Os 2 anos da morte de Bruno e Dom e o feminismo de dados
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🔸 “Sejam mais como Dom e como Bruno. Sejam atuantes. Não fiquem só nessa coisa de livros e teses de vocês. Não funciona”, disse Beto Marubo diante de uma plateia majoritariamente branca na Universidade de Yale. Um dos nomes à frente da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari, a Univaja, ele participou das buscas pelo jornalista Dom Phillips e o indigenista Bruno Pereira, brutalmente assassinatos há dois anos por pescadores que invadiam sistematicamente a Terra Indígena Vale do Javari. Na CartaCapital, o repórter Daniel Camargos conta como foi a participação de Marubo na conferência em Yale e lembra como a luta de Dom e Bruno ainda estão vivas.
🔸 A propósito: o documentário que segue os passos de Camargos na busca pelo corpo do amigo e colega de profissão Dom Phillips fez sua estreia internacional em Londres, num evento em homenagem aos ativistas. “Relatos de um Correspondente da Guerra na Amazônia”, produção da Repórter Brasil, é um dos indicados ao Prêmio Gabo 2024, o mais prestigiado do jornalismo latino-americano, e, no ano passado, foi vencedor do 40º Prêmio Direitos Humanos de Jornalismo.
🔸 Em áudio: a região do Vale do Javari, no oeste do estado do Amazonas, é a segunda maior Terra Indígena do Brasil, é um território em disputa – desde o século 19. Ainda em 1874, os indígenas sofreram uma de suas primeiras invasões. “Morte e Vida Javari”, podcast da Agência Pública, mergulha no passado da região, passa pela ditadura e chega até os dias de hoje. O jornalista Rubens Valente e o documentarista José Medeiros conversaram com mais de 40 pessoas do Javari para narrar as ocupações da região, um espelho de várias outras pelo país. No episódio de estreia, “O Primeiro Massacre”, eles puxam o fio dessa história.
🔸 Ontem, Dia Mundial do Meio Ambiente, a ministra Marina Silva anunciou a criação de novas unidades de conservação. Juntas, as nove reservas federais criadas ou ampliadas – a maioria delas na Amazônia – somam 6 mil km², área quatro vezes maior que a da capital São Paulo. O Eco detalha as outras medidas anunciadas e destaca que, no mesmo dia, mais de 1.200 fiscais e chefias do Ibama e ICMBio entregaram os cargos. Foi um ato de protesto por não terem atendidos os pedidos de melhores salários e condições de trabalho. “Os servidores já estão sem realizar atividades de campo há seis meses, porque a demanda interna represada é alta, não há infraestrutura adequada”, diz Cleberson Zavaski, presidente da Associação Nacional dos Servidores de Carreira de Especialista em Meio Ambiente (Ascema).
🔸 Enquanto isso, no Cerrado… a seca é a pior em pelo menos sete séculos. É o que revela um estudo liderado por pesquisadores brasileiros e publicado na revista “Nature Communications”. A Conexão Planeta explora as principais conclusões do trabalho e explica como foi produzido. “Nossas descobertas mostram que não há nada igual à atual aridez nos últimos 720 anos. Nossa análise indica que a tendência é principalmente impulsionada por forçamento antropogênico [causado pelo homem] e não pode ser explicada apenas por fatores naturais”, afirma Nicolas Misailidis Stríkis, autor principal do artigo e professor do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (USP).
📮 Outras histórias
Os índices de analfabetismo entre jovens em Sergipe são preocupantes. O percentual de analfabetos na faixa entre 15 e 19 anos é quase o dobro da média nacional. Mas não só. A taxa de analfabetismo no estado é elevada de forma geral, como mostra a Mangue Jornalismo. Segundo o Censo Demográfico de 2022, do IBGE, ao todo 240.415 mil pessoas em Sergipe com 15 anos ou mais são analfabetas – o equivalente a 13,8% da população no estado, que fica em sétimo lugar no ranking nacional. Em 2010, Sergipe não estava muito melhor: ocupava a sexta posição. Para Livia Almeida, doutora em Educação e especialista em História da Cultura Africana e Afro-brasileira, “essa lenta alteração oferece fortes indícios de que as ações e programas desenvolvidos em todos os níveis têm sido pouco efetivos para incidir sobre a problemática”.
📌 Investigação
Inundada por desinformação e conteúdos potencialmente criminosos, a Meta terceirizou a checagem de publicações para trabalhadores que devem apurar as informações nas redes da big tech a fim de treinar sistemas de inteligência artificial. O Intercept Brasil revela que esses moderadores, no entanto, recebem US$ 0,45 centavos por post e precisam avaliar 40 conteúdos em uma hora – menos de dois minutos para cada um. Para cada hora completada com êxito, os trabalhadores recebem US$ 3,50 – cerca de R$ 18 na cotação atual. Os moderadores são frequentemente expostos a posts perturbadores, como violência e tragédias, sem qualquer tipo de apoio.
🍂 Meio ambiente
Mais de uma centena de mortos e mais de 160 mil pessoas desalojadas em 425 cidades gaúchas não foram o suficiente para impedir que parlamentares do Rio Grande do Sul votassem a favor do enfraquecimento das leis ambientais. A Sumaúma destrincha a atuação de 15 deputados federais do estado que votaram a favor de afrouxar as regras para criar plantios maciços de Eucalipto e Pinus no país, árvores que podem causar desequilíbrio hídrico no solo. A votação do PL 1366/2022, que dispensa o licenciamento ambiental para esse tipo de cultivo, aconteceu em caráter de urgência no último mês. O relator da proposta foi o ruralista gaúcho Covatti Filho (PP), de Frederico Westphalen, município que entrou em calamidade pública em um dos maiores eventos climáticos extremos do país.
📙 Cultura
Em áudio: entre a serigrafia, a locução em rádio, a escrita e o entalhe, Gildásio Caetité, o Mufula, é um dos artistas mais conhecidos em Poções, no interior da Bahia. Atualmente, a arte de entalhar a madeira tem sido uma de suas principais atividades. O artista participa de feiras de artesanato na região e já chegou a vender suas peças para admiradores dos Estados Unidos. A série “Histórias Que Te Contam da Janela”, do “Papeando”, podcast do Site Coreto, narra a sua trajetória e contribuição para a diversidade cultural do município. Para Mufula, os artistas locais ainda recebem pouco reconhecimento.
🎧 Podcast
Receios de perda de autonomia, várias perguntas não respondidas e questionamentos sobre a real finalidade dos créditos de carbono rondam as mentes dos moradores de comunidades tradicionais em Gurupá, no Pará. Na estreia da série “Faroeste Carbono”, o “Prato Cheio”, produção d’O Joio e O Trigo, visitou a região onde quilombolas assinaram contrato com uma gigante do mercado de carbono, sócia da petrolífera Shell. O podcast busca entender a realidade das pessoas que podem ter seus modos de vida alterados pelos termos, metodologias difíceis e cálculos nebulosos do setor.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
“Acho que temos um bom modelo de como fazer ativismo de dados orientado para a justiça social, dialogando de forma crítica com as famílias e comunidades, promovendo inovações éticas a partir do trabalho de base”, afirma Catherine D’Ignazio, diretora do laboratório Data + Feminism, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês). Cientista de dados, D’Ignazio explica, em entrevista à revista AzMina, como esse campo pode aprender com o feminismo de dados – área que utiliza o pensamento crítico feminista para propor práticas científicas mais éticas e igualitárias. “Muitos dados relacionados à vida das mulheres e minorias de gênero não são coletados, são esquecidos ou pouco estudados. Por exemplo, na economia, há vários estudos sobre trabalho assalariado, e muito pouco sobre o trabalho doméstico, o trabalho de cuidado.”