O 7 de Setembro pós-Bolsonaro e a queda das queimadas na Amazônia
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🔸 Sem a titulação oficial de seus territórios, os quilombolas são alvos ambulantes. De acordo com a Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq), pelo menos 30 quilombolas foram mortos nos últimos dez anos em 18 territórios diferentes – e apenas duas destas comunidades foram tituladas, enquanto outras duas obtiveram a titulação de uma parte da área, como apurou a Repórter Brasil. O brutal assassinato de Bernadete Pacífico, liderança do quilombo de Pitanga dos Palmares (BA), no último dia 17, reflete os riscos da demora no processo de titulação de territórios. Embora tenha sido reconhecida como comunidade quilombola em 2005, quase duas décadas depois, a demarcação definitiva não foi concluída. “Se você titula a terra, diminui drasticamente a chance de conflito”, afirma Hédio Silva Jr, ex-secretário de Justiça do Estado de São Paulo.
🔸 Pela indicação de uma mulher negra para o STF, mais de 11 mil pessoas, em apenas um dia, aderiram a uma campanha online organizada por movimentos negros do país. Ao entrar num site e aderir à causa, cada pessoa envia um e-mail ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A Ponte traz a íntegra da mensagem que é disparada ao chefe do Executivo. O texto lembra que, em mais de 130 anos, o Supremo Tribunal Federal conta “historicamente com uma representação ínfima – quando não nula” da população negra. Com a vaga que se abrirá após a aposentadoria de Rosa Weber, em outubro, “indicar uma mulher negra ao STF não é um favor, é reparação histórica”. “Essa é uma decisão que será crucial para o futuro do Brasil, com consequências que se refletirão nas próximas décadas”, completa o texto.
🔸 O primeiro 7 de Setembro pós-Bolsonaro “nasce sob as expectativas de ser um recomeço para uma jovem democracia com enormes desafios”, mas também “corre o risco de ser mais uma vez capturado pelo tumulto, a violência e a ameaça”. Em análise no Headline, o cientista político Creomar de Souza avalia que a “tensão explícita” que marcou as vésperas da data nos anos anteriores está menor, mas as autoridades devem dar atenção “aos riscos derivados de eventuais ações extremistas”. Ele explica: “O ponto é que, apesar do recuo temporário ou talvez estratégico daqueles que insuflaram populares a se insurgir contra o prédio democrático, de fato o país segue tanto quanto ferido e dividido”.
📮 Outras histórias
Há 21 anos, Alexander Faustino cruza as ruas do Complexo da Maré anunciando seu ofício a plenos pulmões: “Vassoureirooo”, diz, estendendo a vogal final da palavra. Começou na função quando perdeu o emprego de carteira assinada. Foi levado a uma fábrica de vassouras pelo sogro, que conhecia o dono da empresa. “Como eu não tinha dinheiro, ele me cedeu um amarrado de vassoura, deixei minha identidade como garantia, e fui aprendendo de acordo com o tempo vender vassoura”, conta. O Maré de Notícias narra a rotina de Alexander: hoje, aos 40 anos, ele sai de casa às 6h rumo à fábrica e em seguida volta para a Maré para cumprir uma rota pelas favelas do complexo na zona norte do Rio de Janeiro. “É engraçado ver que algo virou referência, quando as crianças imitam o meu grito do ‘ouuu vassoureiroou’. No fundo, ser ambulante é um trabalho digno, pouco valorizado, cansativo, mas amo meu trabalho”, afirma.
📌 Investigação
O aplicativo de mensagens ICQ foi suspenso em todo o país por disseminar pornografia infantil. O pedido de suspensão foi feito à Justiça pela Polícia Federal depois de “inúmeras tentativas infrutíferas” de contato com o app que, segundo a PF, tornou-se uma ferramenta para espalhar conteúdos de crianças e adolescentes “em condição de nudez e/ou sendo abusadas sexualmente”. O ICQ pertence à empresa russa VK – sem sede ou representação no Brasil. Desde junho deste ano, o Núcleo denuncia em reportagens como o aplicativo se converteu num veículo para a venda de vídeos e imagens contendo nudez de crianças e jovens. As publicações tinham o alcance alavancado por links compartilhados em grupos abertos no Facebook.
🍂 Meio ambiente
As queimadas na Amazônia caíram quase 50% em agosto deste ano em relação ao mesmo mês de 2022. Desde o início de 2023, somente maio tinha apresentado queda em comparação com o ano passado. O Eco lembra, porém, que nos demais meses do ano o número apresentou alta. Na região amazônica, o estado que mais queima é o Pará. Também no Cerrado, cuja destruição se manteve em alta ao longo de todo o primeiro semestre, o índice caiu em agosto – foram registrados 6.850 focos de calor. Trata-se do segundo menor valor de toda a série histórica do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), iniciada em 1998.
📙 Cultura
Em áudio: dois livros para entender o STF – o primeiro “ O Supremo: entre o Direito e a política”, Diego Werneck Arguelhes, lançado pela Intrínseca, e o segundo “O Discreto Charme da Magistocracia: Vícios e Disfarces do Judiciário Brasileiro”, de Conrado Hübner Mendes, previsto para novembro pela editora Todavia. Advogados e professores de direito, os dois falam ao “451 MHz”, podcast da Quatro Cinco Um, sobre a Corte e sua relação com os outros poderes da democracia.
“As pessoas estão chocadas com o meu livro não apenas por ele ser um livro escrachado, mas porque sou uma mulher e jovem.” A afirmação é da escritora Bruna Kalil Othero, de 28 anos, que acaba de lançar “O Presidente Pornô” pela editora Companhia das Letras. Em entrevista à Escotilha, a autora afirma que tem como referências para fazer um “livro tão escrachado”, como ela própria define, nomes como Gilka Machado, tida como a primeira mulher a escrever poesia erótica no Brasil, e Hilda Hilst. Embora tenha começado pela poesia, Bruna transita entre gêneros literários – seu mais recente livro é um romance que propõe uma narrativa debochada sobre a política brasileira. “A literatura é esse espelho meio torto, meio quebrado, que a gente coloca na frente da nossa cara e às vezes não quer ver, porque é uma imagem meio confusa, pois o que ele mostra é um tanto desconfortável. Mas acho que a gente tem que encarar esse espelho”, afirma a autora.
🎧 Podcast
“Ainda que eu seja uma mulher preta ativista e que fala muito sobre questões raciais, descobri que eu mesma conhecia muito pouco a galera que está fazendo comédia preta atualmente”, conta a atriz Luana Xavier, parte do elenco da série “Humor Negro”. A comédia, que teve início em 2022 como um stand-up em Salvador, ganhou as telas e está disponível no Globoplay e no Multishow. O “Papo Preto”, produção da Alma Preta, entrevista Luana sobre os dez episódios do programa. Com pessoas negras na plateia, nos bastidores e no palco, a atriz afirma que atuar com a ancestralidade ao redor traz a “sensação de irmandade, o que faz muita diferença”. “Se não fossem as pessoas pretas nos bastidores, nós dificilmente teríamos tantas pessoas pretas na frente das câmeras num projeto como esse”, diz Luana.
🧑🏽🏫 Educação
Prevista em lei, a contratação de psicólogos e assistentes sociais no ambiente escolar não é garantida em todas as escolas brasileiras. E, como explica o Projeto Colabora, até mesmo a confusão sobre a função desempenhada pelos profissionais dificulta a implementação da lei, uma ferramenta para ajudar a conter a violência nas escolas. Entre setembro de 2022 e abril de 2023, o país registrou cinco ataques com mortes na rede de ensino. Um dos principais obstáculos para garantir o amparo dos alunos por profissionais qualificados é a diferença entre a legislação do municípios e estados. Para a especialista em Serviço Social e Psicologia, Kênia Figueiredo, ainda que a solução para a violência escolar não seja unicamente tarefa deles, “a presença dos assistentes sociais e psicólogos tende a trazer mais a comunidade para dentro da escola”.