Os 10 anos do 7 a 1 para a Alemanha e o colonialismo alimentar
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🔸 “Como que você vai apontar armas para a cabeça de meninos de 13 anos?”, questionou a embaixatriz do Gabão, Julie-Pascale Moudouté, durante uma entrevista à TV Globo. Na última semana, seu filho e também os filhos de diplomatas do Canadá e de Burkina Faso – todos negros – foram abordados de forma truculenta pela Polícia Militar, na zona sul do Rio de Janeiro. O Mundo Negro informa que a abordagem policial foi registrada em vídeo por câmeras de segurança de um prédio. Os adolescentes, com idades entre 13 e 14 anos, foram colocados contra a parede, tiveram armas apontadas para a cabeça e foram revistados.
🔸 A propósito: os quatro PMs do caso Giovanni Gabriel de Souza Gomes, jovem de 18 anos morto na Região Metropolitana de Natal (RN) em 2020, foram absolvidos pelo júri popular na última semana. No dia 5 de junho daquele ano, Giovanni Gabriel foi visitar sua namorada e escondeu sua bicicleta porque o pai da garota não aprovava o relacionamento. Na mesma manhã, os policiais foram acionados devido a um roubo de carro na região. Giovanni Gabriel foi abordado pela polícia por “atitude suspeita” e levado pela viatura. Seu corpo foi encontrado quase dez dias depois. A Saiba Mais relembra o caso e destaca que o Ministério Público do Rio Grande do Norte e os advogados da acusação entraram com recurso contra o resultado do julgamento. “A decisão dos jurados foi absolutamente contrária às provas contidas nos autos”, afirmou o MP.
🔸 Após um ano e meio de reivindicações de organizações da sociedade civil e de parte de seus ministros, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decidiu retomar o funcionamento da Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, extinta no governo Bolsonaro. “Foi uma das poucas políticas de Estado no Brasil. Classicamente, mudam os governos, mudam as políticas públicas. Mas ela teve uma sobrevida impressionante e atravessou vários governos, teve um processo de acúmulo institucional”, afirma a cientista política e professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Cristina Buarque, ao Nexo. O órgão, instituído em 1995, tem o papel de mobilizar esforços para localizar restos mortais das vítimas da ditadura e emitir pareceres sobre indenizações a familiares. Mais de 140 pessoas desaparecidas durante o regime nunca foram encontradas.
🔸 Hoje se completam dez anos da derrota da Seleção Brasileira de futebol masculino por 7 a 1 para a Alemanha, em partida das semifinais da Copa do Mundo de 2014, sediada no Brasil. “A crítica do 7×1 é uma tarefa tanto estética quanto politicamente relevante, para a qual este aniversário parece um bom ponto de partida. Uma década soa como a distância mínima a partir da qual avaliar os grandes acontecimentos políticos e culturais”, escreve Pedro Lerner, especialista em Política e Sociedade e doutorando na Universidade de São Paulo com o projeto “Eles de novo: o 7x1 e o Brasil”, na revista piauí. O pesquisador divide a análise da partida em sete atos a partir da perspectiva de uma crítica literária.
📮 Outras histórias
Desde 2021, não há um guardião para o Memorial dos Mártires, na comunidade de Pintada, em Ipupiara (BA). O local abriga uma estátua de José Campos Barreto, o Zequinha, carregando nas costas o ex-capitão Carlos Lamarca, do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), enquanto tentavam escapar – sem sucesso – da perseguição feita por militares e policiais na ditadura. A inauguração do monumento foi feita em 2013 pelo bispo da Barra (BA), dom Luiz Flávio Cappio. O Meus Sertões conta que o religioso pretendia levar para o memorial os restos mortais de todos os que resistiram ao regime e dos líderes rurais assassinados por grileiros. A reportagem destaca, no entanto, a má conservação do espaço, com mato alto e sem um guardião.
📌 Investigação
Premiada com uma estrela verde do Guia Michelin, a versão sustentável do renomado guia gastronômico, a Casa do Porco, em São Paulo, frequentemente destaca seu empenho “eco-responsável”, com a criação artesanal de porcos, os pomares orgânicos, o adubo feito no próprio galinheiro e a polinização das hortaliças por abelhas africanas. A Repórter Brasil revela, porém, que seu terceiro sócio-administrador, Júlio César de Toledo Piza Neto, é ligado a gigantes do agronegócio que acumulam denúncias de violações trabalhistas e invasão de territórios indígenas. Até junho, Piza Neto era integrante do conselho da Terra Santa Propriedades Agrícolas, uma imobiliária rural dona de sete grandes fazendas em Mato Grosso. Uma delas, por exemplo, está sobreposta à Terra Indígena Batelão.
🍂 Meio ambiente
A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) informou que planeja ofertar dois novos blocos para a exploração de petróleo na bacia do rio Tacutu, em Roraima, no próximo ano. Segundo a InfoAmazonia, nove terras indígenas – Raposa Serra do Sol, Bom Jesus, Canauanim, Jabuti, Malacacheta, Manoa/Pium, São Marcos, Tabalascada e Serra da Moça – estão na área de impacto direto do empreendimento. A audiência em que o diretor-geral da ANP, Rodolfo Saboia, anunciou os novos blocos não contou com a participação de representantes dos povos indígenas afetados. Atualmente, existem 52 blocos já licitados na Amazônia, em exploração ou produção. Outros 307 estão em estudo e 92 estão disponíveis para oferta pública, aguardando empresas interessadas.
📙 Cultura
Em fotos: o Arraiá das Drags foi marcado por shows de drag queens e drag kings, quadrilha diversa sem divisão de gênero, bingo com prêmios de comércios locais, correio “lacrante”, comidas típicas e forró. Na Periferia em Movimento, o fotógrafo Pedro Salvador compartilha os registros feitos durante a celebração que aconteceu no final de junho, no Jardim Romano, na zona leste de São Paulo, onde está localizada a sede do Coletivo Acuenda. A iniciativa promove há 10 anos a pluralidade LGBTQIA+ nas periferias por meio da cultura.
🎧 Podcast
As redes sociais estão inundadas de indicações e propagandas de suplementos – para dormir, para a pele, para ter mais energia, para emagrecer. A maioria dos produtos, porém, não tem comprovação científica. O “Ciência Suja”, produção da NAV Reportagens, em parceria com o “Olá, Ciência!”, destrincha o impacto da desinformação e estratégias para burlar a legislação na venda dos suplementos, inclusive por meio de influenciadores digitais. Esses produtos que prometem saúde e beleza aos consumidores já estão em 59% das casas brasileiras.
✊🏽 Direitos humanos
“Apesar de ter sido encerrada do ponto de vista jurídico, a colonização forjou e segue forjando nossos modos de subjetivação, porque muito além da dimensão econômica, foram estabelecidos princípios cognitivos de ordenação da vida, ainda não superados”, afirma Rute Costa, professora do Instituto de Alimentação e Nutrição da Universidade Federal do Rio de Janeiro e coautora do livro “Prato do Dia: Desigualdades. Raça, Gênero e Classe nos Sistemas Alimentares”. A Revista Afirmativa detalha que uma das persistências da colonização acontece por meio da alimentação, com produção agrícola em grandes latifúndios de monocultura, uso de agrotóxicos, introdução de alimentos ultraprocessados, desapropriação de práticas alimentares tradicionais e padronização dos gostos.