ou grave ameaça para configurar crimes de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático. Na prática, informa o Jota, essa versão do projeto de lei poderia beneficiar o ex-presidente e os demais réus na trama golpista, a depender da interpretação.
🔸 A oposição tenta uma manobra para evitar a cassação de Eduardo Bolsonaro (PL-SP) por excesso de faltas: ele foi indicado para assumir a liderança da Minoria na Câmara. Como líder, terá suas faltas abonadas, explica o Congresso em Foco. Desde março, o deputado vive nos Estados Unidos. Sua licença terminou em julho e, depois disso, ele não registrou presença em nenhuma sessão. Já foram ao menos 18 ausências não justificadas em 2025 – acima do limite que pode levar à perda de mandato. A manobra ocorreu com a saída da deputada Caroline de Toni (PL-SC) do posto. O movimento se apoia numa resolução de 2015, aprovada sob a presidência de Eduardo Cunha, que garante a líderes partidários e dirigentes isenção da obrigação de justificar faltas.
🔸 Em mais uma condenação, Bolsonaro, o pai, terá de pagar R$ 1 milhão por falas racistas proferidas em 2021, quando ainda era chefe do Executivo. Ele foi condenado a pagar a indenização numa ação aberta pelo Ministério Público Federal (MPF) e pela Defensoria Pública da União (DPU). A Alma Preta lembra que o caso ocorreu nos dias 4 e 6 de maio e em 8 de julho daquele ano, durante live de Bolsonaro numa rede social. O ex-presidente comparou o cabelo crespo de uma pessoa negra, presente na live, com um “criatório de baratas”. A defesa dele alegou que as manifestações foram feitas em contexto de humor, mas o argumento não convenceu o desembargador e relator do caso, Rogério Favreto: “A ofensa racial disfarçada de manifestação jocosa ou de simples brincadeira, que relaciona o cabelo ‘black power’ a insetos que causam repulsa e à sujeira atinge a honra e a dignidade das pessoas negras e potencializa o estigma de inferioridade dessa população. Trata-se de comportamento que tem origem na escravidão, perpetuando um processo de desumanização das pessoas escravizadas”.
🔸 Uma organização foi ao STF para pedir que a autoidentificação como preto ou pardo seja mantida como critério para acesso às cotas raciais em universidades e concursos públicos. O pedido é uma resposta do Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-Brasileiras (Idafro) a uma decisão recente da Corte, que validou o controle judicial sobre bancas de heteroidentificação e passou a exigir que candidatos se declarem “negros” ou “pardos”. O Mundo Negro conta que, segundo o Idafro, a medida representa retrocesso. Os advogados argumentam que a origem racial não pode ser definida de forma objetiva, ao contrário de traços fenotípicos como pele, cabelo e características faciais. “‘Negro’ não é critério jurídico ou administrativo, mas uma noção ligada à origem racial, impossível de ser aferida objetivamente”, explica Silva Jr., doutor em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
📮 Outras histórias
Agentes do IBGE vão telefonar para mais de 30 mil domicílios gaúchos. A Pesquisa Especial sobre as Enchentes de 2024 no Rio Grande do Sul será a primeira do instituto feita por telefone, segundo o Sul21. A reportagem mostra como vai funcionar o levantamento, que começou nesta segunda e segue até o dia 19 de dezembro em 133 municípios. O objetivo é mapear os impactos das enchentes que atingiram o estado um ano depois, a partir da avaliação de informações como moradia, saúde física e mental, trabalho, educação, qualidade de vida, auxílios recebidos e medidas de prevenção. Os resultados vão subsidiar políticas públicas futuras não apenas para enchentes, mas também para outros eventos climáticos extremos, como queimadas. O IBGE já fez testes da pesquisa telefônica no estado. “É um tema muito sensível. As pessoas ou reclamam, ou choram no telefone, abrem o coração”, conta Juliana Paiva, gerente substituta de Estudos e Pesquisas Sociais do instituto.
📌 Investigação
Povos indígenas do Alto Rio Negro veem a preservação do cultivo da mandioca braba ameaçada pela valorização dos modos de vida não indígenas, intensificada com a chegada da internet, dos produtos ultraprocessados e de missionários cristãos. A desestruturação das comunidades dificulta o engajamento de jovens no plantio, atividade desvalorizada socialmente. O Joio e O Trigo esmiúça as ameaças a um sistema agrícola tradicional, reconhecido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), com dezenas de manivas diferentes. “Vejo que hoje a gente entra nesse capitalismo. O capitalismo domina, entendeu? Então, hoje não há mais partilha. Você chega na comunidade, as pessoas querem vender. ‘Você tem isso?’ ‘Tem, mas é tanto.’ Que antes não era”, conta a agricultora Almerinda Ramos de Lima.
🍂 Meio ambiente
Cientistas defendem a criação do conceito de “endemismo insular-provincial” para incluir não apenas espécies exclusivas a uma ilha específica, mas também as que ocorrem em um conjunto de ilhas de uma mesma área biogeográfica e não estão nas porções continentais próximas. Segundo o Conexão Planeta, em artigo publicado neste mês na revista científica “Peer Community Journal”, os pesquisadores Hudson Pinheiro, do Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo (USP) e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza, Luiz Rocha, da Academia de Ciências da Califórnia, e Juan Pablo Quimbayo, cientista da Universidade de Miami, alertam sobre o alto número de espécies marinhas endêmicas em ilhas e arquipélagos. “Percebemos que as ilhas brasileiras possuem uma importância muito maior do que pensávamos. Elas quase não eram citadas quando se falava em endemismo, mas nossos dados e novas interpretações mostram que são verdadeiros laboratórios naturais da evolução das espécies”, afirma Pinheiro.
📙 Cultura
Para contrariar o estigma de secura, miséria e desespero relacionado ao Semiárido cearense, os fotógrafos Marcos Vieira e Celso Oliveira mergulharam nas entranhas do território. A ideia era retratar a beleza oculta, o pulsar da vida e a complexidade do sertanejo. As fotografias foram reunidas na exposição “Ser-tão: Cartografias da Alma em Luz e Sombra”, que vai percorrer universidades e institutos federais de todo o estado. Ao Meus Sertões Vieira fala sobre o processo de criação das obras: “Este projeto é fruto de uma vivência profunda no Ceará e no Nordeste, onde a câmera serviu como extensão do olhar de pesquisador e artista. O processo envolveu uma imersão etnográfica, cultivando laços com as comunidades e capturando a autenticidade dos momentos que só o tempo e a familiaridade podem revelar. Não se tratou apenas de registrar, mas de compreender os ciclos da natureza, a resiliência nos rostos e a poesia nas texturas”.
🎧 Podcast
Embora o Brasil tenha sido o primeiro país a reconhecer a independência de Angola – por interesses econômicos – em 1975, oito anos antes, navios da Marinha brasileira combatiam no litoral angolano em apoio a Portugal para manter a estrutura colonial. O “Vida de Jornalista”, produção da Rádio Guarda-Chuva, narra como a ditadura militar ajudou seu próprio colonizador e como uma batalha militar e diplomática também se estabeleceu nas páginas dos jornais. A maioria dos veículos tinha um posicionamento pró-Portugal, com apoio à ditadura de António Salazar e ao colonialismo na África. Poucos jornais brasileiros se posicionaram pela resistência à colonização ou de forma crítica ao governo português.
🏃🏿♂️ Esporte
Para manter viva a paixão pelo esporte mais popular do país, torcidas LGBTQIA+ lutam para transformar o futebol e as arquibancadas em espaços mais inclusivos. O Anuário LGBTQIAP+ no Futebol 2024 mostrou que casos de LGBTfobia cresceram 191,4%, entre 2020 e 2023, dos quais 52,5% aconteceram dentro dos estádios e 52,5% foram direcionados à torcida. A Emerge Mag mostra a atuação de organizações e coletivos para combater a discriminação no esporte. “Ações afirmativas e punições contra os clubes por motivos de homofobia demonstram que as instituições que regulam o futebol precisam ter comprometimento com causa”, afirma Onã Rudá, fundador e presidente da Canarinhos LGBTQ+, que reúne mais de uma dezena de torcidas organizadas com foco em diversidade sexual e de gênero, como a LGBTricolor (Bahia), Marias de Minas (Cruzeiro), Palmeiras Livre (Palmeiras), Furacão LGBTQ (Atlético Mineiro) e Papão Livre (Paysandu).